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quinta-feira, 28 março, 2024

Golpes não acabam, transmudam.

Pedro Augusto Pinho*

“Nosso império atual é um sistema complexo de bancos centrais, bancos de investimentos, private equity funds (fundos de cobertura e investimentos), companhias de seguros e shadow banking (sistema bancário paralelo). Um sistema financeiro que foi o responsável pela mudança de paradigma nos últimos cinquenta anos, afastando-se da produção de coisas reais e de uma economia verdadeira, e aproximando-se cada vez mais da especulação, da ideia da maximização dos lucros e do puro monetarismo. Eis o atual império!” (Daniel Estulin, “TransEvolução – A era da iminente desconstrução da humanidade”, tradução de Nelma Ribeiro de “TransEvolution – The Coming Age of Human Deconstruction”, 2011, para Vide Editorial, Campinas, 2019). 

O que está em risco no Brasil atual, de 2022? O Estado Nacional. A existência do nosso País, dando identidade e cidadania à população.  

O caminho que enveredamos, desde o golpe na sucessão do Presidente Ernesto Geisel, em 1979, está nos conduzindo, passo a passo, com as mídias convencionais e eletrônicas promovendo desinformação, confusão mental, falácias, as mais desencontradas ideias, todo o necessário para deixarmos de constituir a nação brasileira e ficarmos vagueando, zanzarmos como hordas de seres desumanizados, agressivos, famintos, competindo por tudo e por coisa alguma, pelo território onde um dia foi o Brasil. 

A literatura, a sensibilidade dos artistas, intui, vê primeiro, o que os analistas, os think thanks, descreverão depois e os acadêmicos, buscando as origens teóricas, elaborarão por último. 

Aldous Huxley (1894-1963), com o “Admirável Mundo Novo” (1932), George Orwell, na verdade Eric Arthur Blair (1903-1950), com “1984” (1949), Anthony Burgess (1917-1993), com “Laranja Mecânica” (1962), mostraram-nos, durante 30 anos, a trilha que estávamos seguindo. 

Daniel Estulin, jornalista pesquisador lituano, premiado escritor, vem desde 2007 demonstrando quem é o poder e o que ele pretende, no mundo pós-industrial, das finanças apátridas, e que, por não terem pátria, são globais, querem a destruição dos Estados Nacionais. 

O mundo global não é o mundo das ideologias, das religiões, encerrado com o fim da proeminência dos Impérios Nacionais. Muitos ainda identificam como ação dos Estados Unidos da América (EUA) a que é, atualmente, a do poder financeiro que os domina. Os EUA já não são um Estado Nacional, são uma colônia de banqueiros, para usar a designação do escritor brasileiro Gustavo Barroso (1888-1959), que assim já via o Brasil em 1934. 

O futuro para qual o neoliberalismo, o rentismo, o financismo nos conduz é o da nova Idade das Trevas, a Treva termonuclear-cibernética, que exige a redução populacional. 

Para enfrentar esta ameaça global é, inicialmente, indispensável entender sua formação, sua força e seus pontos fracos. Toda mídia, por mais ingênua que nos pareça, aquela que se nos apresenta como simples diversão, traz alguma mensagem das finanças. E, mais grave, pessoas maduras, intelectualmente bem formadas, se enredam em questões ideológicas, como esquerda-direita, quando o rentismo usa todas as crenças, do misticismo indiano ao ateísmo marxista, do nazismo ao identitarismo racial, para se impor, para nos transformar nos apóstolos desta “sociedade aberta”. 

Aproveitando a citação de Estulin, cujo Clube de agentes das finanças ele denunciou no mais célebre de seus livros, “A verdadeira história do Clube Bilderberg” (2007), usarei Bilderberg ou CB como coletivo das finanças apátridas, sabendo que Bilderberg Chateau Holtmuhle é um hotel, em Oosterbeek, Países Baixos, onde, pela primeira vez (de 29 a 31/maio/1954), reuniram-se estes agentes. Em 2005, o Clube Bilderberg (CB) estava composto por:  

