Quito (Prensa Latina) Em novembro de 2023, o Equador despediu-se da presidência de Guillermo Lasso, que deixou o cargo com baixos níveis de aceitação devido a uma gestão governamental marcada pela insegurança, problemas econômicos e crise energética.
Por Adriana Robreño*
Desde o início do ano já se configurava como turbulento, pois haveria eleições regionais e locais em fevereiro e o então presidente aproveitou para propor uma consulta popular para modificar a Constituição, o que na sua opinião contribuiria para resolver os problemas de segurança e institucionalidade dos cidadãos.
No entanto, a oposição, liderada pela Revolução Cidadã (RC), venceu as eleições ao vencer nove prefeituras, cerca de 60 prefeituras e centenas de cargos em juntas paroquiais, incluindo os governos de Quito e Guayaquil, as principais cidades do país.
Lasso sofreu assim uma derrota retumbante depois que os cidadãos rejeitaram as oito questões do referendo e isso constituiu um golpe político do qual não conseguiu se recuperar.
A partir desse momento, debilitado por aquele resultado e atingido por denúncias de suposta corrupção em empresas públicas, o presidente passou a ser aludido em acusações de supostas ligações com o tráfico de drogas em um complô por meio de seu cunhado Danilo Carrera e de um amigo, Ruben Cherres, morto pouco depois.
Com esses argumentos, a oposição iniciou um processo de julgamento político no Legislativo para destituir Lasso, embora após a análise do caso pelo Tribunal Constitucional, ele só pudesse ser acusado de suposto peculato (desvio) em contratos da empresa pública Flota Petrolera Equatoriana .(Flopec).
MORTE CRUZADA
Quando a Assembleia Nacional (Parlamento) estava prestes a votar a possível destituição do governante, este invocou a “morte cruzada”, mecanismo previsto na Constituição, mas nunca antes aplicado.
Por meio do decreto 741, Lasso cedeu à medida um dia após o início do processo de impeachment contra ele.
Após a disposição, vários ex-deputados, movimentos sociais e sindicais apresentaram mais de cinco recursos para o Tribunal Constitucional (CC) para impugnar a decisão, classificada como inconstitucional por não cumprir os requisitos que justificam a sua aplicação.
No entanto, o órgão de justiça decidiu por unanimidade rejeitar os pedidos de revogação da decisão do chefe do executivo.
Embora o mecanismo tenha sido considerado um recurso fraudulento no contexto em que foi aplicado, muitos analistas e políticos consideraram encorajador o fato de a via eleitoral resolver a saída definitiva de Lasso do poder.
Desta forma, o chefe de Estado dissolveu o Parlamento, antecipou a sua saída do cargo e antecipou eleições gerais, votações realizadas em duas voltas, em 20 de agosto e 15 de outubro, que levaram à vitória do candidato de direita Daniel Noboa, de a aliança da Ação Democrática Nacional (ADN).
INSEGURANÇA EM AUMENTO
Guillermo Lasso encerrou seu mandato com um equilíbrio alarmante em termos de insegurança, marcado por um aumento de assassinatos, sequestros, tumultos em prisões e uma transformação na natureza do crime no Equador.
Durante os primeiros 10 meses de 2023 foram registados cerca de seis mil assassinatos em território nacional e provavelmente no final do ano serão confirmadas mais de sete mil mortes violentas, um número nunca antes visto.
A crise carcerária também se agravou, com massacres que, embora tenham começado durante o governo de Lenín Moreno, continuaram durante o mandato de Lasso com um saldo de mais de 400 presos mortos na prisão.
Para conter estes números, o chefe do Executivo declarou repetidas vezes estados de exceção, mas sem resultados palpáveis na redução da violência.
Segundo a tese do governo, esta situação deve-se à crescente apreensão de drogas e aos ataques contra o tráfico de droga, embora os especialistas considerem que a pobreza, bem como a falta de emprego e de oportunidades, incentiva o envolvimento dos jovens em grupos criminosos.
Em seu plano de trabalho, o presidente Lasso prometeu proteger a vida e o bem-estar dos cidadãos, mas o Equador é um dos 10 países com maior índice de criminalidade e as cidades costeiras de Durán e Guayaquil entraram na lista das mais violentas do mundo.
Neste contexto se insere a violência política, com casos que abalaram o país em 2023, como o assassinato do candidato presidencial Fernando Villavicencio e do prefeito de Manta Agustín Intriago.
ECONOMIA NOS NÚMEROS VERMELHOS
Na esfera econômica, o banqueiro-presidente não se saiu bem no ano que está prestes a terminar, deixando o cargo com um país no vermelho.
O que se pode dizer que o presidente conseguiu foi o aumento do salário mínimo, que passou de 400 dólares no início do mandato para 450, um aumento de 25 dólares por ano, embora a sua ideia fosse chegar aos 500.
Porém, mais da metade dos trabalhadores são informais, ou seja, não têm as garantias estabelecidas em lei, como receber pelo menos o salário base.
Líderes de municípios e paróquias rurais do país andino exigiram de Lasso as atribuições pendentes para as administrações locais.
Por outro lado, existe o risco de incumprimento ou de não pagamento das obrigações contraídas com organismos internacionais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), porque o défice fiscal está a aumentar, os atrasos no sector público estão a acumular-se e o dinheiro é escasso para múltiplas necessidades.
O FMI projetou um défice fiscal de cinco mil milhões de dólares, quase quatro por cento do Produto Interno Bruto (PIB), no final deste ano.
Em outubro, aquele organismo reduziu a projeção de crescimento do país sul-americano para 2023 para 1,4 por cento, em vez dos 2,9 por cento previstos no início do ano, enquanto a perspectiva para 2024 também diminuiu para 1,8 por cento.
O RETORNO DOS BLACKOUTS
A isto soma-se o facto de o presidente cessante ter deixado ao seu sucessor, Daniel Noboa, uma crise energética, com um défice na geração de eletricidade que provocou apagões desde o final de outubro, após 14 anos sem tais acontecimentos.
O Ministério de Energia e Minas argumenta que a crise elétrica persiste pela falta de chuvas e porque as reservas nos reservatórios das hidrelétricas não atingiram níveis ótimos.
Os apagões trazem consigo não só desconforto entre os cidadãos, mas também perdas económicas milionárias, alertaram diferentes sindicatos que culpam Lasso e o seu Executivo por não adotarem medidas oportunas para evitar o racionamento.
Uma sondagem da Opinion Profiles, publicada em Novembro, indicava que o ex-governador – que prometeu resolver os problemas do país em 100 minutos – despediu-se com apenas 12,29 por cento de aprovação.
Nessas circunstâncias, deixou o poder em 23 de novembro e para os equatorianos iniciou um período cheio de expectativas com Daniel Noboa à frente do Executivo, um jovem também de tendência conservadora, herdeiro de uma das famílias mais ricas do país.
As críticas ao novo presidente são evidentes um mês após a sua chegada ao Palácio Carondelet, enquanto os equatorianos exigem medidas urgentes e concretas contra a insegurança, e o seu projeto económico urgente é uma reforma fiscal que favoreça os grandes grupos econômicos.