Hebert C. G. Teixeira*
Cumprindo seu papel de fábrica de ideias, a AEPET analisa criticamente o noticiário.
Em mais um espetáculo midiático, os meios de comunicação dominantes constatam orgulhosamente que o “Pré-sal responde por quase metade do petróleo produzido no país e a fatia de estrangeiras chega a 33%”. Seu orgulho é fruto de missão cumprida com êxito e evidencia o papel da mídia dominante na privatização das riquezas públicas e na falta transparência em favor do interesse da sociedade.
Em contrapartida, cumprindo seu papel de fábrica de ideias e contraposição a esta mídia e à falta de integridade jornalística, a AEPET analisa criticamente as conclusões e suas consequências das reportagens amplamente divulgadas sobre o avanço da participação das petroleiras estrangeiras no setor de petróleo brasileiro.
As reportagens destacam que a produção do pré-sal vem crescendo ano a ano e alcançou 1,677 milhão de barris de óleo equivalente por dia (boe/d) em setembro, o correspondente a 49,8% do total produzido no Brasil. Na comparação anual, o volume de óleo extraído cresceu 14,3%. Entretanto, os jornalistas não mostram que o atual patamar é fruto de investimentos da Petrobras desde 2006, evidenciando que o ciclo de vida dos investimentos da indústria do petróleo da descoberta a produção é em média de 8 anos.
Mais ainda, deve-se destacar que os investimentos da Petrobras não tiveram como resultado só a produção expressiva de petróleo, mas tornou o Pré-sal brasileiro uma região petrolífera de grande potencial, baixíssimo risco e alta qualidade. Em outras palavras, petróleo em grande quantidade, de fácil extração e de qualidade superior e tremendamente lucrativa para quem explorar.
Com o Pré-sal, a Petrobras ganhou uma gestão estratégica e os resultados do setor de óleo e gás natural tornaram-se responsáveis por 11% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil.
O setor de óleo e gás tem participação na arrecadação impostos e no desenvolvimento econômico do Brasil. Sua arrecadação tem três abrangências: primeiro vêm os tributos incidentes ao longo da cadeia de valor do mesmo, ou seja, sobre os produtos do setor (ICMS, PIS-COFINS e CIDE em Combustíveis); em segundo lugar, alguns dos tributos incidentes sobre a renda e a variação patrimonial dos agentes econômicos do setor (FGTS, Contribuições Previdenciárias, Impostos e Taxas sobre Propriedade, Imposto de Renda de Pessoa Jurídica e Contribuição Social Sobre Lucro Líquido); em terceiro lugar, as participações governamentais (Royalties, Participações Especiais, Bônus de Assinatura e a Taxa de Ocupação e Retenção de Área), rendas públicas não-tributárias associadas à atividade de exploração e produção de petróleo e gás natural.
Segundo nota técnica da ANP, a participação do setor de Petróleo e gás na arrecadação tributária brasileira, no período de 2002 a 2008, foi de R$ 426,11 bilhões. Em 2008, o setor de petróleo e gás representou 8,31% de toda arrecadação tributária brasileira, que foi de 35,80% do PIB. Considerando o período de 2002 até 2017, segundo estimativas do Fundo Monetário Internacional-FMI e do Banco Mundial, o PIB real economia brasileira, ajustado pela Paridade de Poder de Compra, foi de quase US$ 53,87 trilhões. A participação da arrecadação tributária do setor de Petróleo e gás aumentou para 10,11% do total e estima-se mais R$ 1949,89 bilhões de arrecadação no período. Os valores são expressivos, mesmo levando em conta a subavaliação das estimativas da ANP. Os fatos mostram que setor de Petróleo e gás é extremamente importante no desenvolvimento econômico do Brasil.
Num momento de debate da reforma da previdência, as contribuições sociais da Petrobras entre 2002 e 2017 acumularam R$ 212 bilhões em arrecadação do PIS-PASEP e COFINS, o que representa em média a participação 9,7% no total da arrecadação nacional destes impostos. A Petrobras divulga sua arrecadação de PIS-COFINS trimestralmente em seu sítio web.
Na noite d 18/10/2017, os deputados e senadores aprovaram medida provisória (MP 795) que reduz os impostos das atividades de exploração e produção de jazidas de petróleo e gás natural. A MP beneficia as empresas estrangeiras que estão entre as 20 maiores empresas do mundo.