a) Etienne Davignon (1932), presidente do Clube, atuando em think thanks, ex-vice-presidente da Comissão Europeia; b) Francisco Pinto Balsemão (1937), homem das mídias, ex-primeiro ministro de Portugal; c) David Rockefeller (1915-2017), neto do homem mais rico, em sua época, nos EUA; d) Timothy Franz Geithner (1961), Secretário do Tesouro no governo Obama e ex-presidente do Federal Reserve Bank de Nova Iorque (FED-NY); e) Richard Nathan Haas (1951), desde 2003, presidente do poderoso think thank estadunidense, Conselho das Relações Exteriores (CFR), ex-assessor de Colin Powell, quando Secretário de Estado dos EUA (2001-2005); f) Victor Halberstadt (1939), consultor do Grupo Goldman Sachs, professor universitário e participante de diversos Conselhos empresariais e culturais e do Fórum Econômico Mundial; g) Allan B Hubbard (1947), Diretor dos US National Economic Council, no governo de George W. Bush (2005–2007); h) James Logan Jones Jr. (1943), ex-Comandante Supremo Aliado na Europa (2003-2006) e Conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, com Barack Obama; i) Henry Kissinger (1923), ex-Secretário de Estado dos EUA (1973–1977); j) Henry R. Kravis (1944) e sua atual esposa Marie-Josée Kravis (1949), fundador e gestor da KKR & Co. Inc. (Kohlberg Kravis Roberts & Co.), empresa estadunidense de investimentos globais (gestora de ativos) que aplica em energia, infraestrutura, imóveis, crédito e, por meio de seus parceiros estratégicos, em fundos de hedge. Em 31 de dezembro de 2021, a empresa havia incluído mais de 650 investimentos de private equity no seu portfólio com, aproximadamente, US$ 675 bilhões de valor total. Marie-Josée é colabora sênior do Hudson Institute e atuante no ramo da cultura; k) Princesa Beatriz Guilhermina Armgard (1938), reinando na Holanda de 1980 até 2013, conforme a Forbes, em 2009, a então rainha Beatriz era o 14º soberano mais rico do mundo, com trezentos milhões de dólares; l) Matias Rodriguez Inciarte (1948), político espanhol, foi secretário adjunto das finanças e Ministro entre 1981 e 1982. Ligado à família Botín, do banco Santander; m) Peter Denis Sutherland (1946-2018), foi Representante Especial da ONU para Migração Internacional e presidente do Conselho do Goldman Sachs e primeiro Diretor-Geral da Organização Mundial do Comércio (OMC); n) Jean-Claude Trichet (1942), presidente do Banco Central Europeu de 2003 a 2011; o) Jacob Wallenberg (1956), filho de banqueiro e Presidente da Investor AB, maior conglomerado empresarial da Suécia; p) James David Wolfensohn (1933-2020), foi presidente do Banco Mundial de 1995 a 2005; q) Paul Wolfowitz (1943), foi embaixador dos EUA na Indonésia (1986-1989), subsecretário de Defesa (2001-2005) com George W. Bush e considerado “o arquiteto da invasão do Iraque em 2003”. Foi também presidente do Banco Mundial (2005 – 2007) tendo renunciado ao cargo após ser acusado de praticar nepotismo, ao promover sua namorada para alto cargo na instituição. É um líder conservador estadunidense. Estas pessoas, movidas apenas pelos interesses pessoais, particulares, convocam outras que tenham informações ou poder para as auxiliar, e influenciam fortemente os destinos de países e de sociedades. Além destas 17 pessoas, cerca de outro tanto, constituída majoritariamente de donos de mídias e jornalistas de renome, frequentavam algumas reuniões do Clube Bilderberg que sabe da imensa relevância da comunicação na pedagogia colonial. 

UM PROGRAMA ANTIHUMANO  

Diferentemente dos poderes fundiário, agrícola e industrial, o poder financeiro, principalmente na era da informática, dispensa as pessoas, não precisa de inquilinos nem consumidores, é o dinheiro gerando dinheiro, como há 2.300 anos Aristóteles condenava (Política – Econômicos, livro I). O “Global Strategic Trends” (Tendências Estratégicas Globais) é documento do Ministério da Defesa do Reino Unido que está na 6ª Edição (atualizada em 01/04/2022), para atuações até 2035. Por que um documento inglês, se não é a mais importante nação capitalista de hoje? Porque é onde nasceu e se criou o poder das finanças, quem detém o saber e a maldade, capaz de destruir populações, etnias, idiomas, como conhecemos de sua história. 

O financismo, no modelo fundiário, ganha poder na Inglaterra com as três Magnas Cartas (1215, 1216 e 1217), onde os barões encurralam os reis (João sem Terra e Henrique III) impondo seus interesses pessoais como do Reino. Os reis endividaram-se com as Batalhas nas ilhas britânicas e no continente europeu (100 anos, das Rosas, civis, religiosas, com a Holanda) e foram transferindo o poder monárquico para o poder dos nobres que foram se enriquecendo com o controle da moeda até lograrem, em 1694, a formalização do poder financeiro com o Banco da Inglaterra. Para bem compreender este período, é relevante conhecer o reingresso dos judeus na Inglaterra. Em 1290, Eduardo I expulsou-os do reino, encerrava-se o primeiro período da história dos judeus nas ilhas britânicas, iniciado com a invasão normanda de 1066. Embora houvesse judeus desde o tempo dos romanos, foi com Guilherme, o Conquistador, que chegaram judeus franceses com status e privilégios que lhes permitiram o estabelecimento por toda Inglaterra. Em 1275, Eduardo I proibiu-os de continuar na atividade financeira e logo os expulsa. Quando Cromwell, em 1655, recebe Menasseh Ben Israel, surpreende-se por não haver lei de expulsão dos judeus, mas encontra oposição de parcela dos nobres que os viam como competidores no controle das finanças. Foi com a ascensão de Charles II ao trono que, em 1664, puderam ingressar e ter tranquilidade para se reestabelecer na Inglaterra. Quando Guilherme III se consolida no trono, ele permite aos judeus participarem da constituição do Banco da Inglaterra (1694). Houve, de início, 1.300 acionistas: os reis Guilherme e Mary Stuart, os condes Montagu, Marlborough, Shrewsburry, Godolphin, Pembroke, Carnavon, Oxford, o duque de Devonshire, o baronete Heathcote, os financistas Michael Godfrey, John e James Houblon, o filósofo John Locke e diversos judeus como Salomão Medina. Do rentismo fundiário a aristocracia passa a ter o controle pela dívida. É este domínio pelo endividamento que a Inglaterra, diferentemente das realezas europeia e de sua colônia americana (Estados Unidos da América), evitará o surgimento de classe poderosa que surge com as revoluções industrial e francesa (empresários industriais, inventores e operários), e obrigasse os nobres ingleses a repartir o poder. A expulsão dos judeus da Itália e da Península Ibérica os levou para Holanda, Estados Germânicos e a Inglaterra que conheceram maior desenvolvimento e passaram a substitui-los no domínio colonial nas Américas, África, Ásia e Oceania, diretamente ou através dos endividamentos, como no Brasil. Os EUA lutaram com a Inglaterra mas copiaram o modelo de poder permanente com a Constituição engessadora de 1787, ratificada no ano seguinte, e suas 27 emendas, sendo a última de 7 de maio de 1992 (Nenhuma lei alterando a compensação pelos serviços prestados por Senadores e Representantes terá efeito até que seja votada pelos Representantes) meramente processual. 

