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domingo, 6 outubro, 2024

A conspiração genocida contra a Coreia do Norte 

– Carta aberta ao Tribunal Penal Internacional

por Christopher Black [*]

As ameaças americanas contra a Coreia do Norte continuam a agravar-se e com isso a ameaça do genocídio do povo da Coreia do Norte pelos Estados Unidos da América e seus aliados. A reunião dos EUA, Canadá e outros países que atacaram a Coreia do Norte em 1950 efectuada em Vancouver, Canadá, no dia 16 de Janeiro, na qual alguns esperavam que conduzisse a uma solução política, tomou ao invés o carácter de uma reunião de criminosos os quais pela sua presença, acordo e acções tornaram-nos partes de uma conspiração para cometer genocídio, um crime de acordo com o estatuto do Tribunal Penal Internacional e da Convenção de Genebra de 1948.

As ameaças feitas contra a Coreia do Norte devem-se a um único facto: A República Democrática e Popular da Coreia recusa-se a aceitar a hegemonia mundial do Império Americano. Isto nada tem a ver com armas nucleares. Agora tornou-se um ritual declarar que todos os membros permanentes do Conselho de Segurança dispõem de armas nucleares, que os Estados Unidos utilizaram-nas nas cidades de Hiroshima e Nagasaki, que desde 1945 eles continuamente ameaçaram utilizá-las para intimidar outras nações, que o Paquistão, a Índia e Israel delas dispõem, que membros da NATO na Europa tem-nas à sua disposição sob a direcção estado-unidense, que a Coreia do Norte não está a violar qualquer lei internacional ao desenvolvê-las para defender-se, para assegurar a sua segurança tal como todas aqueles outros países o fizeram, que a Coreia do Norte não ameaça ninguém e procura apenas ter uma paz plena e final com os Estados Unidos.

A questão do armamento nuclear é simplesmente o pretexto que os Estados Unidos estão a utilizar para tentar solidificar a sua tirania sobre a Coreia, sobre o mundo.

A ameaça à paz mundial não vem da Coreia do Norte. Ela provém dos Estados Unidos e seus aliados: os países que se degradaram a si próprios como estados vassalos subjugados prontos a obedecerem a qualquer ordem criminosa dos seus mestres da guerra em Washington.

Em resposta ao que na nossa opinião meditada são acções criminosas, em 23 de Janeiro o Dr. Graeme MacQueem, fundador e antigo director do Centre for Peace Studies, na McMaster University, e eu, sentimos necessário enviar a seguinte Carta Aberta ao Promotor do Tribunal Penal Internacional.

Carta aberta 

Cara Senhora Promotora:
Ref: Ameaças de genocídio efectuadas contra a República Democrática e Popular da Coreia

Nós, os signatários, partilhamos o desejo do povo canadiano de estabelecer e preservar a paz no mundo. É portanto necessário para nós pedir-lhe que abra um processo de investigação sobre a acção de governos aliados aos Estados Unidos, incluindo o Canadá, seus ministros e responsáveis activos no governo quanto à crise em curso com a RDPC.

A vergonha e o choque das ameaças do presidente Trump contra a Coreia do Norte foram propagadas e levaram a levaram a uma séria discussão nos EUA sobre se o sr. Trump está mentalmente apto para governar. Entretanto, as ameaças do sr. Trump e do seu secretário da Defesa vão bem além da esfera interna dos EUA e têm implicações directas para outros países, incluindo o Canadá.

O artigo 6º do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional declara que genocídio significa qualquer dos seguintes actos cometidos com intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso:
(a) matar membros do grupo,
(b) causar grave dano corporal ou mental a membros do grupo,
(c) infligir deliberadamente ao grupo condições de vida calculadas para provocar a destruição física, no todo ou em parte do grupo.

A conspiração para cometer genocídio é entendida no direito internacional como um acordo concertado para cometer genocídio o qual pode ser inferido da conduta dos conspiradores. A evidência para apoiar a acusação de genocídio tanto pode ser baseada em evidência circunstancial como em evidência directa. Além disso, a acção concertada ou coordenada de um grupo de indivíduos pode constituir evidência de um acordo.

No dia 8 de Agosto de 2017 o sr. Trump disse que ameaças da Coreia do Norte “serão recebidas com fogo e fúria como o mundo nunca viu”. O seu secretário da Defesa, James Mattis, corroborou em 9 de Agosto com a declaração de que   “A RDPC deveria cessar qualquer consideração de acções que levariam ao fim do seu regime e à destruição do seu povo”.

