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sexta-feira, 29 março, 2024

‘Eram pistolas contra aviões’: cruel invasão dos Estados Unidos ao Panamá completa 30 anos

© AP Photo / John Hopper

ANÁLISE

Os ataques destruíram o bairro El Chorrillo e provocaram centenas de mortes que ainda doem em um país que continua a viver sob “ocupação”.

“As bombas me acordaram”, lembrou Marco Gandásegui, em diálogo com a Sputnik Mundo, sobre a noite de 20 de dezembro de 1989 em que os Estados Unidos decidiram começar sua invasão militar do país centro-americano.

Nesse momento, o sociólogo vivia a um quilômetro e meio da zona em que, em plena madrugada, começaram os bombardeios contra a capital panamenha. Os ataques tinham como objetivo pontos estratégicos da cidade do Panamá, como o Aeroporto Marcos A. Gelabert no bairro de Albrook, no noroeste da capital panamenha, e várias dependências policiais e militares.

Um dos alvos mais visados pelos norte-americanos foi o Quartel Central das Forças de Defesa, nome com o qual se denominavam as forças armadas ao serviço do ditador panamenho Manuel Antonio Noriega, que governava o país desde 1983.

O Quartel Central se encontrava em El Chorrillo, um dos bairros mais populares no centro da cidade, que sofreu grandes estragos durante os ataques dos Estados Unidos.

A quilômetros de lá, Gandásegui presenciava com “raiva e muita pena” a invasão, que se deu sem qualquer advertência à população civil para permitir que se protegessem. Enquanto a cidade inteira entrava em pânico, os panamenhos compreendiam que se tratava de uma intervenção militar totalmente desigual.

“A única defesa era à ponta de rifles e pistolas que disparavam aos aviões e helicópteros que sobrevoavam”, recordou o acadêmico. Não eram simples aviões e helicópteros: a incursão no Panamá permitiu às Forças Armadas dos Estados Unidos estrear os bombardeiros F-117 Nighthawk e os helicópteros de combate AH-64 Apache, que anos mais tarde seriam utilizados nas guerras do Golfo, Afeganistão e Iraque.

O “batismo” das novas aeronaves norte-americanas largou mais de 400 bombas sobre o bairro popular, de acordo com as medições registradas pelo sismógrafo da Universidade do Panamá naquele momento.

“O Panamá foi um laboratório militar para os Estados Unidos e uma tentativa do então presidente George H.W. Bush de melhorar sua posição nas pesquisas, já que nos EUA se premeia os políticos que se mostram ‘duros'”, analisou.

Gandásegui recordou que naquele momento a busca por Noriega era “o discurso oficial do governo norte-americano” para justificar a intervenção. No entanto, o próprio ditador teve o apoio de Washington no começo de sua governação.

“Noriega era um empregado da CIA. Estava nas planilhas da CIA, isso é público e notório. Noriega é o discurso oficial do governo norte-americano, mas [a invasão] não tinha nada a ver com Noriega. Eles queriam testar suas armas e dar um pequeno empurrão nas pesquisas a favor de seu presidente”, enfatizou o especialista.

Apesar de já terem passado trinta anos, muitos detalhes da invasão norte-americana ainda permanecem sem esclarecimento. Um deles é a verdadeira quantidade de mortos que foram deixados pelos ataques da força de ocupação.

Para o especialista panamenho, a gravidade da invasão excede a quantidade de mortos, dado que “ainda que houvesse somente uma vítima, teria sido o suficiente, porque os Estados Unidos não tinham direito algum de invadir militarmente o Panamá”.

Depois da invasão

Oficialmente, a invasão terminou em 31 de janeiro de 1990, quando as tropas norte-americanas retiraram Noriega do país. A ocupação também deixou na presidência Guillermo Endara, que assumiu o cargo em uma base militar norte-americana.

O sociólogo lamentou que os governos democráticos no Panamá não conseguiram fazer uma revisão crítica do que ocorreu durante a invasão. “Ainda estamos sob condições praticamente de ocupação”, observa.

“O povo panamenho esteve e está submetido a fortes pressões de forma permanente, mas cedo ou tarde vai se libertar desta dominação norte-americana“, reivindicou Gandásegui.

Ao mesmo tempo, ele esclareceu que os panamenhos não desejam “um enfrentamento” com os Estados Unidos, mas sim uma relação de “entendimento”.

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