Jeanine Áñez está presa preventivamente desde março de 2021 – LUIS GANDARILLAS / AFP
Ex-senadora foi condenada a 10 anos por autoproclamar-se presidenta durante golpe de Estado
O governo e o Ministério Público da Bolívia irão recorrer da decisão judicial do Tribunal Constitucional de La Paz, que condenou a ex-senadora Jeanine Áñez a dez anos de prisão por autoproclamar-se presidenta, violando a Constituição e resoluções do Legislativo. A sentença, emitida na última sexta-feira (10), foi unânime após quatro meses de adiamento das audiências do processo golpe de Estado.
Outros ex-funcionários militares da gestão interina também foram condenados por incumprimento de deveres.
A ministra da presidência, María Nela Prada, afirma que a sentença abre um precedente na história democrática boliviana. “Vamos proceder com a apelação pedindo 15 anos não pelos delitos, mas pelos agravantes que existem neste caso”, declarou.
Áñez estava presa de maneira preventiva desde março de 2021, e foi julgada como senadora, não como ex-presidenta, já que a justiça argumenta que sua gestão interina iniciou com base num golpe de Estado.
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Em novembro de 2019, a então senadora pelo departamento de Beni, Jeanine Áñez, com apoio de parlamentares de direita e as Forças Armadas, autoproclamou-se presidenta interina da Bolívia, saltando a sequência hierárquica de sucessão presidencial, prevista na lei, numa sessão legislativa sem quórum mínimo de senadores e deputados presentes.
Mesmo reeleitos pela quarta vez consecutiva, o então presidente Evo Morales e seu vice, Álvaro García Linera, foram forçados a renunciar à presidência, em outubro de 2019, após sofrer pressão do Exército e de milícias armadas de direita. Os dois ex-mandatários tiveram de exilar-se no México e depois na Argentina durante o governo golpista.
A retomada da presidência pelo MAS-IPSP só aconteceu quase um ano depois, com pressão popular para a realização de novas eleições.
A gestão de Luis Arce, baseada no relatório do Grupo Interdisciplinar de Especialistas Independentes (GIEI), acusa Áñez de delitos de lesa-humanidade por conta dos massacres das cidades de Sacaba e Senkata, que terminaram com um saldo de 38 pessoas assassinadas durante protestos contra o golpe em novembro de 2019.
:: Novo relatório confirma que houve massacres e abuso policial durante golpe na Bolívia em 2019 ::
Durante 11 meses de gestão interina, foram registradas prisões arbitrárias de pelo menos 1.534 pessoas. O partido Creemos, do governador do departamento de Santa Cruz e um dos protagonistas do golpe, Luis Fernando Camacho, publicou um comunidado pedindo “apoio da comunidade internacional” para reverter a sentença contra a ex-senadora. O partido Comunidad Ciudadana, de Carlos Mesa, ex-presidente e também artífice do golpe, acusa que há “linchamento judicial” contra Áñez.
Em resposta, Evo Morales afirmou que “golpistas cúmplices de Áñez têm medo de responder ante à justiça e mentem com ajuda de alguns meios que distorcem nossas declarações” e reiterou “nunca vamos descansar até conseguir que aqueles que assassinaram, torturaram e roubaram com a Bíblia nas mãos respondam por seus crimes”.
A gestão de Añez também esteve relacionada com uma série de denúncias de corrupção, compras superfaturadas, que somados à emergência sanitária global, fizeram com que a Bolívia deixasse de ser o país com maior crescimento econômico da América Latina para ter uma retração de 5,6% do PIB em 2020.
Embora o atual chefe de Estado Luis Arce não tenha se pronunciado diretamente sobre a resolução do caso, enquanto acontecia a audiência final contra Áñez ele visitou a comunidade de Trinidad e outras localidades de Beni, colégio eleitoral da ex-senadora, para dialogar com prefeitos, organizações comunitárias e pequenos produtores.