O QUE PRETENDE BILDERBERG 

O Covid-19 devia ser o fim das fantasias criadas pelo “mercado”, porém o domínio das mídias chegou a fazer muitos ingênuos imaginar que se tratava do “vírus chinês”, o que foi desenvolvido por laboratório estadunidense, ou mais corretamente, de propriedade dos “gestores de ativos”, entidades apátridas com trilhões de dólares para corromper, subornar, eliminar e controlar pessoas físicas e jurídicas por todo mundo, a partir dos 85 paraísos fiscais. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) informou, em 2021, que havia 1,6 bilhão de desempregados de um total de 3,3 bilhões de pessoas procurando emprego, ou seja, 48% das pessoas em idade de trabalhar não encontravam ocupação formal. E não é tudo. Entre as dívidas e obrigações não resgatáveis surgia um tsunami entre dois e três trilhões de dólares estadunidenses (USD). O think thank Instituto Schiller estima ainda mais; seriam quatrilhões de USD em derivativos e outros títulos sem lastro a ameaçar a economia mundial, correspondente a 50 produtos internos brutos (PIB) mundiais. 

Teoria da conspiração? Em absoluto, basta seguir o relatório do Clube de Roma, fundado em 1968, “Os limites do crescimento” (1972), ou as ações e projetos da Comissão Trilateral (1973), dominando o governo Jimmy Carter (1977-1981) ou, ainda, as conclusões das reuniões anuais de verão do Clube Bilderberg. Fica claro, evidente, o embuste das crises do petróleo de 1973, 1979 e 1980 (oil glut) – leia-se John Hoefle, “The end of the line for the Anglo-Dutch System” (EIR, 28/03/2008) –, as desregulações dos anos 1980 no Reino Unido e nos EUA, as fusões e aquisições por toda década de 1990, entrando pelo século XXI, os resgates envolvendo os tesouros nacionais dos EUA e países europeus ocidentais, entre 2009 e 2010, e carteis mundiais que exploram a saúde e se locupletam com pandemias, de Rockefeller a Bill Gates. Duas áreas são fundamentais para o controle Bilderberg, ou seja, das finanças apátridas: energia e alimento, que têm significativa área de interseção. E dois são também os principais inimigos a combater: o crescimento demográfico e os nacionalismos. A respeito deste último, o porta-voz e magnata George Soros foi bastante explícito, conforme se lê em Felipe Maruf Quintas, “O fundo bilionário de George Soros aposta contra a centralidade da questão nacional” (portal Bonifácio, 31/01/2020). 

A história é a grande mestra; precisamos aprender a lê-la. Marx acreditava que as contradições eram forças propulsoras que poderiam ser eliminadas. A história nos ensina que há um poder que busca sua permanência e, assim, se transmuda. As finanças, na compreensão atual, começam sua trajetória na Idade Média e controlam grande parte do Planeta no século XXI, mais de 800 anos. Para salvar nossa população, os 214.388.866 brasileiros (IBGE), precisamos manter o Estado Nacional e o controle pelo Estado, que somos todos nós, da energia e da alimentação, estes focos dos Bilderberg. Neles não pode entrar o “mercado”. Na campanha presidencial de 1989, questionado sobre a moratória para dívida brasileira, Leonel Brizola respondeu que a solução não era moratória, era a auditoria da dívida, como fizera Getúlio Vargas, em seu primeiro governo, nos anos 1930, que veio a descobrir que apenas 40% eram devidas, e melhorou de imediato as finanças nacionais (apud José Augusto Ribeiro, “O Brizola Desconhecido”, Centro de Memória Trabalhista, Fundação Leonel Brizola-Alberto Pasqualini, Brasília, 2022). 

* Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado. 

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