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quinta-feira, 28 março, 2024

ESTADÃO PROSSEGUE NA DESINFORMAÇÃO

Pedro Augusto Pinho*

Em e-mail dirigido ao comentarista de O Estado de S.Paulo, Celso Ming, em 24 de dezembro de 2021, apontava as falácias e pífios argumentos de seu artigo “Petróleo com prazo de validade” (23/12/2021). Na impossibilidade de coligir dados e fatos objetivos que me fizessem reconhecer o erro, preferiu qualificar de ideológicos meus argumentos. Também sou septuagenário e a idade me deu compreensão das relatividades e entendimento suficiente para reconhecer a pedagogia colonial. São os poderes do mundo, que difundem e apresentam argumentos ideológicos; foram as religiões, as aristocracias fundiárias, os ricos comerciantes e industriais e, hoje, como no século XIX, retomam o poder as finanças anglojudaicas, que colonizam as mentes com a pedagogia colonial, agora com a adição estadunidense. Pronto, Celso Ming irá me rotular de antissionista, sem ao menos conhecer minha ancestralidade.

Atendendo ao interesse do Estadão, prossegue em desinformações, com dois artigos: em 07/01/2022 (página B2) “A disparada dos preços do petróleo” e em 08/01/2022(página B2) “O salto da energia solar no Brasil”. Sem poder demostrar o interesse especulativo das finanças, suas razões são a “instabilidade”, o “reforço dos estoques” e, no caso brasileiro, a “defasagem” nos preços dos derivados. Defasagem em relação a que, Celso Ming? Ou no segundo, o avanço da energia solar com direção “competitiva”, ou seja, privada. Reforçando as desinformações, o Estadão apresenta, em 08/01/2022, entrevista com o presidente da Petrobrás, que só pode repetir as burlas ministeriais, e um articulista, este sim profundamente ideológico neoliberal, a propósito do “mercado” do gás natural.

Procuraremos mostrar com números, dados e fatos o que move o petróleo desde as denominadas “crises” dos anos 1970 e quem lucra, e como, com esta importantíssima fonte de energia.

Até os conflitos nos anos 1960 no Oriente Médio, o petróleo seguia, de modo geral e com ressalvas, o Acordo de Achnacarry (1928) que dividira o mundo nas “sete irmãs”, empresas euroestadunidenses de petróleo. Como a ação dessas empresas se dava primordialmente no downstream (refino, transporte e comercialização) e o upstream (exploração e produção) estava no terceiro mundo, com exceção e durante pouco tempo dos Estados Unidos da América (EUA), o preço do barril se manteve constante, aos valores de 1970 (doravante usados) abaixo de US$ 1,00 o barril, enquanto o preço dos derivados oscilava bastante.

Esta transferência de renda para o mundo desenvolvido proporcionou os “30 anos gloriosos”, como a Associação Francesa de Economia Política designa o período de 1945 a 1975. Dois fatos relevantes ocorreram no final dos anos gloriosos: a fundação, setembro de 1960, em Bagdá (Iraque), da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), à qual se seguiu, em janeiro de 1968, em Beirute (Líbano), da Organização dos Países Árabes Exportadores de Petróleo (OPAEP), e, contra ataque dos países desenvolvidos, a criação, em novembro de 1974, da Agência Internacional de Energia (AIE), em Paris (França), ligada à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Também pouco mencionada é a descoberta de petróleo no Mar do Norte, com pouca quantidade e de difícil extração, que fez a fortuna apenas da Noruega, graças aos seus dirigentes socialdemocratas e nacionalistas. Para viabilizar o Mar do Norte, visto como reservas fora da OPEP, o preço do petróleo também precisava situar-se acima dos US$ 10,00 o barril, fazendo par aos reclamos árabes.

Houve, e talvez possa ser apontado como o principal vetor, o interesse do capital financeiro em destituir do comando mundial o poder industrial. Não esquecer que o poder industrial, seja do lado capitalista (EUA) seja do lado socialista (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas – URSS), dominava o mundo desde o início do século XX.

Antes do fim do século, como é do conhecimento geral, as finanças passaram a ser o grande poder mundial. Porém, a matriz energética manteve-se basicamente a mesma. Neste século XXI, as reservas de petróleo cresceram de 1.330,9 bilhões de barris, em 2000, para 1.636,9 bilhões em 2010, e, em 2020, já eram 1.732,8 bilhões de barris, com a relação Reserva/Produção (R/P) oscilando em curva ascendente entre 45 e 55. Ou seja, o petróleo continua a ser a mais importante fonte de energia primária, a ponto de merecer até pelas sequiosas finanças, algum investimento.

Porém a grande mudança se deu na propriedade. Se havia importantes empresas privadas de petróleo nos anos 1980/2000, estas sumiram com o domínio das finanças. Nos dias de 2021, ou eram empresas petrolíferas estatais ou eram subordinadas aos gestores de ativos. Estes gestores são empresas financeiras, com a maioria absoluta de seus capitais em paraísos fiscais e, ainda pouco conhecidos do público, em geral.

