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Sputnik – Diante da falta de dólares que aflige o Estado Plurinacional, o governo de Luis Arce analisa aumentar seu comércio exterior por meio da moeda chinesa. Nesse contexto, os empresários de Santa Cruz, o chamado “motor econômico nacional”, saúdam a instalação de um banco do gigante asiático no país sul-americano.
Tanto o presidente Luis Arce quanto representantes do setor empresarial boliviano concordam em incluir o yuan chinês no comércio internacional entre os dois países, assim como outras nações sul-americanas, como Brasil e Argentina.
“As duas maiores economias da região já negociam em yuan em acordos com a China. E a tendência da região será essa”, disse Arce em entrevista à imprensa nacional durante o Dia do Jornalista Boliviano, no dia 11 de maio.
Assim, de acordo com o presidente, deixar para trás o dólar americano como única moeda internacional. Esta decisão é vista como uma solução para os problemas monetários apresentados por vários países latino-americanos.
Nesse contexto, nas últimas semanas, o embaixador da China na Bolívia, Huang Yazhong, se reuniu com empresários de Santa Cruz, onde foi avaliada a utilização do yuan para o comércio bilateral e para isso a possibilidade de estabelecer um banco do gigante asiático no país sul-americano.
Um novo banco na Bolívia. Seria um banco chinês. Mencionou pela primeira vez o presidente dos empresários de Santa Cruz, Óscar M. Justiniano, em Al Día de Bolivisión
“Através da criação de um banco chinês na Bolívia poderia se negociar em yuan. Claro que um banco na Bolívia entregaria em [pesos] bolivianos”, disse o presidente da Federação de Empresários Privados de Santa Cruz, Óscar Mario Justiniano, em entrevista ao canal de TV Bolivisión.
A Sputnik conversou com o economista Mike Gemio, que analisou a aproximação do peso boliviano com o yuan. Os presságios da abertura de um banco chinês no país representam “um fato já importante. Mostram que o capital estrangeiro está interessado na economia nacional”.
Conflitos e moedas
A operação militar especial russa na Ucrânia, lançada em fevereiro de 2022, teve um efeito inesperado no mercado financeiro na medida em que o dólar americano iniciou um declínio imparável como moeda de comércio internacional.
A valorização do yuan se consolidou em países da África e da Ásia. Ao que tudo indica, chegou a vez da América Latina, onde vários países têm a China como uma parceira comercial de grande importância. Portanto, a troca de produtos na moeda asiática era um passo previsível.
Para Gemio, a perda de espaço global do dólar “mostra que o mundo prefere usar sua moeda local e outras moedas para suas reservas internacionais”.
Até 2010, a China negociava menos de 1% de seus produtos em yuan, enquanto 83% eram em dólares, informa a Bloomberg. No último mês de março, pela primeira vez na história do gigante asiático, o uso do yuan nas trocas comerciais foi de 48% superando os 47% da moeda norte-americana.
Arce encarregou o Banco Central da Bolívia (BCB) de analisar as políticas econômicas da Argentina e do Brasil sobre o yuan, para avaliar a conveniência de avançar na comercialização dessa moeda ao invés do dólar.
O ex-presidente Evo Morales (2006-2019) também se pronunciou a favor de promover o comércio em yuan não apenas entre as duas nações, mas com outras igualmente. “Se abrirmos esse comércio com a China, não precisaremos mais do dólar. Nossa moeda é respeitada, respeitamos o yuan chinês“, declarou Morales à rádio Kausachun Coca, afirmando que tão logo o banco chinês inicie suas atividades “o dólar americano vai se afastar”.
Perspectiva de negócios e cautela
O departamento de Santa Cruz é de grande importância econômica para o Estado Plurinacional. Na década 2012-2022, a produção de Santa Cruz “representou 27% e 39% das exportações nacionais em média, tanto em valores (dólares) quanto em volumes, respectivamente”, segundo dados do governo departamental.
“Esperamos seriamente que isso possa se concretizar, porque no final das contas o que tem de ser descompactado é a utilização de uma determinada moeda, tendo a possibilidade de pagar tanto no país de origem com a sua própria moeda, como no país de destino recebem na moeda deles”, alertou Justiniano, representante da Federação dos Empresários Privados de Santa Cruz.
Dados do Instituto Boliviano de Comércio Exterior (IBCE) destacaram os valores da balança comercial entre os dois países. Segundo o instituto, em 2022 as importações foram de mais de US$ 2,5 milhões (cerca de R$ 12,4 milhões), enquanto as exportações giraram em torno de US$ 800 milhões (aproximadamente R$ 4 bilhões).
“Com muita gratidão vemos que esse caso também ocorreu em países vizinhos como a Argentina. Entendo que o famoso Eximbank [da China] também existe no Brasil. Então, hoje, a China se torna a principal parceira para o desenvolvimento do mundo. Na América Latina, a Bolívia não é exceção”, disse o presidente do IBCE, Alan Camhi Rozenman, à mídia local.
Para Gemio, o governo boliviano deve mover-se com cautela. “O comércio internacional da Bolívia tem que avaliar com quais países faz negócios e se eles vão aceitar uma provável troca de moeda“. Nesse sentido, destacam-se as alianças estabelecidas entre a Rússia e a China com as economias da África e da Ásia.
Regionalmente, “com Argentina e Brasil, primeiro é hora de medir o comércio com cada país e analisar o quão representativo ele é para a economia boliviana. As decisões devem ser tomadas com base nessa análise”, concluiu o economista.