© Foto: Arquivo pessoal de Raul Athaide
O cidadão brasileiro Rafael Marques Lusvarghi combateu entre setembro de 2014 e novembro de 2015 nas fileiras do exército da República Popular de Donetsk e foi preso em Kiev em outubro de 2016. Recentemente, na mídia apareceram relatos de ele ter sido maltratado pelos outros prisioneiros.
Assim, o jornal russo Vzglyad, alegando relatos de ativistas, informou sobre torturas morais e físicas infligidas a Lusvarghi. Porém, a autenticidade destes relatos parecia duvidosa e a Sputnik Brasil resolveu fazer uma investigação.
Em primeiro lugar a Sputnik Brasil contatou a Assessoria de Imprensa do Ministério das Relações Exteriores do Brasil para esclarecer a situação.
A primeira resposta foi meio formal:
“O Setor Consular da Embaixada do Brasil em Kiev tem acompanhado o caso do brasileiro Rafael Marques Lusvarghi desde sua detenção por autoridades ucranianas.
Representantes da Embaixada realizaram visitas consulares ao local de detenção, prestando-lhe a assistência consular cabível e averiguando suas eventuais necessidades de apoio. Ademais, os agentes consulares… estabeleceram contato com o advogado de Lusvarghi no Brasil e com seu defensor público ucraniano. Foi-lhe também entregue carta com mensagens de seus familiares e amigos no Brasil e material literário brasileiro.
Nas visitas, Rafael Lusvarghi indicou aos agentes consulares não ter queixas do tratamento recebido pelas autoridades ucranianas, que está tendo acesso a alimentação de qualidade e que não foi submetido a maus tratos ou a trabalhos forçados.”
A Sputnik Brasil perguntou quando foi realizada a última visita devido ao caráter muito recente das publicações. Já essa resposta foi maisNATURAL e menos formal:
“A Embaixada do Brasil em Kiev logrou entrar em contato na tarde de hoje, 25 de janeiro, com o defensor público ucraniano do senhor Lusvarghi, que confirmou que o nacional brasileiro preso não teria sofrido nenhuma agressão física. Foi solicitado pelo Setor Consular da Embaixada às autoridades ucranianas nova visita ao preso brasileiro, para verificar sua integridade moral, física e psicológica.”
Porém, o Itamaraty se absteve a responder quando foi realizada a última visita consular a Lusvarghi.
Falamos também com Raul Athaide, também cidadão brasileiro, amigo e antigo camarada de Rafael no batalhão Viking da República Popular de Donetsk, que combateu em Donbass entre abril e novembro de 2015.
Infelizmente ele não pôde nem confirmar nem descartar os relatos sobre torturas.
“Estamos sem nenhuma informação sobre o Rafael desde que ele foi preso no aeroporto de Kiev”, respondeu.
Já o advogado brasileiro de Lusvarghi, Daniel Eduardo Candido, em resposta ao pedido de comentário por parte da Sputnik Brasil, disse que também não dispõe de dados definitivos.
“Nosso contato com o brasileiro [Rafael Marques Lusvarghi] é quase zero. Encontramos muitas dificuldades para ter acesso a ele. Não posso afirmar se ele está ou não sendo maltratado”, escreveu.
O advogado também contou à Sputnik que tentou buscar auxílio junto ao Comitê Internacional da Cruz Vermelha e ao setor Consular da Embaixada do Brasil em Kiev.
“Afora isso, buscamos inúmeras vezes informações e ajuda para o brasileiro acusado junto às autoridades brasileiras e internacionais, todavia, sem o êxito esperado”, resumiu.
Detenção no aeroporto de Kiev
Entretanto, Raul contou à Sputnik Brasil os detalhes do regresso de Rafael à Ucrânia que acabou na sua detenção. Raul disse que o seu camarada estava procurando trabalho no Brasil (antes de partir para o leste da Ucrânia, Rafael era professor de idiomas), mas não conseguiu.
“O Rafael acabou voltando à Ucrânia depois de receber uma proposta de emprego de uma empresa privada, com sede em Londres, empresa de segurança de navios, Omega, essa empresa manteve conversas com o Rafael por e-mail… O emprego oferecido ao Rafael era para fazer a segurança de navios, partindo de Odessa com o destino ao Sri Lanka. As conversas entre o Rafael e a empresa Omega se estenderam até o dia que a empresa enviou ao Rafael os tickets de viagem. O Rafael embarcou em São Paulo — Brasil, fez uma escala em Istambul — Turquia, e depois desembarcou em Kiev — Ucrânia, onde foi preso pelo Serviço Secreto ucraniano…”, disse.
Raul conta que avisou o seu camarada sobre o perigo de passar pelo território ucraniano.
“Ele disse que a empresa de segurança deu garantias para ele de que nunca aconteceria nada com ele”, confessa o antigo camarada de Rafael.
Porém, Raul acredita que foi a empresa que passou os dados sobre Lusvarghi ao Serviço de Segurança da Ucrânia e que isso foi uma armadilha desde o início.
Acusações
Rafael Marques Lusvarghi foi acusado de criação de organização terrorista ou grupo terrorista, de acordo com o artigo 258-3 do Código Penal da Ucrânia, informa a emissora BBC Ucrânia.
Porém, Raul Athaide descarta estas acusações:
“O Rafael está sendo acusado de terrorismo, crimes de guerra e estupro contra ucranianas, eu estive na frente de guerra durante o ano de 2015 [desde abril] e posso afirmar que essas acusações são falsas! O Rafael nunca planejou nenhum ato de terrorismo ou crimes ou estupro contra o povo ucraniano! O Rafael é um cidadão brasileiro sem nenhum problema com a justiça brasileira! Desde que voltamos do conflito na Ucrânia, em novembro de 2015, o Rafael esteve procurando emprego no Brasil, sem nenhuma atividade irregular, não tem passagem nenhuma pela Justiça do Brasil.”
Tribunal
O tribunal condenou o cidadão brasileiro a 13 anos de prisão em 25 de janeiro deste ano, diz a BBC Ucrânia alegando a Procuradoria de Kiev. O tribunal considerou Lusvarghi culpado de criação de organização terrorista e confiscou os seus bens. A procuradoria afirma que ele participou de combates em Debaltsevo e no aeroporto de Donetsk. Além disso, ele recrutou estrangeiros às fileiras dos milicianos independentistas, afirma a investigação ucraniana.
O defensor público local de Lusvarghi se absteve aos comentários oficiais na conversa com a Sputnik Brasil, mas disse que seria satisfatório se o brasileiro fosse em breve trocado no âmbito do acordo de troca de prisioneiros de guerra entre a Ucrânia e as repúblicas populares de Donetsk e Lugansk, contudo referiu não saber se e quando isto vai acontecer.