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Propostas da AEPET aos candidatos de 2018
por Felipe Coutinho
O programa setorial apresenta diagnóstico e propostas para o setor do petróleo, gás natural e energia no sentido de assegurar a Soberania e promover o Desenvolvimento Nacional. Nossa Associação considera oportuno apresentar estas análises à sociedade e aos candidatos das Eleições Gerais de 2018, não se trata de uma revelação dogmática, ou de pontos de vista inflexíveis, representa a consolidação da nossa experiência e pontos de vista, que apresentamos para franco e aberto debate com os brasileiros.
Propomos: 1) reversão da privatização dos ativos estratégicos e geradores de receita da Petrobrás, 2) alteração da política de preços da Petrobrás, 3) desenvolvimento da política de conteúdo local, 4) contratação direta da Petrobrás para a produção do petróleo Excedente da Cessão Onerosa, 5) assegurar o direito da Petrobrás como operadora única do pré-sal, 6) revisão do planejamento estratégico e da política de distribuição de dividendos da Petrobrás, 7) controle e limitação da exportação de petróleo, 8) revisão dos subsídios concedidos às petroleiras e da legislação que impacta estatais brasileiras, 9) estabelecimento de políticas públicas para a distribuição da renda petroleira e 10) recompra das ações da Petrobrás negociadas na Bolsa de Nova Iorque.
No programa apresentamos o diagnóstico do setor e, para cada proposta, as justificativas que, ao nosso ver, demonstram porque estão alinhadas ao desenvolvimento nacional soberano. Estamos dispostos a debater cada item, além de outros que podem ser sugeridos pelas equipes dos candidatos. A seguir apresento as propostas resumidamente.
Reversão da privatização dos ativos estratégicos e geradores de receita da Petrobrás
O governo e a Petrobrás estão vendendo negócios, ou partes deles, sem a devida seletividade. Planejam privatizar US$ 35 bilhões entre 2015 e 2018. São negócios geradores de receitas, que mantem a empresa integrada e que são oferecidos ao mercado para pagar dívidas, fazer caixa ou pagar dividendos. Em verdade, estão apenas antecipando receitas, com elevado custo financeiro, sem considerar os prejuízos que tais mutilações trazem para a empresa e para o País.
Propomos que a dívida seja administrada sem privatizar ativos rentáveis e estratégicos. Desde 2016 temos afirmado que a magnitude dessas privatizações é desnecessária para administrar e reduzir a dívida da companhia. Por exemplo, aqui, aqui e aqui. É preciso rever o Plano Estratégico para garantir a integração e a diversificação da companhia. Revisar as metas de alavancagem financeira e subordinar a venda de ativos a ajustes de estratégia e não aos interesses privados e antinacionais do mercado. Cancelar os negócios que não tenham sido concluídos, retirar outros da lista dos postos à venda, além de recuperar os ativos estratégicos e lucrativos privatizados.
Alteração da política de preços da Petrobrás
A política que alinha, e majora, os preços dos combustíveis no mercado interno em relação aos preços internacionais torna lucrativa e viável a importação de combustíveis por agentes privados estrangeiros, reduz o mercado e as receitas da Petrobrás e eleva, de forma significativa, a remessa de dólares ao exterior. Em 2017, mais de 20% do mercado brasileiro foi abastecido por produtos importados, enquanto o parque de refino nacional operou com ociosidade, da ordem de 25%. Perde a Petrobrás, perdem os consumidores e perde o Brasil.
Esta política de preços dos combustíveis deve ser modificada, de forma a reduzir a deletéria importação de gasolina e diesel e elevar o fator de utilização do parque de refino nacional. A Petrobrás deve adotar preços compatíveis com seus custos e recuperar o mercado perdido para a cadeia de importação. A redução dos preços pode ser compensada com o aumento do mercado. Deve se buscar preços que compensem a estatal, considerando seus custos operacionais, a necessidade de investimentos e administração da dívida, mas também a capacidade de compra dos brasileiros que não devem ser penalizados por preços superiores aos internacionais quando se dispõe do petróleo, refino, domínio tecnológico e temos companhia estatal para abastecer o país.
