Quito (Prensa Latina) O presidente do Equador, Daniel Noboa, comemora um ano no poder neste 23 de novembro com os olhos postos na reeleição, mas com um país no escuro, inseguro e com poucas oportunidades de emprego formal.
Por Adriana Robreño
Correspondente-chefe no Equador
É assim que veem centenas de equatorianos que saíram às ruas em diversas cidades em repúdio à gestão governamental.
“Não há luz, não há educação e ele tem a coragem de pedir a reeleição” e “Fora, Noboa, fora”, foram ouvidos durante as mobilizações.
O presidente da Frente Unida dos Trabalhadores, José Villavicencio, destacou que “há descontentamento porque é um Governo incapaz, mentiroso, que não resolveu os problemas do país e que hoje, com conotações de ditador, procura soluções à custa do povo equatoriano.”
A sonda Comunicaliza, no seu estudo mais recente, deu um apoio a Noboa de cerca de 30 por cento, embora aponte que o presidente perdeu popularidade desde janeiro, quando a sua aceitação rondava os 50 por cento.
PLANO FÊNIX?
O Equador fechou 2023 com uma taxa de 45 mortes violentas por 100 mil habitantes, ou seja, com o maior número de homicídios de sua história.
Em 9 de janeiro deste ano, Noboa decretou a existência de um conflito armado interno e classificou como terroristas as quadrilhas criminosas ligadas ao tráfico de drogas.
Além disso, nessa data o chefe de Estado militarizou as prisões e declarou o estado de emergência depois de uma série de atos violentos em várias províncias do país terem mesmo circulado pelo mundo;
Quase um ano depois destas decisões, o número de homicídios no Equador aproxima-se dos seis mil, embora as autoridades insistam que a violência foi reduzida em 18 por cento e este 2024 terminará aparentemente como o segundo ano com mais assassinatos.
Em plena crise de segurança, a Assembleia Nacional iniciou um julgamento político contra a Ministra do Interior, Mónica Palencia, por incumprimento das suas funções, mas não houve votos para a censurar e demitir;
O movimento Revolução Cidadã (RC), que promoveu o processo, insistiu que não existe o chamado Plano Fênix, estratégia com a qual Noboa promoveu em sua campanha a promessa de acabar com o crime organizado.
Para o legislador Leonardo Berrezueta, do RC, “o Plano Fénix é uma ilusão, uma promessa vazia, um belo espaço de marketing político”.
Por sua vez, ativistas e defensores dos direitos humanos criticam a estratégia do presidente de militarizar e encarcerar em vez de atacar a raiz do problema, ou seja, a pobreza e a desigualdade social.
O Comité dos Direitos Humanos das Nações Unidas (ONU) publicou um relatório que expõe as suas preocupações sobre os “frequentes e aparentemente normalizados” estados de excepção, alguns declarados inconstitucionais.
Apesar de tudo isso, persistem tumultos entre gangues nas prisões, deixando pessoas mortas e até brigas por comida, algo que é escasso dentro dos centros penitenciários, segundo denúncias de familiares dos presos.
ASSALTO À EMBAIXADA MEXICANA E POLÍTICA EXTERNA
Em termos de política externa, o período de Noboa à frente do Palácio Carondelet foi marcado pela sua decisão de atacar a embaixada mexicana em Quito em Abril passado para prender o antigo vice-presidente Jorge Glas, que lá se encontrava como requerente de asilo.
Este facto provocou a condenação da comunidade internacional e o México acusou o Equador perante o Tribunal Penal Internacional de “ultrapassar limites que não deveriam ser ultrapassados no direito internacional”, por entrar violentamente na embaixada e atacar fisicamente um diplomata.
O incidente, que o governo Noboa justificou com a alegada fuga de Glas – acusado pela justiça nacional embora muitos o considerem perseguido – provocou o rompimento das relações diplomáticas entre as duas nações.
Desde a ocorrência destes acontecimentos, o ex-vice-presidente encontra-se na prisão de segurança máxima de La Roca, em Guayaquil, apesar das exigências do governo mexicano e de diversas figuras políticas para que o seu direito de asilo seja respeitado e que lhe seja concedida passagem segura.
Para os analistas, uma das consequências desse acontecimento, bem como outros erros diplomáticos, levou ao recente fracasso da XXIX Cimeira Ibero-Americana de Chefes de Estado e de Governo, realizada em Cuenca, que teve a menor presença de líderes e concluiu sem uma declaração.
“Esta situação vergonhosa é o resultado do colapso absoluto da nossa política externa e de um presidente que se tornou motivo de chacota da comunidade internacional”, disse o ex-ministro das Relações Exteriores do Equador, Guillaume Long.
A política externa de Noboa também foi fortemente questionada por polêmicas como a que surgiu com a Rússia em fevereiro de 2024 devido à tentativa do Equador de entregar aos Estados Unidos armas soviéticas consideradas sucatas em troca de dispositivos de nova geração.
