Já dizia o finado Paulo Henrique Amorim: “quando você fala em jornalismo independente, eu penso em um jornalismo desligado dos grandes grupos… Aqui nos jornais brasileiros até o horóscopo é partidário, a previsão do tempo”. Não à toa, cunhou o termo PIG – Partido da Imprensa Golpista.
Infelizmente isso não é exclusividade em nosso país. Li recentemente o livro “Corrupção à americana – desnudando as mentiras, a imprensa, os empresários e os políticos que produzem e lucram com a guerra”, dos jornalistas Amy Goodman e David Goodman, que destrincha bravamente o que a mídia internacional – em especial a estadunidense – e seus interesses escusos fazem para acobertar falácias no intuito de manipular a opinião pública.
Citarei dois exemplos, tomando a liberdade de citar alguns breves trechos do livro, para que possamos entender que quando há corporativismo na imprensa, não há democracia.
A história de exploração do petróleo por empresas dos EUA – como Shell e Chevron – é antiga, e a mídia segue conivente, em silêncio, com as ações bárbaras e genocidas que este país faz para atingir seus objetivos. Basta lermos o relato da ação armada contra aldeões na Nigéria, em 1998, que ocuparam, em protesto, uma barcaça petrolífera da Chevron e foram almejados por tiros e bombas de gás por militares do país, causando a morte de dois nativos, ferindo outras dezenas. Em menos de um ano, novamente militares em helicópteros e barcos (da Chevron!) atacaram outro povoado, exterminando quatro pessoas e queimando todo o local e mostrando domínio sobre o maior produtor do ouro negro do continente africano.
(Em tempo 1: Um dos diretores do quadro da Chevron nesse período, era justamente Condoleezza Rice que, em 2003, foi nomeada por Bush filho como liderança para a “reconstrução do Iraque”).
Em 11 de Setembro de 2001, o mundo parou para acompanhar, atônito, a queda das Torres Gêmeas em Nova Iorque. No entanto, pouca gente sabe que Osama bin Laden – que antes de ser o “terrorista” mais procurando do mundo – era conhecido e “amigo” de Washington, quando foi financiado e patrocinado pelos EUA na década de 1980 para atrair os soviéticos ao Afeganistão. Na ocasião, conforme relatado no livro, a CIA gastou US$ 3 bilhões nessa estratégia de armamento ao grupo fundamentalista de Bin Laden – e, claro, em uma operação secreta. O efeito bumerangue aconteceu, e após a devassa feita no país asiático e o abandono da população e desses grupos – agora chamados de “terroristas da Al-Qaeda” –, seus aliados viraram seus inimigos. Mas o acobertamento da mídia estadunidense não para aí.
Outro ponto que quase nunca se ouviu falar é que em setembro de 2000, o recém fundado PNAC (Projeto para o Novo Século Americano) apresentava um relatório que “convocava os Estados Unidos para dominarem as riquezas globais e, portanto, o mundo”. E, de acordo com o fatídico e comprometedor relatório, seria necessário algum evento catastrófico e catalisador – como um novo Pearl Harbor. Curiosamente, o mesmo projeto recomendou o gasto com armas de US$ 48 bilhões e que, Bush assumindo a presidência, o alvo deveria ser o Iraque. E Bush explorou isso da melhor maneira. Incitou o ódio contra muçulmanos, provocando respostas que justificassem “intervenções democráticas, libertadoras e antiterrorismo”.
Um aspecto no mínimo curioso, e que abastece a bagagem de uma teoria conspiratória, é levantado no livro – e, claro, omitido pelos jornalões: no mesmo dia do “atentado” ao World Trade Center, reuniam-se no Ritz Carlton Hotel, em Washington, o grupo de investidores do Carlyle Group – ao qual Bush pai era conselheiro sênior e levara para o encontro outros aliados. A maior coincidência (?), no entanto, era a presença de Shafiq bin Laden, irmão de Osama e vários sauditas (e seu petrodólares). Horas depois da tragédia, o espaço aéreo dos EUA foi fechado, e dada a ordem para que nenhum avião decolasse, porém, o alto escalão da Casa Branca autorizou aviões a levar 140 sauditas, inclusive duas dúzias de membros da família bin Laden, de 10 cidades americanas, de volta à Arábia Saudita, sem qualquer tipo interrogatório. O motivo, ninguém sabe, mas é sabido que o clã dos Bush sempre manteve relações suspeitas com os sauditas, suas ditaduras e suas “doações” milionárias para a Biblioteca Presidencial de Bush, a campanha contra o analfabetismo de sua esposa, Bárbara Bush e o lançamento do Fundo de Bolsas Escolares George Herbert Walker Bush.
