Foto: AFP
Por Altamiro Borges
O governo britânico acaba de confirmar o envio para a morte nos EUA do ciberativista Julian Assange – que denunciou vários crimes de guerra do império. “Em 17 de junho, após consideração tanto do Tribunal de Magistrados quanto do Supremo Tribunal, foi ordenada a extradição do Sr. Julian Assange para os EUA”, afirma a nota do Ministério do Interior.
Ainda segundo o comunicado cínico e macabro, “não foi concluído que a extradição seria incompatível com seus direitos humanos, incluindo seu direito a um julgamento justo e à liberdade de expressão, e [foi considerado] que, enquanto estiver nos EUA, ele será tratado de forma adequada, inclusive em relação à sua saúde”. Pura patifaria!
“O começo de uma nova batalha legal”
Já Stella Assange, esposa do ciberativista, também reagiu indignada à decisão. “Julian não cometeu nenhum crime e não é um criminoso. Ele é um jornalista e editor, e está sendo punido por fazer seu trabalho… Hoje não é o fim da luta. É apenas o começo de uma nova batalha legal”. Entidades de direitos humanos do mundo todo condenaram a extradição.
Nota de repúdio da Fenaj, FNDC, ABI e Abraji
No Brasil, também houve protestos. Uma nota conjunta, assinada pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), classificou a decisão do Reino Unido de “um duro golpe contra a liberdade de imprensa”.
Para as entidades, “a decisão pode estabelecer um precedente perigoso a ser aplicado a qualquer jornalista, meio de comunicação ou fonte, em qualquer lugar do mundo, que publique notícias baseadas no vazamento de informações de interesse público”. Como lembra a nota, “os EUA querem julgar o jornalista pelo vazamento de documentos obtidos com o ex-oficial de inteligência do exército, Chelsea Manning, que apontavam irregularidades das forças americanas no Iraque e no Afeganistão. Os documentos foram publicados no site WikiLeaks e reproduzidos pela mídia internacional”.
“Julian Assange responde por 17 acusações sob a Lei de Espionagem e uma acusação sob a Lei de Fraude e Abuso de Computadores, que combinadas podem levá-lo à prisão por até 175 anos. É altamente provável que ele seja detido nos EUA em condições de isolamento ou confinamento solitário”.
A solidariedade dos ex-presidente Lula e Dilma
Já antes dessa decisão final das autoridades britânicas, o risco de extradição do ativista australiano tinha desencadeado uma onda de pressão no mundo inteiro. Entidades como a Federação Internacional de Jornalistas (IFJ, na sigla em inglês), Repórteres Sem Fronteiras e Article-19 coordenaram protestos em várias países. No Brasil, lideranças políticas, sindicais e de movimentos em defesa dos direitos humanos também se manifestaram.
Os ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff também apoiaram a luta pela libertação de Julian Assange. Em dezembro último, eles assinaram uma carta redigida pelo Grupo de Puebla, que reúne líderes e partidos de esquerda da América Latina. O documento criticou os erros da Justiça britânica, que “abre sérios precedentes na violação ao direto humano à liberdade de expressão e de informação”. Vale conferir a íntegra deste texto:
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“A decisão do Tribunal de Westminster (Reino Unido), de 10 de dezembro de 2021, que possibilita a extradição de Julian Assange para os Estados Unidos, não é apenas um grave erro judicial que põe em risco a sua vida, como afirmam seus advogados, como é uma decisão que abre sérios precedentes na violação ao direto humano à liberdade de expressão e de informação.
O material publicado pelo WikiLeaks, fornece evidências confiáveis e irrefutáveis sobre o papel e a responsabilidade de políticos, diplomatas, empresários etc., principalmente dos Estados Unidos, nas decisões e ações que tiveram um forte impacto na política interna de diversos Estados no mundo todo. São responsáveis por processos de extorsão, espionagem, operações secretas, desestabilização e até ataques armados contra civis.
Até o aparecimento desses documentos, o governo dos EUA reservou-se o direito de definir a hora e o conteúdo dos documentos que poderiam ser exibidos ao público (e quais permaneceriam ocultos).
Paradoxalmente, em vez de ser aplaudida, a ação do WikiLeaks desencadeou uma série de punições, que incluem a acusação, difamação, desmoralização e criminalização de Assange, privado de liberdade em uma prisão de segurança máxima para terroristas. Esse processo de humilhação e difamação transcende definitivamente um indivíduo, para se tornar um corretivo em nível internacional, mostrando passo a passo a crueldade que o sistema instituído pode atingir, para impedir alguém de ousar fazer algo semelhante. Em última instância, busca paralisar o instinto e o direito de busca pela verdade, instilando o medo.
Por outro lado, o Estado norte-americano solicita a extradição de Assange porque ele representa supostamente uma ameaça à segurança nacional. Ao aceitar esse pedido, a Justiça britânica reforça a extraterritorialidade do braço jurídico norte-americano, que por meios legais, ilegais, diretos ou indiretos, consegue intervir em processos judiciais em outros Estados. Essa estratégia faz parte das verdadeiras guerras legais, travadas contra aqueles definidos como inimigos políticos em diferentes partes do planeta.
Hoje, no dia a dia dos direitos humanos, a liberdade de Assange é a liberdade de todos e de cada um. A prisão de Assange é o triunfo da opressão, do silêncio e do medo”.