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quinta-feira, 18 abril, 2024

Cidadania e solidariedade

Qual­quer pessoa ou ins­ti­tuição – mo­vi­mento so­cial, de­no­mi­nação re­li­giosa, ONG, es­cola, em­presa, as­so­ci­ação etc. – pode e deve pro­mover ini­ci­a­tivas que re­forcem a ci­da­dania e a so­li­da­ri­e­dade: mesas-re­dondas; cam­pa­nhas; pa­les­tras; mu­tirão que be­ne­ficie, sem as­sis­ten­ci­a­lismo, a po­pu­lação mais pobre.

Não há quem não possa fazer um gesto para pro­mover de­bates em salas de aula sobre as causas da po­breza e os en­traves à me­lhor dis­tri­buição de renda; in­tro­duzir na es­cola edu­cação nu­tri­ci­onal; pro­mover ex­po­sição sobre os di­reitos dos povos in­dí­genas ou ações de com­bate ao tra­balho e à pros­ti­tuição in­fantis; or­ga­nizar uma horta co­mu­ni­tária; lutar pela me­lhoria da edu­cação, do acesso a me­di­ca­mentos se­guros e ba­ratos ou abrir um curso de al­fa­be­ti­zação de adultos; de­nun­ciar o pre­con­ceito contra ho­mos­se­xuais e o uso da mu­lher no es­tí­mulo ao con­su­mismo.

É pre­ciso mo­bi­lizar a nação em torno de ações con­cretas que nos per­mitam cons­truir o “outro mundo pos­sível”. E pri­o­rizar, em pleno ne­o­li­be­ra­lismo que as­sola o pla­neta, va­lores an­tagô­nicos ao in­di­vi­du­a­lismo e à com­pe­ti­ti­vi­dade, como o são a ci­da­dania e a so­li­da­ri­e­dade.

Não é fácil ser ci­dadão bra­si­leiro. Nas­cemos como nação-colônia, apren­dendo que o es­tran­geiro é sempre me­lhor que o na­ci­onal. Ti­vemos o mais longo pe­ríodo de es­cra­vidão da Amé­rica La­tina – 350 anos!

Essa sub­missão atá­vica está en­tra­nhada em nossas veias. Basta al­guém se re­vestir dos sím­bolos do poder – ri­queza, au­to­ri­dade e os­ten­tação – para ser tra­tado como se fosse um ser na­tu­ral­mente su­pe­rior a seus se­me­lhantes.

Ci­da­dania rima com so­be­rania. É pre­ciso gostar de si pró­prio para con­quistá-la. Ocorre que a glo­ba­li­zação de­tona todos os fun­da­mentos de nossa so­be­rania.

O ne­o­li­be­ra­lismo nos impõe o Es­tado mí­nimo e o mer­cado má­ximo, tão livre que paira acima das leis e da de­cência.

As pri­va­ti­za­ções do pa­trimônio pú­blico (Si­de­rúr­gica Na­ci­onal, Vale do Rio Doce, Usi­minas, sis­tema de te­le­fonia etc.) são o exemplo maior de de­pen­dência de nosso país ao ca­pital pri­vado, em geral es­tran­geiro. E o que é mais grave: pri­va­tizam-se também nossos va­lores. Cor­roem nosso es­pí­rito ci­dadão. Es­tamos fi­cando cada vez menos so­li­dá­rios, menos co­o­pe­ra­tivos, menos par­ti­ci­pantes.

Até a fé re­li­giosa é pri­va­ti­zada, des­ti­tuída de sua res­so­nância so­cial e po­lí­tica. Como se Deus fosse um balcão de aten­di­mento de emer­gên­cias e mero ana­bo­li­zante de exal­ta­ções es­pi­ri­tu­a­listas que não se tra­duzem em ser­viço li­ber­tador ao pobre, ao en­fermo, ao ex­cluído.

Frei Betto

As­sessor de mo­vi­mentos so­ciais. Autor de 53 li­vros, edi­tados no Brasil e no ex­te­rior, ga­nhou por duas vezes o prêmio Ja­buti (1982, com “Ba­tismo de Sangue”, e 2005, com “Tí­picos Tipos”)

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