Editorial do Vermelho
Fatos como a ordem de prisão imediata contra o ex-presidente da Bolívia Evo Morales e a denúncia de um procurador do Ministério Público Federal (MPF) em Brasília contra o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, por suposta calúnia ao ministro da Justiça, Sérgio Moro, são episódios que atestam a gravidade da ofensiva da extrema direita na região. São subprodutos da cadeia de golpes que engolfou o Brasil e levou à fraude do impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff em 2016.
Em graus diferentes, os atentados às instituições democráticas têm sido a base para os golpistas formar o seu arcabouço político. Mesmo na Argentina, onde não aconteceu um processo demarcado por essa nova modalidade golpista que se espalhou na região quando o neoliberal Maurício Macri substituiu Cristina Kirchner na Presidência da República, houve a prática de instrumentalizar setores do Judiciário para fazer perseguição política.
O caso mais violento é o da Bolívia. A coincidência de ter havido o golpe ao mesmo tempo em que ocorriam rebeliões populares quase simultaneamente no Equador, no Chile e na Colômbia mostrou o contraste entre os dois projetos fundamentais que disputam a região. Enquanto o povo nas ruas protestava contra os efeitos do neoliberalismo neocolonial, os golpistas assumiam dispostos a impor o seu projeto à base de forte repressão.
No Brasil, esse projeto avança celeremente. A forma autoritária como Moro se manifestou sobre a denúncia do procurador é uma boa medida dessa escalada. Ao acusar Felipe Santa Cruz de militante político-partidário, o ministro deu razão aos que veem em suas posturas uma conduta marcada pela ideologia de extrema direita.
Ele demonstrou intransigência e intolerância, procedimentos incompatíveis com as prerrogativas de quem está investido de um alto poder na República, regido pelo Estado Democrático de Direito. Segundo a assessoria de Moro, ele espera “que a Justiça seja feita e que a ação por calúnia demova o presidente da OAB de persistir com ofensas gratuitas às autoridades públicas”.
Não há mediação nessa afirmação. É um claro expediente de intimidação, com conotação de ameaça. Como bem caracterizou a defesa de Santa Cruz, “tal postura (do MPF) é um atentado à liberdade de expressão, de crítica, e fragiliza o ambiente democrático”.
Essas atitudes – do procurador e de Moro – devem ser vistas com preocupação. Elas estão inseridas no rol de objetivos do conjunto de medidas que o ministro da Justiça e o presidente Jair Bolsonaro tentam implementar para amordaçar os que defendem o pleno exercícios dos diretos democráticos.
São atitudes típicas da ideologia do Estado de exceção, condizentes com os propósitos anunciados quando o grupo bolsonarista se constituiu como projeto de poder. Eles estão dando consecução a esse projeto, construindo a estrutura do programa de governo da modalidade de golpes do projeto neoliberal e neocolonial que chegou à região.
A Operação Lava Jato, que tem sido o esteio da travessia do golpe à sustentação desse projeto de poder, exportou suas práticas para países vizinhos e no Brasil segue praticando arbitrariedades, como se viu no recente episódio envolvendo o filho do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Fábio Luís Lula da Silva. São evidências de que a luta democrática precisa, urgentemente, reunir forças para enfrentar a escalada autoritária.