Temos dois tipos de fundos financeiros: os soberanos, ligados aos Estados Nacionais, e os privados, dos grandes especuladores.

Os dez maiores fundos soberanos (conforme Raphael Fernandes, em 03/09/2021, no Levante Advice) são: Norway Government Pension Fund Global – Noruega; China Investment Corporation; Kuwait Investment Authority; Abu Dhabi Investment Authority – Emirado Árabe; Hong Kong Monetary Authority Investment Portfolio; GIC Private Limited e Temasek Holdings – ambos em Singapura; National Council for Social Security Fund – China; Public Investment Fund – Arábia Saudita e Investment Corporation of Dubai.

Os maiores gestores de ativos privados são: BlackRock (EUA-Reino Unido-UK); Vanguard (EUA-UK); State Street Global Advisors (EUA-UK); Fidelity Worldwide Investment (EUA); BNY Mellon IM (EUA-UK); JP Morgan AM (EUA-UK); Capital Group (EUA); PIMCO (EUA-UK-Alemanha); Pramerica Investment Management (EUA) e Amundi (França), todos com bem mais do que US$ 1 trilhão em ativos, sendo os dois primeiros com mais de 10 trilhões de dólares estadunidenses, e os quatro maiores com três ou mais Produtos Internos Brutos (PIB) brasileiros.

O maior fundo brasileiro, BB Gestão de Recursos DTVM S.A. do Banco do Brasil, tem patrimônio pouco superior a R$ 1 trilhão (junho de 2021), que seria insuficiente para constar da relação dos 30 maiores mundiais. Portanto a subserviência do Estadão, e da imprensa brasileira quase sem exceção, aos interesses de capitais apátridas está, parcialmente, explicada. Por que não totalmente? Porque há uma classe constituída desde a colônia que Manoel Bomfim, o genial intérprete da sociedade brasileira, denominou “parasitária” (A América Latina – Males de Origem (Topbooks, RJ, edição do centenário, 2005), que vive da intermediação entre produção, comercialização brasileira e com estrangeiros.

São conhecidos os ciclos econômicos: pau-brasil, açúcar, minerais preciosos, café e, atualmente, além dos produtos agrícolas e dos minérios, o petróleo. Subjugar o petróleo a estes interesses parasitários nacionais também é objetivo que entendo impatriótico do Estadão, vocalizado por Celso Ming e outros colunistas. Estes “interesses nacionais” são percentualmente inexpressivos em termos de população, nem chegam a 0,5%, mas são poderosos econômica e politicamente. Eles estão no “centrão”, no PSDB, como estiveram na ARENA e MDB, no PSD, PL e na UDN, e entre “liberais” e “conservadores”.

Daí esta série de artigos e matérias divulgados no Estadão, que, aproveitando o governo sem capacidade e rumo, buscam construir a institucionalização que defenda o capital apátrida e seus representantes no Brasil.

Vamos aproveitar, por ser assunto da mesma natureza, para apresentar os fatos que cercam mais uma investida dos EUA, representando as finanças, não mais o Estado Nacional, na agressão ao Cazaquistão.

Os cazaques são povo da Ásia Central com mais de 600 anos de história. Ocuparam nos séculos XVI e XVII o Turquestão, no século XVIII já tinham identidade cultural e literatura no seu idioma próprio, e, com as diversas ocupações da Ásia pelos europeus no século XIX, os cazaques viveram na China e no Império Russo, e neste permaneceram com a formação da URSS como uma das 15 repúblicas socialistas soviéticas. O Cazaquistão tem 69% da população cazaque e 19% russa, formando a esmagadora maioria do país.

Sua posição geográfica entre a Federação Russa e a República Popular da China dá-lhe uma condição geoestratégica importantíssima, não apenas para Ásia, mas para todo contexto euroasiático, incluindo o Pacífico.

Porém não é somente por isto, o Cazaquistão possui uma das dez maiores reservas de petróleo do mundo, que só tende a crescer com os atuais trabalhos exploratórios e em seus reservatórios na costa do Mar Cáspio. Em 2020, a produção de óleo foi 1.811 mil barris/dia (b/d), só inferior entre os países membros da Comunidade dos Estados Independentes (CEI) a da Federação Russa, e com capacidade de refino de 400 mil b/d.

Sua economia nesta última década cresceu 8% ao ano, e sem dívida externa com organismos e instituições internacionais e estrangeiras. O país é também exportador de urânio e produtos agrícolas. E o que é mais importante para as finanças apátridas, optou pelo “nacionalismo” contra o “mercado”: pecado mortal, crime de morte.

O Cazaquistão, junto à Coreia, ao Vietnã, além da China e da Síria, é um dos países em que os EUA colecionam suas derrotas na Ásia. Não são temas que se esgotem num e-mail, porém eles têm ocupado páginas e páginas do Estadão.

Mas gostaria de deixar registrada minha admiração e solidariedade ao jornalista Celso Ming. É o único que expõe seu e-mail para o debate com os leitores. Editores, diretores, habituais comentaristas se ocultam. Certamente por não terem qualquer convicção no que escrevem ou lhes faltarem sua coragem.

*Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado.

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