O
ataque com mísseis do Irã contra Israel na última terça-feira (2) trouxe máxima tensão ao Oriente Médio, com possibilidade de eclosão de uma guerra direta entre os países, com participação dos EUA ao lado de Tel Aviv.
Ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, Luciana Garcia de Oliveira, professora da pós-graduação em Geopolítica da Ásia: Conflitos & Debates, da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), afirma que o ataque do Irã não foi comum porque não houve um aviso prévio, como em episódios anteriores.
“Foi um ataque-surpresa, e parece que os moradores de Tel Aviv falaram que as sirenes estavam mais altas do que de costume. Então é um ataque que assustou bastante, que incomoda muito e que gera muito medo, e provavelmente vai haver um contra-ataque.”
Ela acrescenta que o
governo do presidente americano, Joe Biden, tem sido bastante ineficiente em tentar resolver a situação de Israel, principalmente na busca por um cessar-fogo e pela libertação dos reféns na Faixa de Gaza,
o que ameaça a possibilidade de uma escalada maior.
Oliveira enfatiza que, além do envolvimento direto de outros atores, “existem outros Estados que podem também acabar se envolvendo por conta de uma crise de refugiados que vai acontecer”, potencializando o deslocamento na região que já ocorre por conta dos ataques a Gaza.
“Durante essa guerra entre Israel e Hamas, por exemplo, o Egito, ele está de certa maneira envolvido também nesses conflitos. Porque existe uma crise de refugiados, pessoas na Faixa de Gaza que estão saindo e buscando asilo no Egito para poder, depois, procurar asilo em outros Estados. Então os Estados vizinhos também acabam sendo envolvidos.”
Questionada sobre um eventual envolvimento de países da Europa no conflito, Oliveira descarta essa possibilidade, afirmando que o continente já gastou muitos recursos com o conflito ucraniano. Ela também acha pouco provável o envolvimento de Rússia e China, e diz que o imbróglio deve ficar restrito a países do Oriente Médio, como Iraque, Síria e Iêmen, e os grupos Hamas, Hezbollah e as milícias houthis.
“O Irã organizou todo um eixo de resistência para poder resistir a um eventual ataque israelense e americano. Então, provavelmente, o Irã não vai ficar sozinho. […] O Irã não é um país pequeno, também tem um Exército muito importante, mas também soube fazer muitos acordos com o passar do tempo com outros Estados e com outros grupos que estão dentro do mundo árabe.”
Irã precisava dar uma resposta a Israel
Para Najad Khouri, economista com MBA em relações internacionais e pesquisador sênior do Grupo de Estudos e Pesquisa sobre o Oriente Médio (GEPOM), o ataque foi de fato uma “resposta moral, que o Irã devia à sua população interna, às suas forças internas e também ao Líbano”.
“Lembrando que houve várias mortes feitas por Israel, uma delas de Ismail Haniya dentro do Irã, a morte do [Hassan] Nasrallah, e junto com o Nasrallah, havia um comandante grande dos guardas revolucionários. Então o Irã até agora não tinha respondido, até ontem.”
Nesse contexto, ele avalia que o ataque iraniano foi bem estudado e bem articulado, sem atingir nenhum civil ou militar.
Khouri acrescenta que para o governo do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, o confronto com o Líbano representou uma vitória após mais de um ano de derrotas no embate contra o Hamas na Faixa de Gaza, onde Israel ainda não capturou o líder do grupo palestino nem conseguiu libertar os reféns levados para o enclave.
“Ao contrário, na última tentativa houve matança pelo Hamas dos reféns. Então, em termos políticos internamente, para Israel, a guerra em Gaza não logrou êxito. Ao contrário do movimento no Líbano, ao ataque no Líbano, que teve vários êxitos.”
Khouri afirma que a Organização das Nações Unidas (ONU) não consegue deter Israel, que recentemente declarou o secretário-geral da organização, António Guterres, persona non grata no país. Ele acrescenta que os
EUA também não conseguem conter Netanyahu nem mudariam nunca sua postura de defesa a Tel Aviv no Conselho de segurança da ONU, porque
“quem dita a política americana para o Oriente Médio é Israel”.
“Os Estados Unidos não conseguem nada, porque os Estados Unidos falam: ‘Olha, não ataque, mas qualquer coisa que faz, eu protejo você’. Então, [Israel] é o filho estragado [dos EUA].”
Ele afirma que quem poderia exercer pressão sobre Israel seriam Rússia e China, mas que é improvável porque Moscou está envolvido no conflito ucraniano e Pequim não consideraria qualquer ação que pudesse afetar o fluxo de petróleo global.
Khouri sublinha que Netanyahu tem interesse em prolongar o conflito, já que está em uma posição delicada internamente, respondendo a um processo judicial por corrupção, e precisa do apoio da ala radical de seu partido, que defende o confronto.
Questionado sobre uma possível resposta de Israel ao ataque do Irã, Khouri afirma que seria uma escalada de caos.
“O que o Israel pode fazer? Não sei. Mas se ele fizesse alguma coisa fatalmente vai exigir outra resposta do Irã. Então, o ideal é que não haja nada.”