Por fim, o Equador desistiu deste intercâmbio que afetaria as relações bilaterais e comerciais com o país eurasiano, que neste contexto chegou a suspender a compra de bananas equatorianas alegando problemas fitossanitários.
Os movimentos sociais alertaram que a política externa do atual governo está alinhada com os interesses dos Estados Unidos e de Israel e apelam a uma mudança dessa posição.
ACORDO COM O FMI, AUMENTO DO IVA, AUMENTO DOS COMBUSTÍVEIS
Na esfera económica, os equatorianos viram com Noboa um aumento nos impostos, no valor dos combustíveis e no emprego informal.
Embora o presidente tenha implementado alterações fiscais no seu primeiro ano que lhe permitiram ter mais rendimentos, os gastos com investimento público continuam a ser uma dívida para com os cidadãos.
Ao mesmo tempo, o Fundo Monetário Internacional (FMI) aprovou a entrega de um empréstimo de quatro mil milhões de dólares em meio a questionamentos ao Governo sobre o impacto daquele acordo.
Especialistas alertaram que boa parte dos recursos recebidos será destinada ao próprio FMI, entidade com a qual o país tem uma dívida de quatro mil milhões de dólares apenas por vencimentos ou amortizações, já que o montante total ascende a mais de nove mil milhões.
A Comissão de Transparência, Participação Cidadã e Controlo Social da Assembleia Nacional (parlamento) analisou o acordo e recomendou declarar o acordo como ilegítimo, o que consideram inconstitucional.
O aumento de três pontos do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), que passou de 12 para 15 por cento desde 1 de abril, bem como a eliminação do subsídio à gasolina de baixa octanagem (Extra e Ecopaís) são considerados parte da receita imposta pela organização internacional
O Executivo justificou o aumento do IVA com a necessidade de mais receitas para financiar as operações no quadro do conflito armado interno, no entanto, a violência persiste nas ruas com acontecimentos noticiados diariamente pela imprensa nacional.
NA ESCURIDÃO
Embora em Janeiro a Assembleia Nacional tenha aprovado uma lei económica urgente segundo a qual não haveria mais apagões no Equador, a verdade é que há dois meses esta nação sul-americana sofre cortes prolongados de eletricidade.
A chefe da Câmara de Comércio de Quito, Mónica Heller, estimou que o setor industrial em 60 dias de interrupções perdeu quatro bilhões de dólares e o sindicato comercial cerca de três mil e 500 milhões.
Especialistas e cidadãos asseguram que a origem da atual emergência energética está na falta de investimento e de previsão das autoridades, que não adoptaram medidas em resposta aos relatórios que previam a seca.
De facto, a ex-ministra da Energia Andrea Arrobo, acusada de alegada sabotagem, afirmou que alertou os responsáveis presidenciais no passado mês de Abril sobre a gravidade da situação no sector eléctrico.
Noboa culpa constantemente os governos anteriores pela crise e prometeu que até dezembro deste ano terminarão os cortes que começaram em 23 de setembro e que atualmente duram oito horas por dia.
Anteriormente, o governante, que aspira à reeleição em 2025 e cuja imagem foi afetada pelos apagões, ofereceu-se na rede nacional para reduzir gradualmente o tempo de interrupções elétricas até atingir quatro horas por dia, no entanto, essa promessa não foi cumprida. cumprimento.
CONFLITO COM O VICE-PRESIDENTE
As divergências entre o chefe do Executivo e sua vice-presidente, Verónica Abad, ficaram evidentes desde a eleição da dupla e então, em 8 de dezembro de 2023, poucos dias após a posse, Noboa a enviou a Israel como embaixadora e colaboradora para a paz.
Sem que ninguém saiba por que, embora afirme ter motivos, Noboa afirmou numa entrevista que “poderia tê-la enviado para a Antártida”.
Após diversos processos no Tribunal Contencioso Eleitoral e acusações criminais contra seu filho, no dia 9 de novembro, o Ministério do Trabalho suspendeu Abad de suas funções por 150 dias, sem remuneração.
A medida é tomada por “abandono injustificado do trabalho por três ou mais dias úteis”, considerando que não chegou de Tel Aviv a Türkiye na data estabelecida pelo Itamaraty.
Enquanto políticos e juristas de diferentes tendências ideológicas criticaram a decisão do Executivo como inconstitucional, a punição do segundo chefe do Executivo levou à nomeação de Sariha Moya como vice-presidente responsável.
Abad, que já regressou ao Equador no que classificou como “um ato de rebelião”, declarou que o Governo procurava uma forma de a desqualificar para que não assuma a presidência quando Noboa pedir licença para fazer campanha por as eleições de 2025.
Esse é o panorama do Equador depois de um ano de Noboa à frente do Palácio Carondelet, um período em que o “quadro social dramático” se soma à forma como “ele tentou marginalizar os adversários e cortar obstáculos ao seu triunfo”, alertou o historiador. Juan Paz e Minho.
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