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sexta-feira, 19 abril, 2024

A MISÉRIA DA ECONOMIA FINANCEIRA: PAPEIS SEM LASTRO, MENTIRAS E FRAUDES 

Pedro Augusto Pinho*

Uma década já se passou desde a “crise do subprime”, originada em 2008 com estouro da bolha das hipotecas imobiliárias nos Estados Unidos da América (EUA), e, aparentemente, ninguém aprendeu coisa alguma. 

É o triunfo da farsa ou da aporia, palavra grega, também dicionarizada em português, que significa situação sem saída ou incerteza filosófica, e foi usada por Yanis Varoufakis, ex-ministro das finanças do premiê Alexis Tsipras, na Grécia, em seu livro “O Minotauro Global – a verdadeira origem da crise financeira e o futuro da economia global” (tradução de Marcela Werneck da edição em inglês, de 2011, para Editora Autonomia Literária, SP, 2016).  

Como as finanças, que a partir de 1990 dirigem a economia mundial, explicam estas crises, que se sucedem desde a última década do século XX e explodem por todo mundo: em continentes, em regiões, em países ou por setores ou segmentos econômicos? Uma resposta se impõe: jamais com a verdade, nunca apontando o erro e, por conseguinte, a correta solução. 

No Brasil somos atingidos por três agressões, algumas recentes, outras seculares, que, no entanto, não tiveram respostas ou defesas definitivas ou de maior permanência, que superassem duas ou três gerações. 

Diria que a menor delas é um governante que passado seu mandato se afastará. Mesmo os mais longevos, ou os que deixaram o nome na história, não vão além de seu tempo, como não ocorre com uma ideologia ou uma classe poderosa, com sucessores que mantém suas agressões por muitos anos, até por séculos, como os financistas anglo-israelenses. 

O economista e escritor argentino Walter Gustavo Graziano, realizou, no início deste século, ampla pesquisa sobre a situação mundial e concluiu, em setembro de 2003, de modo nada agradável, com a perspectiva da sucessão de crises que levarão milhões de pessoas à “pobreza, embrutecimento e morte” (Walter Graziano, Hitler ganhou a guerra, tradução do original de 2004 por Eduardo Fava Rubio, para Editora Palíndromo, SP, 2005). 

A primeira agressão vem de Jair Bolsonaro e sua equipe de entreguistas, servos das finanças internacionais, que imaginam com a apropriação de recursos públicos e associações com criminosos estrangeiros gozar das delícias paradisíacas no tempo que lhes restar na terra. A este, a quem se concentram as oposições, da direita e da esquerda, como se extirpasse o mal de séculos e obtivesse a solução final (!), recordo que Calígula (assassinado por guarda pretoriano após quatro anos no poder), Nero (declarado inimigo público pelo Senado e sem coragem de se suicidar obteve o auxílio de Epafrodito, seu secretário) e Hitler (com as tropas soviéticas a algumas horas de marcha de seu bunker, se suicidou com Eva Braun) não tiveram os anos de gozo com o obtido no poder. Mas nem por isto deixaram de matar e provocar muitos sofrimentos. 

Como servidores dos interesses financeiros estrangeiros, os atuais governantes prosseguem o trabalho iniciado por Fernando Collor de Mello (1990 até sua renúncia em 1992), Fernando Henrique Cardoso (1995 – 2003) e Michel Miguel Temer (2016 – 2018) de desmanche do Estado Nacional Brasileiro. O mais recente foi sustado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) conforme narra o professor Paulo Márcio Mello, em sua coluna Empresa Cidadã, no Monitor Mercantil, em 06/10/2021, a seguir transcrito. 

“Com a pandemia instalada, o fechamento de fábricas e a desaceleração da produção, houve montadoras que suspenderam encomendas dos semicondutores. Na guerra comercial entre EUA e China, no final de 2020, os EUA incluíram a Semiconductor Manufacturing International (SMIC), maior fabricante de chips da China, em uma lista que restringe o acesso de empresas a tecnologias de ponta desenvolvidas nos EUA. A empresa afirma que a medida impediu-a de manter sua capacidade plena de produção. Enquanto isso, no Brasil, (o Ministério da Economia decidiu) o fechamento do Centro em Tecnologia Eletrônica Avançada (CEITEC), empresa estatal, vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, que, em 2008, começou a desenvolver chip para rastreamento de gado, o “Chip do boi”. O ministro Vital do Rêgo (TCU) classificou o fechamento da empresa como “assassinato”, acompanhado pelos ministros Marcos Bemquerer, Raimundo Carreiro e Augusto Nardes. Para Rêgo, o desenvolvimento de semicondutores (chips) tem que ser uma política de Estado e não pode um governo decidir interromper o trabalho alegando falta de retorno financeiro”. 