Estima-se que as mudanças na tributação resolveram de imediato “dívidas e pendências históricas de R$ 20 bilhões” das empresas estrangeiras nos dois últimos meses de 2017. Apenas no campo de Libra a redução de receita tributária para o Brasil será de R$ 247 bilhões. Para efeito de cálculo do prejuízo brasileiro foi considerado o barril a US$ 60 dólares e o custo de produção a US$ 22.
As previsões indicam uma arrecadação de apenas 33% dos impostos recolhidos até 2017, mesmo com aumento da produção de petróleo e gás. Em outras palavras, a MP representará uma transferência de riqueza para multinacionais e desenvolvimento para os países compradores de petróleo, sem nenhuma contrapartida.
A MP também renova o regime aduaneiro especial de exportação e importação de bens do setor, chamado Repetro. Como resultado, a tributação média do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que atualmente é de 14%, cairá para cerca de 3%.
Será um enorme retrocesso para a indústria brasileira e para o país, porque é um conjunto de vantagens como isenção de impostos para a operação das grandes petroleiras internacionais, além das perdas de receitas e da renúncia fiscal. Segundo o texto, ficam isentos o pagamento do imposto de importação, do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), da contribuição para o Programa de Integração Social e Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público, PIS/Pasep, e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social, e do Cofins sobre Importação. Com estas vantagens todas, o Brasil ficará com algo em torno de 40% da riqueza do petróleo, enquanto muitos países ficam com 70 a 80% da exploração.
A MP permite a interpretação da competência tributária dos estados e municípios na atividade offshore. Será questionada na justiça a incidência de ICMS; a eventual incidência de ISS no transporte do petróleo para o solo; a incidência de PIS e COFINS sobre o valor relativo ao óleo-custo; a tributação sobre a importação de bens, a CIDE combustíveis; o direito de crédito de IPI decorrente das operações alcançadas pela imunidade, os múltiplos desdobramentos da extensão do território nacional sobre a plataforma continental e muitos outros.
A Associação Brasileira das Empresas de Exploração e Produção de Petróleo (Abep) já entrou com duas ações no Supremo Tribunal Federal (STF) contra leis sancionadas pelo governo estadual do Rio de Janeiro que oneram o setor de petróleo. A associação defende que a cobrança de ICMS na extração de petróleo e taxa de fiscalização são inconstitucionais.
Os jornalistas sem qualquer senso crítico se encantam com o avanço das empresas estrangeiras sobre o pré-sal e exaltam a redução dos investimentos da Petrobras. Os papéis da mídia dominante e dos jornalistas passam a ser questionados porque apresenta apenas uma face da moeda, com uma análise superficial sem critica dos verdadeiros impactos para o país, emprego, desenvolvimento e papel dos futuros políticos eleitos na próxima eleição e suas propostas na área de soberania energética.
As jazidas petrolíferas de altíssimos volumes recuperáveis e de altíssima produtividade, como as da província do pré-sal, que são bens da União, devem recolher impostos sobre o lucro e ser exploradas em benefício da sociedade brasileira, o que inclui a indústria nacional, que deve ser incentivada a produzir máquinas e equipamentos.
As empresas estrangeiras não pagarão impostos, não produzirão equipamentos no Brasil, não refinarão o óleo no País para agregar valor e não pagarão dividendos para a União. Apenas abriremos mão de bilhões em impostos em benefício das gigantes do petróleo.
Em conformidade com a Constituição de 1988, o acesso à informação tornou-se um dos insumos básicos ao exercício da cidadania e combate a corrupção. Dessa premissa extrai-se o direito do cidadão em conhecer, opinar e acompanhar as decisões governamentais para certificar-se de que os recursos postos à disposição do Estado produziram resultados positivos em prol da coletividade – a atuação popular no sentido de defender direitos e interesses coletivos perante a administração pública é intitulado de controle social.
Entretanto, o alcance pleno desse direito requer o fornecimento de informações pelo setor público à sociedade, que é denominado de princípio da transparência. A sociedade deve discutir, criticar e avaliar os impactos das decisões governamentais. O papel dos meios de comunicação é preponderante nestas discussões e análises dos impactos, além de torná-las abrangentes e democráticas, mostrando todas as faces das críticas. Deve-se destacar que o ápice da corrupção sistêmica está também associado à mídia polarizada. Desse modo, a questão principal do presente artigo consiste em evidenciar o papel dos meios de comunicação dominantes na privatização das riquezas públicas e na falta transparência em favor do interesse da sociedade.
*Herbert Campos Gonçalves Teixeira é Diretor de Comunicações da AEPE