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quarta-feira, 25 dezembro, 2024

Investigado na Colômbia, Petro paga o preço por enfrentar oligarquia local e o imperialismo dos EUA?

© AP Photo / Fernando Vergara

O presidente colombiano, Gustavo Petro, está sendo investigado pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE) por suposto abuso econômico nas eleições de 2022. O mandatário rebate as acusações e as classifica como “tentativa de golpe”. Primeiro presidente de esquerda na história da Colômbia, Petro estaria pagando o preço por enfrentar os EUA?

No dia 8 de outubro, o CNE aprovou, com 7 votos a favor e 2 contra, uma investigação contra o presidente Petro por ultrapassar os limites de gastos durante a campanha presidencial que culminou em sua vitória sobre Iván Duque. A acusação denuncia a omissão de alguns empréstimos e depósitos nas contas que os candidatos devem apresentar ao final das eleições.
Petro vem rebatendo as acusações. Em uma publicação nas redes sociais, o presidente colombiano ponderou que o CNE não tem competência para exigir que ele deixe seu cargo — uma investigação desse âmbito caberia ao Legislativo colombiano, não a um órgão administrativo como o Conselho Nacional Eleitoral.
Além disso, ele afirmou que a medida trata-se de uma “estratégia explicitamente proposta por Néstor Humberto Martínez [ex-procurador-geral da Colômbia] e por Germán Vargas Lleras [ex-vice-presidente do país]”.
“Estamos diante de um golpe de Estado baseado em provas falsas”, enfatizou o presidente.
Em entrevista ao Mundioka, podcast da Sputnik Brasil, especialistas analisam a situação enfrentada por Gustavo Petro, o primeiro presidente com tendências progressistas em um país historicamente dominado por forças políticas da direita e sob forte influência dos Estados Unidos.
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Desde o final do século XIX a Colômbia consolida uma dualidade de partidos, com disputas protagonizadas pelos partidos Liberal e Conservador.
Após a Guerra dos Mil Dias, uma disputa interna vencida pelos conservadores, o país sul-americano assistiu a uma hegemonia que perduraria até 1930. Na sequência, os liberais liderariam a Colômbia por cerca de 16 anos, até outra disputa sangrenta colocar os dois partidos frente a frente na briga pelo poder, que teve o assassinato do líder do Partido Liberal, Jorge Gaitán, em 1948, como episódio marcante do período, conta Eduardo Gomes, doutor em história pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e especialista em história da Colômbia.

“Esse contexto todo, de alguma forma, demonstrava o que a Colômbia era enquanto país, que utilizava-se da violência para combater a violência, e que muitas vezes não se viu dentro das perspectivas do que hoje a gente chama de Estado Democrático de Direito, possibilidade para um governo um pouco mais progressista ou que pudesse olhar para as classes populares, para as causas mais sensíveis da sociedade”, explica o analista.

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A sobreposição dessas forças no poder por meio da violência teve como consequência, por exemplo, o surgimento de movimentos de oposição calcados na violência e na ilegalidade, como os casos das guerrilhas nos anos 1960, das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), do Exército de Libertação Nacional (ELN) e do próprio Partido Comunista colombiano.
Petro, por sua vez, quando considerado o primeiro presidente de esquerda do país, estava longe de ser um “revolucionário ou o socialista que vai estar no poder para estabelecer um movimento dessa natureza na Colômbia. É uma esquerda moderada aos moldes do Lula aqui no Brasil, do [ex-presidente José] Mujica, no Uruguai, que de alguma maneira tenta trazer pautas progressistas para um país que nunca teve abertura para isso”, afirma Gomes.

O governo Petro

Segundo o especialista, Petro vem enfrentando o imperialismo norte-americano de forma ampliada: o governante propõe o debate sobre a criação de leis trabalhistas em um país onde o trabalhador não conta com garantias como a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) no Brasil; e vai na contramão das propostas que querem privatizar a educação na Colômbia.

“O Petro veio com uma proposta progressista de enfrentar tudo isso e de não bater continência para os Estados Unidos. No contexto da diplomacia e da política externa, tem sido um presidente muito duro, por exemplo ao se colocar contra a política sionista atual no conflito Israel-Palestina”, avalia.

Essa postura do presidente crítica a questões caras aos EUA e à própria influência norte-americana na América do Sul tem incomodado, conforme Gomes.

“As elites do país se incomodaram com o contexto de governo pelo qual a Colômbia está passando hoje. Essa consequência toda está gerando essa tentativa de tirar o Petro do poder, por isso que ele coloca como golpe”, afirma.

Para Andrés Londoño, professor de relações internacionais da Universidad de La Salle e da Escola Superior de Administração Pública (ESAP), ambas colombianas, a pressão sofrida por Petro internamente é muito grande, afinal, conforme o especialista, o mandatário enfrenta um CNE politizado, com conselheiros da oposição, e uma mídia que está contra o governo.
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Como o CNE não é um órgão com funções jurídicas, não possui competência para julgar o presidente colombiano. Londoño acredita, portanto, ser muito difícil que a atual investigação avance.

“O mais provável que aconteça agora é que seja a Corte Constitucional, o órgão que esclarece esses processos perante o que está na Constituição, que esclareça como é que deve ser feito esse processo e também coloque limites ao Conselho Nacional Eleitoral. Porque ele pode pesquisar campanhas, como eu falei antes, mas não suspender nem destituir o presidente”, explica, sobre um possível cenário.

Ainda de acordo com o analista, dentro de suas competências, o órgão tinha um prazo de 20 dias após as eleições presidenciais para apurar possíveis irregularidades. Agora o fazem, tempos depois, justificando que receberam uma denúncia anônima.
Em caso de uma hipotética destituição, Gomes pondera que a tendência é que Petro conte com o apoio dos principais grupos progressistas na América do Sul e Latina.

“Uma possível retirada dele do poder não seria diferente do que foi aqui no caso da Dilma, de usar o termo golpe, sim, de entenderem que essa retirada atinge um problema muito maior que não faz referência somente ao governo colombiano”, afirma.

Segundo o pesquisador, trata-se de um processo mais amplo, “que vem desde a década anterior, de pensar o que são os Estados Democráticos de Direito na América Latina como um todo e como essa influência externa em um contexto que é pós-Guerra Fria, mas que de alguma maneira ajuda ainda a entender esse resquício aqui na nossa região, no nosso continente, como essa política externa notadamente do imperialismo estadunidense e europeu acaba ainda influenciando as tomadas de decisão internas nas nossas nações latino-americanas”, resume.

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