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sábado, 23 agosto, 2025

Cartas habaneras (XXXII)

Emiliano José

Víctor Dreke disse adeus à mãe.

Necessário sair de casa antes de a polícia de Batista botar as mãos nele.

Triste deixar a mãe.

Mas não tinha jeito.

Volta ao bairro onde havia nascido, em Sagua la Grande mesmo.

Como o elefante, comenta comandante Dreke.

Dele, desse portentoso animal, costuma se dizer ter o hábito de sempre voltar para morrer ao lugar onde nasceu.

Não voltava para morir.

Pra se esconder.

_ Voy para mi barrio porque lo conozco, sé como me puedo ir.

Chegar a Pueblo Nuevo era encontrar-se em terreno conhecido.

Teria proteção familiar, muitos parentes.

E além de tudo conhecia muito o bairro.

Saiu de casa de bicicleta.

Roupa do corpo.

Para a casa da tia.

_ Llego y le digo que el exército me está buscando, que me voy a esconder, que no voy a salir.

A pobre da tia já conhecia o sobrinho.

Sempre solidária com ele.

Era saber dele preso, e corria a buscá-lo, tirá-lo da prisão.

Não se negue: estava já um pouco cansada de tanta atribulação com aquele sobrinho endiabrado.

Foi vê-lo e dizer:

_ Novamente metido em confusão?

Dreker, meio acabrunhado, diz:

_ O que posso fazer?

Fica ali, sentado na casa da tia.

Podia resmungar, mas seguia solidária.

De repente, vê entrar dois jipes do exército.

Em um deles, um companheiro.

Preso, havia começado a delatar.

E Dreker não se recordava de um dia tê-lo levado à casa da tia.

Gelou.

Diz à tia:

_ Mira, me vienen a buscar. Diles que no he estado aquí.

Sai, pula um das cercas do fundo da casa.

Chega à residência de um primo.

Entra pelo fundo.

Os parentes perguntam, o que houve, qué pasó?

Dreke põe os parentes a par.

_ My primo acepta que me quede em su casa.

Dreke, entonces, manda fazer contato com o Movimento 26 de Julho.

Artigo completo: El Comandante Victor Dreke: A formação de um revolucionário cubano

Comandante Dreke (centro) com Fidel

O primo, Marcelo Castillo, integrava o movimento, não obstante o pai, Florencio, fosse do Partido Liberal, um dos partidos de Batista.

_ Es una de las cosas que se dio en la lucha revolucionaria en Cuba, que en uma misma familia, uma parte estaba con Batista y la otra en contra de Batista. Eso se dio mucho en nuestro país.

Castillo vai ao Movimento 26 de Julho.

Avisa aos companheiros dos riscos corridos por Dreke: o exército quer porque quer prendê-lo.

Se o prendem, podia ser morto.

Nessa noite mesmo, o transferem para a casa de outro primo, onde entonces ele resta escondido.

Dreke me contou isso durante a agradável noite em casa dele, início de maio deste ano.

Com muito entusiasmo.

Alojado em um dos quartos da casa do primo.

Generosa acolhida.

Não obstante, um quarto muito pequeno, a lhe causar até dificuldades para respirar.

No segundo dia da permanência dele na casa daquele primo, pela manhã, chega o dono da casa, e começa a conversar com a esposa, e falava bem alto modo a Dreke poder ouvir, ia presentear a mulher com móveis novos:

_ Te voy a compar los muebles. Te voy a traer unos muebles que te gusten.

E fala dos móveis.

Dreke ouvindo, e refletindo.

Não tinham como comprar aqueles móveis.

Viviam com muitas dificuldades, uns mortos de fome, na expressão de Dreke.

Bem: tal notícia foi ouvida por todos os vizinhos.

Casas todas de madeira.

Falasse alguma coisa numa casa, todas as outras ouviam.

Naquela casa, chegariam móveis novos.

À tarde, chega o caminhão: um jogo de sala, um jogo de quarto, vários outros móveis.

Tudo, para não deixar o leitor enganado, parte de um plano do Movimento 26 de Julho para tirar Dreke da casa e de Sagua la Grande.

Tirá-lo em meio a uma situação difícil: fechadas todas as saídas e o exército doido pra botar as mãos nele.

Logo depois, naquela mesma tarde, chega a dona da casa.

Arma um escândalo: não quero esses móveis, pode levá-los de volta, e além de não gostar deles, gritava, a família não tinha recursos para pagar por eles.

O marido, diante do escândalo da mulher, sai à procura de um caminhão para entonces devolver os móveis.

Tudo pensado, arquitetado pelo Movimento 26 de Julho.

O caminhão, conduzido por Arnaldo Arias Echenique, dono da movelaria onde o próprio Dreke trabalhava.

O irmão dele, Mario, um combatente, com história de enfrentamento contra os abusos de Batista, num deles resultou ferido,  havia rezado a missa inteira para Echenique, e ele topou a empreitada de tirar Dreke da cidade.

Vieram recolher os móveis. Antes, deram um jeito de meter Dreke dentro de um pequeno armário de duas portas. Ali, seguiu todo torto, mal cabia. Colocam-no na carroceria do caminhão, e à frente do minúsculo armário, Dreke dentro, colocam um jogo de sala.

Assim, nessa posição absolutamente desconfortável, é sacado de Sagua la Grande.

Karel Becerra em X: "#CubaArchivo Ciudad de Santa Clara 1940 a 1950 #Cuba http://t.co/Ge01LuIGzt" / X

Santa Clara anos 40/50 

Levado a Santa Clara, onde é acolhido por um dirigente do Movimento 26 de Julho, conhecido como Morejón, mais tarde um traidor da revolução.

_ Es una historia de la que los abuelos todavia hablan. Dicen, “El hombre salió en el escaparate”.

_ Todo mundo dice: “Fui yo, fui yo”.

_ Hay como mil gentes em Sagua que dicen que me ayudaron a escapar.

#omilagrecubano

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