O recente abandono do Afeganistão pelas tropas estadunidenses, derrotadas em imenso vexame, acompanhado pelo mundo inteiro pela televisão e redes virtuais, teve início numa fraude que atingiu a democracia nos EUA e a soberania das Nações, o “11 de setembro de 2001”. Este ataque dos EUA a si próprios está magnificamente reportado e analisado em 11 de setembro de 2001 Uma Terrível Farsa, por Thierry Meyssan (Usina do Livro, tradução de Kristiane Renata da Cruz Guimarães, SP, 2003). 

Mais do que a atitude de um império colonial, foi uma ação ideológica, para a qual contribuíram diversos países como se vê na imediata ação adotada pelo Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU). 

A Resolução 1368 (United States of America, 2001c) enquadrou o atentado como um ato de “terrorismo internacional”, justamente para diferenciá-lo de atos terroristas praticados no interior do Estado por grupo terrorista doméstico, com motivações políticas exclusivamente domésticas. No dia 28 de setembro de 2001, o Conselho de Segurança adotou, por unanimidade, a Resolução 1373, que reiterou os principais elementos da Resolução 1368. Em especial, reafirmou, preambularmente, o “direito inerente de legítima defesa individual ou coletiva tal como reconhecido pela Carta das Nações Unidas e reiterado na resolução 1368 (United States of America, 2001c)” (Desafios à Ordem Internacional – Ataques armados por atores não estatais e o direito de legítima defesa, por Ielbo Marcus Lobo de Souza, professor de Direito Internacional e Relações Internacionais, em Revista de Informação Legislativa, nº 177, jan/mar 2008). 

Paul Chevigny, advogado estadunidense, dedicado ao estudo dos problemas sociais e políticos subjacentes aos abusos policiais, escreveu: “as autoridades públicas dos Estados Unidos, tanto no âmbito local quanto no nacional, se aproveitaram da indignação e do medo causados pelos atentados para tentar assumir o controle do povo, e até mesmo da política do país. Tratam as críticas, como esta que faço aqui, como atos de deslealdade. Três meses após os ataques, o secretário da Justiça dos EUA declarou: “Aos que amedrontam o povo amante da paz com o fantasma da liberdade perdida, minha mensagem é a seguinte: essa tática só ajuda aos terroristas, pois corrói a unidade nacional e enfraquece nossa determinação. Ela fornece munição aos inimigos da América e incertezas a seus amigos”. E que o Congresso nada ou quase nada fez para resistir ao USA Patriot Act, em 2001 (“A repressão nos Estados Unidos após o atentado de 11 de setembro”, scielo.br/j/sur/a/rr8kddrKS63bNG6qJZjzY7P/?lang=pt#). 

Mas esta não foi atitude inédita como Thierry Meyssan narra no livro citado. 

“Em 1958, em Cuba, insurretos dirigidos por Fidel e Raul Castro, Che Guevara e Camilo Cienfuegos derrubaram o regime fantoche de Fulgencio Batista. O novo governo, que ainda não era comunista, põe fim à exploração total da ilha, orquestrada desde 1952 por um grupo de multinacionais (Standard Oil (hoje Exxon), General Motors, ITT, General Electric, Sheraton, Hilton, United Fruit, Est Indian Co.) e pela família Bacardi. Em revide, essas empresas convenceram o presidente Einsenhower a derrubar os castristas”. Passados 63 anos, é interessante verificar de quem são estas empresas, neste século XXI. 