O sr. Mattis acrescentou um novo comentário em 3 de Setembro:   “Estamos a encarar a aniquilação total de um país, nomeadamente a Coreia do Norte, mas como eu disse, temos muitas opções para assim fazer”.

Durante o seu discurso inaugural na Assembleia-Geral da ONU, em 19 de Setembro, o sr. Trump disse:   “Os Estados Unidos têm grande força e paciência, mas se for forçado a defender a si próprio ou os seus aliados, não teremos escolha senão destruir totalmente a Coreia do Norte”.

Finalmente, o secretário de Estado dos EUA, Rex Tillerson, durante uma entrevista em 17 de Janeiro de 2018 na Universidade de Stanford com Condoleeza Rice, declarou aprovadoramente, quanto a mortes a bordo de barcos pesqueiros coreanos indo ao mar no inverno sem o combustível necessário:   “eles [os norte coreanos] estão a sentir o efeito das nossas sanções”. Isto é uma evidência directa de que os Estados Unidos estão intencionalmente a criar condições que causarão a morte de civis coreanos numa grande escala a fim de os EUA alcançarem objectivos.

Excessos retóricos (“fogo e fúria”) são uma coisa, mas esta série conectadas de declarações, incluindo a ameaça de destruição total, constitui uma ameaça de genocídio. Ameaça genocídio, pode-se argumentar, não é um crime, mas “a incitação pública ao genocídio” está explicitamente incluída como um crime na Convenção do Genocídio da qual os EUA são parte. Portanto, ao publicamente a apaixonadamente promoverem o genocídio como uma opção política, o sr. Trump e o sr. Mattis já entraram em território legalmente perigoso. Uma vez que os EUA tomaram parte na Convenção do Genocídio as disposições da Convenção têm o estatuto de lei estado-unidense.

Para condenar com êxito alguém por genocídio, a prova da intenção é requerida. A acusação precisa mostrar a “intenção de destruir”. Isto habitualmente é um desafio para a acusação uma vez que os perpetradores raramente transmitem antecipadamente ao mundo as suas intenções destrutivas. Mas, como dois académicos genocidas já argumentaram no Washington Post, a liderança dos EUA fez precisamente isto: ela transmitiu suas intenções. Se, destacam eles, o sr. Trump fizer o que ameaçou, processá-lo por genocídio tomaria um caminho directo.

O país dos signatários, o Canadá, é membro do TPI e sob a sua jurisdição, e os líderes e responsáveis canadianos têm responsabilidade individual por quaisquer crimes cometidos sob o Estatuto. Uma vez que há evidência clara de que o crime de genocídio está a ser discutido abertamente e que estão a ser feitos planos para executá-los contra o povo da RDPC pelos líderes dos EUA e uma vez que, nestas circunstâncias e com pleno conhecimento destas ameaças e planos, os aliados dos EUA, incluindo o Canadá, estão a cooperar com o governo dos EUA e a reunir-se para discutir acções a serem tomadas contra a Coreia do Norte, e uma vez que estes aliados dos EUA parecem estar a ignorar a lei internacional, a Carta das Nações Unidas e o Estatuto de Roma, é necessário que um investigação seja conduzida pelo seu gabinete para considerar a evidência e processar se houver evidência de um crime.

Os Estados Unidos da América já não são mais um membro do TPI. Contudo, está obrigado pela Carta das Nações Unidas a manterem a paz mundial, são parte da Convenção do Genocídio e foram um patrocinador do Tribunal Penal Internacional. Além disso, o TPI não tem apenas um papel investigador e acusador, mas também o papel de informar o mundo do que é uma conduta criminosa quando ela acontece. Ele optou por assim fazer em relação ao Quénia, por exemplo. Deveria fazer o mesmo na crise actual.

Solicitamos que o Gabinete do Promotor abra um processo de investigação quanto a esta matéria e, além disso, utilize a sua vez como Promotor e o imperativo moral que o seu gabinete pretende representar para evitar o genocídio e condenar como graves violações do direito penal internacional as intenções anunciadas e acções das nações acima mencionadas”.

Instamos outros a fazerem o mesmo.

26/Janeiro/2018

[*] Advogado criminalista internacional com escritório em Toronto. É conhecido por numerosos casos de crimes de guerra importantes e recentemente publicou o seu romance Beneath the Clouds . Escreve ensaios sobre direito internacional, política e acntecimentos, especialmente para a revista online New Eastern Outlook.

O original encontra-se em journal-neo.org/…

Este artigo encontra-se em http://resistir.info

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