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sexta-feira, 26 julho, 2024

Plano Colômbia: 15 anos depois, continuam as drogas e o conflito

Colombia Informa
Adital

Neste mês de fevereiro, completam-se 15 anos do Plano Colômbia. Este pacote de apoio militar dos Estados Unidos para o Governo da Colômbia teve como objetivo formal apoiar a guerra contra as drogas e contribuir para a construção da paz. Depois desse tempo e de 10 bilhões de dólares, a Colômbia continua sendo o maior produtor de cocaína do mundo; o conflito social, político e armado se agrava, apesar dos diálogos e negociações. Apresentamos um apanhado dos fatos destacados desse período.

Tentativas de paz, os antecedentes

Quinze anos antes da negociação entre as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia –Farv – e o governo colombiano, em Havana, teve lugar o episódio de El Caguán, uma referência no que diz respeito aos diálogos de paz. Em 1997, Andrés Pastrana abraçou ‘Tirofijo’ e começou uma convulsionada negociação na ‘Zona de Despejo’. Desde o início, 07 de janeiro de 1998, até o seu final, em 21 de fevereiro de 2002, o ex-presidente Pastrana desenvolveu as conversações para a paz em medio a confrontos armados e minou assim a confiança do processo da “Agenda comum pela mudança rumo a uma nova Colômbia”.

As situações impidiram, ao que parece, diferenciar entre o diálogo e a negociação para a paz. No dia de instalação da mesa, o comandante das Farc, Manuel Marulanda, se negou a assistir à cerimônia porque assegurou que o esperavam francoatiradores para assassiná-lo.

colombia-informaNão obstante, no período de El Cagúan, segundo o pesquisador Alejo Vargas, as forças armadas cresceram 60%, chegando a ter 132.000 efetivos, dos quais cerca de 55.000 eram profissionais (em comparação com os 22.000 de quatro anos antes). A guerra foi inegociável.

Por sua parte, o Exército de Libertação Nacional – ELN – esteve novamente disposto a dialogar, no fim de 1999. Nicolás Rodríguez Bautista, chefe desta guerrilha, manifestou publicamente a necessidade de impulsionar uma “Convenção Nacional” que permitisse a participação direta da sociedade na construção da paz. Víctor G. Ricardo, ex-comissionado de paz, e o ex-embajador da Colômbia em Cuba Julio Londoño Paredes, participaram dos diálogos exploratórios e deram conta da importância de uma “zona de despejo”, no sul de Bolívar, como condição mínima para a negociação que, finalmente, o governo negou.

Durante os dois períodos presidenciais de Álvaro Uribe, entre o ano de 2002 e 2010, as aproximações e tentativas de paz com as guerrilhas não superaram uma fase exploratória. Uribe concentrou sua tese de ‘mão firme e coração grande’, para ignorar o profundo conflito social, político e armado interno no país. Sua solução foi reconhecer a ‘ameaça terrorista’ que significavam as guerrilhas. Assim como estes, nos 15 anos do Plano Colômbia houve mais de duas tentativas falidas de diálogos entre o governo, as Farc e o ELN.

Forças Armadas: novo brinquedo para os Estados Unidos

Desde o início do Plano Colômbia, os Estados Unidos exigiram elaborar a única estratégia política, econômica e militar para acabar com os males do país. A “Aliança para a Paz, a Democracia e o Desenvolvimento”, garantiu a briga antinarcóticos, enquanto se aprofundou a abertura econômica como retribuição do governo colombiano.

No marco desta Aliança, se desenvolveu um trabalho conjunto entre o Exército Nacional e os Estados Unidos para formarem, primeiro, um batalhão, depois, uma brigada contra o narcotráfico. Esta teria cobertura nacional e a missão específica de combater todos os elos da produção de drogas ilícitas, desde o cultivo de coca e papoula, até a venta e distribuição de cocaína e heroína.

No dia 08 de dezembro do ano 2000, foi ativada, mediante a resolução ministerial 005 daquele ano, a ‘Brigada de Forças Especiais de Luta contra o Narcotráfico’. Esta representa o componente militar do Plano Colômbia para adiantar missões antinarcóticos no território nacional. A tropa que a integrava se concentrou no forte militar de Tolemaida, Cundinamarca, e começou o treinamento com instrutores do sétimo grupo de Forças Especiais do Exército dos Estados Unidos.

Também foi criada a Escola Conjunta de Helicópteros, que opera no Comando Aéreo de Combate número 4, em Melgar, Tolima, onde se formam pilotos de UH-60 Blackhawk e UH-1H, das três forças armadas: Exército, Marinha e Força Aérea.