A United Fruit é agora uma empresa suíça, renomeada Chiquita Brands Int’l, e que, por cerca de 40 anos, teve os irmãos Dulles (assessores de Einsenhower: Allen, na direção da CIA, e John Foster, Secretário de Estado) em sua folha de pagamentos, e mereceu as seguintes palavras de Pablo Neruda: 

“The Fruit Company, Inc. reservou para si o pedaço mais suculento, a costa central de minha própria terra, a delicada cintura da América. Ela rebatizou seus territórios de ‘Repúblicas de Banana’, e sobre os mortos adormecidos, sobre os heróis inquietos que trouxeram a grandeza, a liberdade e as bandeiras, estabeleceu a ópera cômica: aboliu o livre arbítrio, distribuiu coroas imperiais, estimulou a inveja, atraiu a ditadura das moscas … moscas pegajosas de sangue submisso e marmelada, moscas bêbadas que zumbem nos túmulos do povo, moscas de circo, moscas sábias conhecedoras da tirania” (Neruda, “La United Fruit Co.”, 1950). 

Exxon, General Motors, ITT, General Electric e Hilton são empresas de gestores de ativos, financeiras que especulam como os patrimônios e os lucros, sempre otimizados, dessas suas propriedades: Vanguard, SSgA, BlackRock, Fidelity, Northern Trust, Norges Bank, Geode, JP Morgan, Capital Research & Management, Berkshire Hathaway, Invesco e poucas outras, que detêm participações majoritárias. 

Expulsaram as empresas estadunidenses que roubavam, corrompiam e escravizavam o povo cubano e que pagaram depois para tê-los mortos. 

Bacardi é empresa de bebidas há sete gerações da família do mesmo nome; apenas mudou seu endereço para um paraíso fiscal, o território britânico das Bermudas, no Caribe. 

Nestes gestores de ativos estão os atuais mandantes do Brasil, responsáveis pelo desmanche do Estado Nacional, abrindo espaço para suas empresas residentes em paraísos fiscais. 

E não tendo qualquer compromisso com o povo brasileiro vivemos como o Monitor Mercantil estampa em suas manchetes na semana de 05 a 13 de outubro de 2021: “Inflação bate recorde em setembro e vai a 2 dígitos”, “Pandemia contribuiu para aumento de desigualdades”, “Guedes e Neto liberam derivativos para offshores”, “Endividamento bate recorde na capital paulista em setembro”, “Sem Petrobrás, ANP só vende 5 de 92 blocos”, “Lucro de planos de saúde mais que dobrou em quatro anos”. 

Por fim, temos a elite perversa e sem qualquer amor à Pátria, que Darcy Ribeiro dizia ser cruel e esperta, pois durava mais do que a estadunidense, e que compõe o centrão, como a Arena e o MDB, nos governos militares, o PSD e a UDN, antes do golpe de 1964, e estavam nos conservadores e liberais do Império.  

CHIQUITA BRANDS INTERNATIONAL opera em 70 países. Em 2019 trocou sua sede principal dos EUA para Suíça. Seus proprietários são: 50% José Luis Cutrale e 50% Joseph Safra. Em 2015 pagaram US $1,3 bilhões e assumiram as dívidas para tê-la como donos.

É uma elite estulta, desculpe-me o mestre Darcy Ribeiro. Pois tendo um dos mais ricos, senão o mais rico país do mundo em recursos naturais, indolente e arrogante se satisfaz com as comissões, as ridículas percentagens do que fará a fortuna dos estrangeiros, hoje detendo cotas dos gestores de ativos em paraísos fiscais. E, como foi revelado pelos Pandora Papers, Paulo Guedes e Roberto Campos Neto também enviaram seus ganhos para empresas nas Ilhas Virgens, outro paraíso fiscal em território britânico. 

É necessária a ideologia que cubra com uma lógica e uma religião toda a iniquidade que está nesta especulação de papeis sem lastro, de sequestro de bens, pessoas e saúde, de descarada mentira e da pregação de ódio e discriminação, do anti-humanismo que transborda nas decisões governamentais. Esta ideologia é o neoliberalismo que dá cobertura à teologia da prosperidade neopentecostal. Por isso não surpreende ver Bolsonaro ao lado de bispos e pastores neopentecostais, nem de figuras de proa do neoliberalismo e da pregação da ignorância e do anticientificismo.  

Estas são as três pragas que impedem a vida digna e feliz que os brasileiros poderiam ter: a ideologia neoliberal, o financismo no poder e a elite que mesmo sendo mestiça, como a totalidade de nossa gente, não se vê brasileira. 

*Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado. 

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