Os ataques ao Afeganistão e Iraque foram autorizados sob a desculpa da “guerra contra o terrorismo”, promovendo caos e a destruição e com isso, portas abertas para empresas estadunidenses reestruturarem tais países. Em nova cartada, o supervisor indicado por Bush era o banqueiro Tom Foley, assistido por James Baker, advogado especialista em assuntos políticos e um dos sócios da firma de advocacia Baker Botts, que defende o governo saudita numa ação judicial impetrada pelas famílias das vítimas dos ataques do 11 de Setembro. Um prato cheio para CNN, NBC, New York Times, Washington Post e cia, certo? Mas não. Nada disso foi motivo de manchetes ou noticiários.
A conexão quase que siamesa entre EUA e Arábia Saudita é antiga e não parece ter fim. Afinal, os ianques desejam o petróleo barato, enquanto os sauditas se abastecem de forma dependente da indústria bélica do EUA, sendo seus maiores clientes estrangeiros. Isso justificaria a não publicação de notícias comprometedoras, assim como a retirada de páginas do relatório final da comissão congressional sobre o 11 de Setembro, justamente onde estavam informações sobre o papel da Arábia Saudita nos ataques.
(Em tempo 2: no caso do Brasil, os interesses dos EUA foram aceitos com o Golpe de 2016, o que fez com que José Serra (PSDB), pagando sua dívida com a Chevron, conforme documentos vazados pelo site Wikileaks – e, tal como fizeram nos EUA, nada foi divulgado pela mídia oligárquica. Nesses documentos, o então senador tucano e candidato à presidência em 2010, fazia a promessa de garantir acesso ao Pré-Sal aos executivos da Chevron, derrubando o sistema de partilha. Como não foi eleito, apresentou o PLS 131/2015 que defendia a participação mínima da Petrobrás na exploração do valioso Pré-Sal. Logo após sua nomeação como ministro das Relações Exteriores, pressionou a votação do projeto e o crime lesa-pátria foi concretizado. Poucos meses depois, alegando problemas de saúde, pediu exoneração e entrou no anonimato).
Juan-González, coapresentador do Democracy Now! e colunista do Daily News, é certeiro em suas palavras ditas no livro, as quais transcrevo abaixo:
“O jornalismo não é apenas um produto para consumo, como cerais ou carros. No que tem de melhor, é uma profissão nobre e um serviço público. Ele ajuda a consertar o que está errado, dá força àqueles que não têm poder, informa e esclarece leitores, espectadores e ouvintes sobre eventos que estão fora de sua experiência direta. Mas, no que tem de pior, o jornalismo se torna apenas uma atração para os comerciais. Ele distorce realidades, inflama paixões, reitera estereótipos, marginaliza pontos de vista discordantes e funciona como um porta-voz para os poderosos”.
Fazendo um paralelo com a educação que é (e deve ser!) libertadora, cabendo aos educadores e discentes lutarem por isso, sem jamais sucumbir às pressões e se sujeitar à censura, a mídia e seus profissionais devem defender igualmente isso. É de fundamental importância o acesso às informações, pois as pessoas informadas ganham poder, contestam, lutam!
Portanto, essa ferramenta deve ser liberta das amarras do capital e seus interesses, possibilitando e promovendo o debate social. Deve ser acima de qualquer coisa, democrática, inclusiva, pois só assim conquistaremos as verdadeiras e necessárias mudanças na sociedade.
*Professor, Biólogo, Doutor em Etologia, Mestre em Ciências, Especialista em Bioecologia e Conservação.
Luiz Padulla
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Prof. Luiz Fernando Leal Padulla
*Biólogo*
Doutor em Etologia
Mestre em Ciências
Especialista em Bioecologia e Conservação
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