Estes exemplos evidenciam a principal mudança doutrinária nas Forças Armadas, que consistiu em passar de uma atitude passiva, defensiva e estática para um conceito operacional pró-ativo, ofensivo e móvel; a missão individual das forças se caracterizou por três aspectos fundamentais: recrutar, treinar e equipar cidadãos para o combate. Ou seja, propiciar as condições necessárias para a guerra civil interna.

O governo buscou melhorar, ante o país e o mundo inteiro, a eficácia das Forças Armadas, reenfocar seu treinamento e operações para o conflito armado interno, mas diminuiu sua legitimidade através da violação dos direitos humanos e do Direito Internacional Humanitário. Situações de aliança entre as Forças Armadas e os grupos paramilitares, deram um forte golpe na legitimidade do Plano Colômbia desde o seu início.

colombia-informaOs Estados Unidos haviam deixado claro quais eram os seus interesses: combater os narcocultivos, recuperar os sequestrados estadunidenses e proteger seus interesses econômicos, especialmente os petrolíferos. Como alcançá-los era o problema e este fim justificou os meios, inclusive para direcionar, como um brinquedo criminoso as Forças Armadas. É necessário ressaltar que o investimento estrangeira estadunidense superou, entre 1997 e 1998, o de toda a Europa junta, sem contar o petróleo. Portanto, a mensagem do Plano Colômbia foi mais além da erradicação.

Durante o governo de Álvaro Uribe, o Plano de Desenvolvimento “para um Estado Comunitário” incluiu como prioridade “oferecer Segurança Democrática”, ou seja, garantir o cumprimento dos compromissos adquiridos com os Estados Unidos no Plano Colômbia. A violação dos direitos humanos na Colômbia durante esse governo foi de tal magnitude que assimilou o adjetivo de ‘paramilitar’.

Direitos Humanos?

O Plano Colômbia não evitou o deslocamento forçado das pessoas dos seus territórios. Segundo a Unidade de Vítimas, só no governo de Andrés Pastrana (1998-2002) houve 1.550.409 deslocados. Durante os dois governos de Álvaro Uribe (2002-2010), foram deslocadas 2.869.986 pessoas. A própria Unidade afirma que até o ano de 2014, no mandato de Juan Manuel Santos, foram deslocados 704.148 colombianos.

Em 2014, o Informe da Agência da Organização das Nações Unidas para os Refugiados – Acnur – situou a Colômbia no segundo lugar com maior número de pessoas em condição de deslocamento pela escandalosa cifra de 6 milhões de pessoas, depois de Síria. Outros organismos creem que esse número poderia ser maior.

O Plano Colômbia incentivou, nas Forças Armadas, a necessidade de oferecer resultados aos seus chefes superiores, ávidos por mostrarem avanços na luta contrainsurgente e cobrarem as vultosas bonificações.

Nesse sentido, os militares colombianos assassinaram milhares de pessoas, que logo foram apresentadas como combatentes da guerrilha e dados como baixa em combate. Esta prática, conhecida como “os falsos positivos”, mantém altas doses de impunidade. Segundo o portal Verdad Abierta [Verdade Aberta], existem mais de 5.700 denúncias, das quais a Promotoria investiga quase 3.500. Como outros delitos, calcula-se que o número de falsos positivos poderia ser maior do que oficialmente é conhecido se se somam vítimas da população civil e guerrilheiros ou paramilitares assassinados em estado de indefesa.

Em um informe escrito pela organização não governamental estadunidense Fellowship of Reconciliation Peace Presence juntamente com a Coordenação Colômbia-Europa-Estados Unidos – CCEEU –, se assinala uma conexão direta do treinamento militar dos Estados Unidos e os casos dos falsos positivos.

O informe intitulado ‘Falsos positivos na Colômbia e o papel de assistência militar dos Estados Unidos, 2000-2010’ estabelece que, através de uma base de dados de 5.763 execuções e uma extensa documentação de assistência estadunidense às Forças Armadas, foi encontrada uma correlação positiva entre as unidades e oficiais que receberam assistência e capacitação estadunidense, e as execuções extrajudiciais cometidas.

Glifosato

O Plano Colômbia implementou as fumigações com glifosato em milhares de hectares nos campos e selvas colombianas. O propósito, que era fumigar plantações de folhas de coca e papoula, afetou os cultivos de hortas dos camponeses, que viram destruídas suas plantas de mandioca, milho, inhame, sorgo, arroz, entre outros.

A destruição dos cultivos de alimentos de milhares de camponeses contribuiu para destruir mais as condições de vida nas zonas rurais, o que impulsionou vários a semearem novos cultivos de coca para sobreviverem. Em 2015, o Conselho Nacional de Estupefacientes suspendeu o uso de glifosato para realizar as fumigações contra os chamados cultivos ilícitos.