Desenvolvimento da política de conteúdo local
A política de conteúdo local, praticada pelo governo para desenvolver a indústria nacional, foi duramente atingida pelo corte substancial dos índices nas atividades de exploração e produção de petróleo e, pior, dando a entender que isto é bom para o Brasil. Na prática, esta decisão sinaliza o fim do conteúdo local.
Propomos que seja estabelecida uma política de conteúdo nacional que receba incentivos condizentes com os níveis de emprego e de renda criados localmente. O Brasil já teve até 90% de conteúdo nacional nas obras do setor petróleo promovidas pela Petrobrás e caminha para perder essa qualificação. O pré-sal oferece excelente oportunidade para o desenvolvimento da tecnologia, da engenharia e da indústria nacionais, a exemplo do que ocorreu em outros países.
Contratação direta da Petrobrás para a produção do petróleo Excedente da Cessão Onerosa
A Lei de Partilha prevê a possibilidade de contratação direta da Petrobrás nos casos de interesse estratégico nacional. Com base neste dispositivo, o CNPE aprovou, em 24/06/2014, a contratação da Petrobrás para a produção, em regime de partilha, do volume de petróleo excedente ao volume contratado sob o regime de Cessão Onerosa. Essa decisão vem sendo questionada pelo governo, interessado nos recursos que podem ser obtidos com o leilão de privatização daquele excedente, em benefício das petroleiras multinacionais.
A Petrobrás tem sido exitosa na exploração e produção dos 5 bilhões de barris de petróleo que adquiriu do governo sob o regime de Cessão Onerosa. A partir das descobertas da estatal, está previsto ali existirem até 20 bilhões de barris. Nada mais lógico, justo e adequado, para a empresa e para o País, que a Petrobrás unifique tais áreas para produção e partilha com a União com do óleo produzido. A decisão original do CNPE deve ser mantida, pois, permitirá repor a produção acumulada, assegurar um volume potencial com baixo risco exploratório e economizar custos de descoberta.
Assegurar o direito da Petrobrás como operadora única do pré-sal
Após uma longa, injusta e equivocada campanha midiática contra a Petrobrás, transformando-a, falsamente, em uma “empresa falida e incapaz de investir no pré-sal”, o governo retirou da empresa o direito de ser operadora única do pré-sal e de ter, no mínimo, uma participação de 30% de cada projeto licitado. Temos demonstrado que a dívida pode ser facilmente administrada sem as privatizações planejadas, uma vez que a Petrobrás tem reservas em caixa acima dos US$ 22 bilhões, geração de caixa crescente, acima dos US$ 27 bilhões por ano e elevado índice de liquidez corrente (1,9 em 2017). Sem reconhecer os benefícios operacionais e estratégicos que a operação única pela estatal pode trazer para o País, o governo preferiu atender aos reclamos do mercado e das petroleiras multinacionais estrangeiras.
Propomos restabelecer a Petrobrás como operadora única do pré-sal, de forma a modular a produção em benefício do País, estimular o desenvolvimento industrial com o uso de mais bens de produção local, garantir o progresso tecnológico nacional, evitar fraudes, repor reservas extraídas, diminuir custos de produção da estatal e garantir empregos para os brasileiros. Além de reconhecer o esforço da Petrobrás que, pioneiramente, vasculhou as profundezas da terra e do mar, descobrindo e viabilizando, em tempo recorde, a produção na área do pré-sal antes que qualquer outra empresa ali se aventurasse.
Revisão do planejamento estratégico e da política de distribuição de dividendos da Petrobrás
A principal meta do Plano de Negócios 2018-2022 não é adequada à companhia, uma empresa integrada de petróleo e energia. Acreditamos que tanto o indicador Dívida Líquida / EBTIDA, quanto sua meta (2,5) e prazo (2018) são inadequados para uma empresa como a Petrobrás que tem potencial de crescer em termos de produção e geração de caixa. A dívida existente é perfeitamente administrável e, em nosso entendimento, adotar este indicador e prazo serve apenas para justificar a privatização de ativos estratégicos e rentáveis, com prejuízo para a geração de caixa futura, assumindo riscos empresariais desnecessários e desintegrando a Petrobrás. Conforme demonstrado em nossos votos nas assembleias de acionistas, artigos e cartas enviadas pela AEPET à direção da Petrobrás. Por exemplo, aqui e aqui.
