E a lei acovardada se afasta da justa razão, não possuindo mais o caráter de lei, mas de violência
Pedro Augusto Pinho*
No primeiro volume da Suma Teológica, São Tomás de Aquino faz-nos uma admoestação: quando a lei se afasta da justa razão, não tem mais o caráter de lei, mas de violência (tradução livre).
Poderíamos ter infindável querela sobre a “justa razão”, mas creio não haver dúvida que ela não deve ser criadora de miséria física e moral, de opressão, de fome nem de migrações compulsórias.
A lei que rege nossos tempos é da concentração de bens e rendas, da disputa selvagem, desumana, do canibalismo social, a lei do neoliberalismo.
O neoliberalismo serviu para o financismo se apossar do controle do mundo capitalista. E, com o fim do mundo socialista, simbolicamente representado na queda do muro de Berlim (1989), o capitalismo financeiro, a banca, não só dominou a economia, mas a política, as comunicações, a academia e as leis.
Alguns ingênuos ou pouco afeitos à reflexão imaginam que a “corrupção pandêmica” é uma criação partidária, de governos tucanos ou petistas que procuraram construir, respectivamente, uma sociedade à feição da banca ou da cidadania.
Confrontemos a lei da banca com a construção da cidadania, observando uma qualidade, nunca assaz louvada, tomada como específica do capitalismo: a liberdade. Quase ao mesmo tempo que o Brasil formalmente extinguia a escravidão racial, o Papa Leão XIII editava (1891) a encíclica Rerum Novarum, que vinha “remediar o mal voraz da usura, acudir operários indefesos contra a desumanidade da desenfreada ambição pelos ganhos” (uso expressões da Encíclica sem me afastar dos conteúdos).
O que é liberdade para os senhores neo ou paleoliberais? Apenas o direito irrestrito à posse e ao gozo do possuído? Não estaríamos diante da falsa lei tomista?
Nestes difíceis anos do século XXI, temos observado, aqui e por toda parte, um surto de atrocidades, ora diretamente conduzidas por governos ora por eles incentivadas ou subrepticiamente planejadas e financiadas. Exemplo deste último caso foi o golpe de 2016 no Brasil.
O domínio da banca nas comunicações de massa leva à distorção dos fatos, à criação de falsas ideias e à deturpação de conceitos. Alguns exemplos: o Estado Islâmico foi criação da política externa dos Estados Unidos da América (EUA) como instrumento da banca para destruir governos e conjunto de riquezas, especialmente decorrentes do petróleo, nos países do norte da África e do Oriente Médio que se rebelavam com as ordens emanadas do sistema financeiro internacional. Surgem então as “armas de destruição de massas”, a designação de “ditador” para o líder capaz de manter a “unidade territorial Líbia” ou o desenvolvimento econômico e social da Síria. Enquanto as ditaduras da península arábica são convenientemente esquecidas, como o foram, a seu tempo, o cruel e corrupto Pinochet, Stroessner e outros “aliados”.
Desde a primeira eleição de Lula, a mídia da banca, praticamente a única no Brasil, procura construir-lhe a imagem de corrupto. Este feito levou Getúlio Vargas ao suicídio, João Goulart à deposição violenta, à inviabilidade de Leonel Brizola chegar à presidência nacional. E todos estes políticos tiveram várias vezes vasculhadas suas vidas, por peritos nacionais e estrangeiros, por organismos e empresas de espionagem e auditoria que jamais encontraram um único senão, como o que o juiz Moro procura, com os mesmos apoios, em Lula, com idêntico resultado. E, por favor, respeite minimamente sua própria inteligência, não me atribuindo um petismo ou lulismo que não tenho, nem jamais tive. Já em relação aos golpistas que se distribuem pelo atual governo .
Olhemos nossa realidade sem o manto diáfano da fantasia global.