O governo assinalou que se tratava de dar cumprimento à decisão da Corte Constitucional, que, pelo princípio de precaução, ordenou suspender o uso do glifosato, substância que a Organização Mundial da Saúde da ONU condenou por causar graves danos à saúde.

colombia-informaA fumigação das plantas de coca e papoula começou no fim dos anos 1970. Desde 1986, se utiliza o herbicida conhecido como glifosato, produzido pela multinacional Monsanto. Mesmo que o Plano Colômbia tivesse como eixo central a fumigação desses cultivos, acredita-se que até hoje os mesmos tenham aumentado em 20%. Tudo indica que os Estados Unidos estão revisando as políticas antidrogas dos últimos anos em razão dos poucos resultados alcançados.

7 bases militares gringas

Em 2009, o governo colombiano anunciou que o exército dos Estados Unidos utilizaria sete bases militares: Malambo, Palanquero, Apiay, as navais de Cartagena e do Pacífico. Ademais, o centro de treinamento de Tolemaida e a base do Exército de Larandia, em Caquetá. O uso destas bases pelas forças estadunidenses, que faz parte do plano dos Estados Unidos, sem dúvida, buscava consolidar seu controle geopolítico na América Latina.

Antes de 2009, era comum a presença de soldados e contratados mercenários dos Estados Unidos como parte do esquema de formação do Plano Colômbia.

Em 2015, o informe da Comissão Histórica do Conflito e suas Vítimas, criada pelo governo colombiano e as Farc, informou que entre 2003 e 2007 soldados e contratados norte-americanos abusaram sexualmente de mais de 50 meninas colombianas. Essas violações foram gravadas e depois vendidas como material pornográfico. O informe também assinala que os militares gozaram de impunidade, no que a comissão denominou de “Imperialismo sexual”.

Colômbia disponibilizou orçamento

A exigência norte-americana foi juntar o Plano de Desenvolvimento da Colômbia com a política antinarcóticos e os demais planos oficiais do Plano Colômbia. As “recomendações” foram feitas como ameaças: O apoio dos Estados Unidos para a Colômbia terminaria se continuassem os acordos com a guerrilha; se estivessem no marco de um Diálogo de Paz.

O Plano Colômbia, com seus projetos específicos e estratégias básicas, (processo de paz, ajuste econômico, estratégia antinarcóticos, reforma do sistema judicial, democratização e desenvolvimento social), significou, inicialmente, um montante de 7,5 bilhões de dólares. Finalmente, teve um custo de 120 bilhões e a Colômbia, segundo o senador do Polo Democrático Alternativo Jorge Enrique Robledo, assumiu a maior parte. O Plano Colômbia foi financiado pela Colômbia e não pelos Estados Unidos.

Em matéria de projetos concretos, o Plano foi totalmente incerto, a única coisa clara é que a imensa maioria dos aportes governamentais significaram tomar os recursos programados do orçamento para o gasto público colombiano – educação, saúde, saneamento básico- para destiná-los ao Plano Colômbia.

colombia-informaPara completar, o Departamento Nacional de Planejamento reconheceu que muitos dos recursos provenientes do exterior não seriam doações, mas empréstimos, com o que o Plano Colômbia se define como um argumento para aumentar o montante da dívida externa. O dinheiro gasto no Plano Colômbia durante estes 15 anos equivale a investir cerca de 20 vezes o Produto Interno Bruto – PIB – colombiano do ano de 2015.

Uma segunda fase?

Este panorama deixa muitas inquietudes frente ao que será o Plano Colômbia II, orientado para fortalecer as “zonas de consolidação” através da cooperação e dos investimentos. Será possível uma paz estável e duradoura se são mantidas as violações dos direitos humanos ou da doutrina militar, que, atualmente, promovem as Forças Armadas? Haverá solução para o problema das drogas ilícitas? Avançará o país para a construção da paz nos territórios?

Juan Manuel Santos chegou a Washington D.C. com uma pasta debaixo do braço, que contém o novo projeto de cooperação, acompanhado de uma comitiva de 250 pessoas, entre as quais contam-se empresários, diretores de meios e repórteres. Dessa cooperação depende a estabilidade do seu projeto e, especialmente, o papel da Colômbia na geopolítica da região.

Assista a depoimentos de colombianos afetados pelas fumigações do Plano Colômbia:

https://www.youtube.com/watch?v=2jt05KJP5MQ

Colombia Informa

Agência de Comunicação dos Povos

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