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quinta-feira, 13 novembro, 2025

Por que o Movimento Marxista das Filipinas Importa ao Mundo

Wagner França

 Noel Celis / AFP via Getty Images

Wagner França

Nas entranhas do arquipélago filipino, onde as selvas se encontram com as metrópoles, pulsa há 56 anos um dos mais significativos experimentos revolucionários de nosso tempo. O movimento marxista-leninista-maoísta, sob a direção do Partido Comunista das Filipinas (PCF), não é mera relíquia da Guerra Fria, mas uma resposta viva à opressão tripla que estrangula o povo: o imperialismo norte-americano que mantém bases militares em solo soberano, o feudalismo que condena camponeses à servidão, e o capitalismo burocrático que transforma elites locais em capatazes do capital estrangeiro. Sua existência desafia a narrativa do “fim da história” e demonstra que a chama da revolução anticolonial ainda queima no século XXI.

Fundado por José Maria Sison em 1968, o PCF compreendeu desde o início que a libertação exige duas etapas indissociáveis: primeiro, uma revolução democrático-popular que expulse o imperialismo, distribua a terra e estabeleça um Estado verdadeiramente popular; depois, a transição ao socialismo. Essa estratégia não nasceu de dogmas, mas da realidade concreta de um país onde 80% da população rural vive sob relações feudais enquanto operários urbanos recebem salários 50% inferiores ao custo real da vida. O Novo Exército do Povo (NEP), seu braço armado criado em 1969, opera hoje em mais de 110 frentes guerrilheiras, mas sua verdadeira força reside no poder popular construído nos territórios libertados – comitês revolucionários que implementam reforma agrária radical, tribunais populares e sistemas de saúde comunitários, provando que um mundo além do capitalismo é possível.

Críticos reducionistas acusam o movimento de “militarismo”, ignorando sua profunda base de massas. Quando o Comitê Central ordenou o Movimento de Retificação após reveses em 2023, não foi para acumular mais rifles, mas para reenraizar-se nas lutas cotidianas do povo. A prova está nas frentes de massa: operários das zonas econômicas especiais que transformam greves em protestos antigovernamentais; mulheres do Movimento Feminino Popular que lembram ao mundo que “sem mulheres, não há revolução”; cristãos e muçulmanos unidos na Frente Democrática Nacional. Esta é uma insurgência que entende que a trincheira decisiva está nas consciências.

Sob o governo de Ferdinand Marcos Jr., a repressão atingiu níveis brutais – assassinatos de líderes históricos como Benito Tiamzon, “guerra total” das Forças Armadas com apoio logístico dos EUA, criminalização de sindicatos onde apenas 4% dos trabalhadores estão organizados. Mas cada ofensiva revela a hipocrisia de um Estado que serve a interesses estrangeiros enquanto milhões de filipinos são forçados à diáspora econômica. O apelo do PCF aos operários em seu manifesto do Primeiro de Maio de 2025 – “ir ao campo e integrar o NEP” – não é romantismo guerrilheiro, mas o reconhecimento tático de que a aliança operário-camponesa é a única força capaz de romper as correntes semicoloniais.

Internacionalmente, esta revolução ecoa como um farol. Sua resistência prolongada inspira movimentos do Peru à Turquia, enquanto denuncia as bases militares estadunidenses como instrumentos de dominação neocolonial. Na Liga Comunista Internacional, sua voz expõe a farsa da “globalização pacífica”. Aos 56 anos, o PCF enfrenta seu momento mais crítico, mas sua resiliência reside na síntese entre princípios marxistas e realidade filipina, na autocrítica constante e na capacidade de transformar a fúria das massas em projeto político. Como proclamou seu Comitê Central: *”O proletariado e o povo filipino estão determinados a vencer a revolução democrático-nacional e seguir ininterruptamente rumo ao futuro socialista”*.

Em um mundo assombrado pela crise climática, pela escalada militarista e pela desigualdade obscena, a revolução filipina lembra que alternativas existem. Sua luta não é regional, mas universal: prova que mesmo sob a bota do império, povos oprimidos podem escrever sua própria história com as armas da teoria revolucionária e a força das massas organizadas. Seu destino será decidido não apenas nas montanhas de Luzon ou nas fábricas de Mindanao, mas na consciência de todos que ainda acreditam que um outro mundo não só é necessário – é possível.

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