A princesa Maria Esmeralda da Bélgica em protesto do movimento Extinction Rebellion
Ativista de causas socioambientais, Maria Esmeralda chegou a ser presa recentemente num protesto. Em entrevista, ela fala sobre as injustiças enfrentadas pelos povos indígenas e critica o passado colonial de seu país.
Após deixar o trono da Bélgica, em 1951, o rei Leopoldo 3º decidiu se dedicar ao estudo livre da antropologia e entomologia. Em viagem de campo ao rio Orinoco, na Venezuela, encantou-se por um povoado de nome Esmeralda. Decidiu, então, que seria o nome de sua próxima filha. Aos 63 anos, a princesa Maria Esmeralda se orgulha de sua conexão com a América Latina. Ela é ativista de causas socioambientais, afirma-se feminista e defende uma discussão franca sobre o passado colonial de seu país.
Maria Esmeralda da Bélgica dispensa o tratamento protocolar. Em outubro do ano passado, ela foi presa durante um protesto do grupo Extinction Rebellion, do qual é militante. A princesa, que preside o Fundo Leopoldo III para Exploração e Conservação da Natureza desde a morte do pai, em 1983, defende a desobediência civil como plataforma de luta. No início de fevereiro, ela se encontrou com o cacique caiapó Raoni Metuktire, de 90 anos, em Londres. Trata-se de um velho conhecido da família: Leopoldo 3º o conheceu no Parque Indígena do Xingu em 1966.
“Os povos indígenas são sempre as primeiras vítimas. Eles estão preservando a biodiversidade para todos nós, para o futuro dos nossos filhos. É uma injustiça terrível, e eu acho que suas vozes precisam ser ouvidas. Temos muito a aprender com a forma como eles vivem, em harmonia com a natureza”, diz, em entrevista à DW.
DW Brasil: Como começou seu envolvimento com o ativismo?
Princesa Esmeralda: Nos anos 1970, meu pai criou uma fundação destinada a preservar a natureza e explorá-la cientificamente, bem como proteger a cultura e os direitos de comunidades indígenas – especialmente na América do Sul, porque havia estado muitas vezes no Brasil. Quando ele morreu, em 1983, eu assumi a presidência dessa fundação. Portanto, meu envolvimento com essas lutas começou muito cedo. Mas é claro que, com o colapso climático e todos os problemas que enfrentamos agora, tenho me dedicado mais e mais ao ativismo.
Quais são os temas que movem sua ação?
Além da enorme desigualdade que vemos no mundo, há injustiça em relação às comunidades indígenas. Porque elas sempre preservaram a biodiversidade. Embora elas representem 5% da população mundial, são responsáveis por 80% da biodiversidade do planeta. E elas sempre foram assassinadas ou removidas. Inicialmente, pelo colonialismo, mas esse processo continua agora, com todas as empresas multinacionais ligadas à mineração, exploração de petróleo e outras atividades que tiram riquezas do solo. Os povos indígenas são sempre as primeiras vítimas. Eles estão preservando a biodiversidade para todos nós, para o futuro e também nossos filhos. É uma injustiça terrível, e penso que suas vozes precisam ser ouvidas. Temos muito a aprender com a forma como eles vivem, em harmonia com a natureza.
De quais protestos você participa?
Eu participo de diversas ações, como a marcha das mulheres e os protestos da Juventude pelo Clima, que também tento apoiar, porque os jovens vêm fazendo um trabalho incrível. Evidentemente, não só a Greta Thunberg. Ela é a mais famosa, mas há jovens ativistas em toda parte pelo mundo. Existe uma grande diversidade, e deveríamos encorajar as pessoas a conhecê-los.
Além disso, participo das ações do Extinction Rebellion, um grande movimento que começou no Reino Unido e agora está em 45 países. Eles tentam unir cidadãos de todas as camadas da sociedade em nome da desobediência civil não violenta. A ideia é aumentar a consciência sobre o que vivemos e dizer aos governos: sua inércia é criminosa, por isso estamos aqui para bloquear, por exemplo, uma parte da cidade ou um aeroporto.
Portanto, você estimula a desobediência civil como forma de luta contra injustiças socioambientais?
Creio que nós tenhamos usado todos os meios. Já foram organizadas tantas marchas, protestos e conferências para mostrar a importância de agirmos. Francamente, a ação não está vindo. É claro que há toda a sorte de ideias e projetos, mas a transformação grande e radical não está acontecendo. Portanto, penso que a desobediência civil é uma arma à nossa disposição. Digo novamente: de forma não violenta. Funcionou no passado, na Índia, com Gandhi; na África do Sul, contra o apartheid; na luta pelo direito ao voto, na Inglaterra. Faz parte da história, mas é preciso reunir uma grande parte da população.
Maria Esmeralda da Bélgica em encontro com Raoni em Londres, em fevereiro de 2020