O plano atual prevê a venda de ativos de campos em produção, logística, refino e o abandono das áreas de petroquímica, fertilizantes e biocombustíveis. A ótica é unicamente financeira e não valoriza o posicionamento estratégico construído pela Petrobrás. A distribuição mínima de dividendos é de 25% do lucro líquido ajustado, sem limite superior, com a antecipação trimestral do pagamento.
Propomos rever o plano para investir na integração das atividades da companhia, na agregação de valor ao petróleo e gás e na recuperação do mercado interno. É preciso valorizar as sinergias do conjunto e a sua grandeza. Rever a política de distribuição de dividendos e o estatuto social para reduzir a distribuição mínima e estabelecer um limite máximo, além de eliminar a antecipação trimestral, para que a Petrobrás não seja submetida a interesses especulativos e de curto prazo.
Controle e limitação da exportação de petróleo
O atual governo não dispõe de uma política para o controle da produção e da exportação de petróleo. Não conhece todo o potencial de reservas do pré-sal, mas apressa leilões de áreas que podem conter dezenas de bilhões de barris de óleo, apenas para cobrir déficits fiscais. Esta política poderá levar ao esgotamento prematuro das reservas nacionais.
Propomos investir na delimitação de jazidas e na definição das reservas do pré-sal, como condição para definir a extensão das concessões. O óleo produzido deve ser direcionado, prioritariamente, para o uso interno e para a produção de derivados pelo parque de refino nacional. A exportação deve ser residual. O objetivo do planejamento da produção deve ser a segurança energética nacional e o abastecimento aos menores custos possíveis.
Revisão dos subsídios concedidos às petroleiras e da legislação que impacta estatais brasileiras
O governo Temer assumiu a agenda das multinacionais estrangeiras cuja prioridade é a apropriação do petróleo e operação nos consórcios para o pré-sal. A agenda demanda subsídios elevados e legislações facilitadoras com prejuízo para o País.
Propomos analisar com rigor todos os subsídios concedidos, revogando leis como a 13.586/2017 e revisando as legislações facilitadoras aprovadas. O pré-sal não demanda incentivos, pois, os riscos de investimento são baixos. As companhias viriam, como sempre vieram, para serem parceiras da Petrobrás que deve liderar a operação.
Estabelecimento de políticas públicas para a distribuição da renda petroleira
A legislação vigente estabelece o pagamento de bônus pelas empresas licitantes e de taxas, royalties, impostos e contribuições pelas produtoras de óleo e gás. Essas rendas são repassadas à União, Estados e Municípios, para fins específicos, mas, grande parte é desviada ou desperdiçada.
Propomos rever a legislação e estabelecer obrigações mais rigorosas para o uso dos repasses, orientando-os para suportar programas sociais, desenvolvimento de ciência e tecnologia, produção de biocombustíveis e energias renováveis. Incluir exigências de eliminação de desperdícios para elevar a eficácia no uso dos recursos.
Recompra das ações da Petrobrás negociadas na Bolsa de Nova Iorque
Ações da Petrobrás são negociadas em bolsas norte-americana, europeia e argentina. Essa condição submete a empresa à regulação exercida por leis e órgãos de fiscalização estrangeiros. É uma fragilidade desnecessária, agravada pela transferência de divisas para o exterior via remessa de dividendos. Colocar suas ações em bolsa estrangeira é sujeitá-la a outros propósitos, distintos de sua criação e de suas atividades, é amesquinhar os objetivos da companhia.
O prejuízo potencial da perda da soberania brasileira ao alienar parcela relevante das ações da Petrobrás na bolsa de valores dos EUA foi evidenciada recentemente, no acordo para pagamento antecipado da indenização de US$ 2,95 bilhões aos acionistas estrangeiros. Leia a nota da AEPET.
Também se verifica, um flagrante caso de extraterritorialidade legal que deriva dessa decisão, uma vez que a Petrobrás, bem como sua força de trabalho, se vê subordinada à Lei estadunidense Sarbanes-Oxley. Trata-se de mais uma manifestação inequívoca de que nossa soberania se vê ferida.
Propomos que as ações da Petrobrás devem ser retiradas de bolsas de valores estrangeiras, com o pedido de suspensão das transações e a negociação para sua compra.
Conclusão
Os combustíveis de origem fóssil – petróleo, gás natural e carvão – respondem por cerca de 90% da matriz energética mundial. Apesar do aumento da importância relativa dos renováveis, ainda são pouco relevantes na partilha total (5%). Os custos mais elevados para a produção do petróleo não convencional e dos renováveis, além da natureza intermitente da produção das energias eólica e solar, representam severa restrição ao aumento da produtividade e do crescimento econômico mundiais.
O petróleo é um bem público e estratégico. Petróleo e gás natural são fontes primárias de mais de 50% da energia consumida no planeta, a sua disponibilidade é essencial ao desenvolvimento social e econômico e à soberania das nações.
O petróleo é especial, na medida em que não tem substitutos em equivalente qualidade e quantidade. Sua elevada densidade energética e a riqueza de sua composição, em orgânicos dificilmente encontrados na natureza, conferem vantagem econômica e militar àqueles que o possuem. A sociedade que conhecemos, sua complexidade, sua organização espacial concentrada, sua produtividade industrial e agrícola, o tamanho da superestrutura financeira em relação as esferas industrial e comercial, foi erguida e depende do petróleo.
O esgotamento do petróleo convencional e barato de se produzir, com a redução do excedente energético e econômico da indústria petroleira está transformando, aceleradamente, a sociedade. É necessário garantir a propriedade do petróleo e ficar com seu valor de uso. Atender as necessidades dos brasileiros e erguer a infraestrutura dos renováveis para uma nova organização social.
Em face dessas características, os países industrializados não hesitam em utilizar todos os meios necessários para assegurar o seu suprimento. Guerras, revoluções induzidas, intervenções armadas, patrocínio de golpes de estado, cooptação da mídia e corrupção de agentes públicos e executivos locais têm sido, historicamente, instrumentos utilizados para garantir o acesso às reservas de petróleo e gás natural.
Até o início deste século, o Brasil foi importador líquido de petróleo e sofreu duramente os impactos das sucessivas crises ocorridas no mercado internacional. Para garantir o suprimento de combustíveis ao mercado interno e reduzir a remessa de divisas para o exterior, a Petrobrás optou, desde a sua criação, pela implantação de um parque de refino no país, modelado para processar petróleo nacional e importado. Na esteira da construção desse parque, floresceu uma indústria nacional que, em apenas duas décadas, tornou-se capaz de fornecer 80% dos bens e serviços requeridos pelos investimentos da Petrobrás.
Nos últimos 20 anos, a empresa investiu nos setores de gás natural e biocombustíveis e promoveu a diversificação de seus negócios no setor de energia, com usinas termelétricas, eólicas e pequenas centrais hidrelétricas (PCHs). Com a descoberta do pré-sal, a Petrobrás alcançou posicionamento estratégico de causar inveja às multinacionais, abaladas pela queda dos preços do petróleo e pela dificuldade de recuperar reservas esgotadas pela produção.
A natureza e o trabalho de gerações de brasileiros nos deram a grande oportunidade que é o petróleo do pré-sal. Precisamos ser capazes de empreender um projeto soberano para, desta vez, usar as riquezas naturais brasileiras em benefício da maioria da população. Para isso é essencial que o modelo de negócios da Petrobras seja diferente do fracassado modelo adotado pelas maiores multinacionais de capital privado e que os candidatos às eleições gerais de 2018 conheçam e debatam alternativas para o setor.
Felipe Coutinho é presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET)