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sábado, 21 dezembro, 2024

Argentina: um ano de balanço após histórica vitória do governo popular Alberto Fernandez – Cristina Kirchner

Helena Iono

Correspondente em Buenos Aires

Encerra-se um 2020 trágico para a humanidade, e a Argentina supera um ano de governo da Frente de Todos, combatendo duramente duas pandemias mortais: a pandemia macrista, e a pandemia do coronavírus.

No Estádio Único da cidade de La Plata, que se denominará Diego Maradona, realizou-se o emblemático ato, “Desafios para a reconstrução bonaerense”, organizado pelo governador da Província de Buenos Aires, Axel Kicillof com 135 prefeitos, ministros e líderes da Casa de Governo, sindicalistas, deputados provinciais e federais, como Sergio Massa (presidente da Câmara) e Máximo Kirchner (chefe da Frente de Todos na Câmara) e o presidente Alberto Fernandez e a vice-presidenta, Cristina Kirchner. O ato, além de um anúncio de medidas para o próximo ano de construção de obras públicas e casas populares e inclusão social na maior província argentina, representou uma mensagem de unidade das principais forças políticas da coligação governamental da Frente de Todos e uma síntese de balanço de um ano de gestão, já expresso nas últimas declarações de Alberto à nação e nas 3 recentes cartas de Cristina à cidadania.

O ato cumpriu o objetivo de dar o recado ao eleitorado e sobretudo à oposição midiática desestabilizadora que se dedica a viralizar fake-news sobre uma falsa divisão entre o presidente e a vice-presidenta. Ao contrário, além da sintonia fina ambos em torno dos projetos de governo, Cristina Kirchner deu o tom mais alto e firme de quem atuará e será sempre a avalista da Frente de Todos. Ao falar grosso e em primeira pessoa, deixa claro que é convicta de ser porta-voz da maioria dos excluídos que votaram neste governo graças à sua autoridade de 12 anos de gestão incompleta, mas bem sucedida e marcada na memória social.  Alguns pontos de destaque: “Acredito que os dois maiores desafios que teremos neste ano que se inicia, além de um plano de vacinação formidável, é repensar todo o sistema de saúde da República Argentina”. “Nosso país deve ser o único de toda a América Latina que tem mais recursos humanos, tecnológicos e de investimento na saúde. O que acontece é que o dividimos em três sistemas, o público, o privado e as obras sociais. Teremos que repensar um sistema integrado de saúde”. “Teremos que repensar não só o sistema de saúde, mas também um projeto de país que acabe com essa concentração injusta e economicamente ineficiente.” “O outro desafio que teremos, obviamente, será a economia. Sergio Massa disse que a economia vai crescer em 2021. Mas atenção: não quero que esse crescimento fique para 3 ou 4 vivos!.” “E para isso, me parece que é preciso alinhar salários e pensões, preços – especialmente os da alimentação – e taxas.”

E 2020 finaliza com a aprovação no Congresso de  várias leis importantes com 32 sessões realizadas durante a Pandemia, 40 leis aprovadas e 87 projetos de lei do governo popular (De dar o que pensar ao povo brasileiro tão mal representado num Parlamento dominado pela maioria oligárquica e financeira). Uma das leis aprovadas na Argentina é a Lei 27605 de 18/12/2020 após votação na Câmara e no Senado: a “Contribuição solidária e extraordinária para ajudar a atenuar os efeitos da Pandemia”. E a outra, em vias de aprovação final no Senado, a “Lei da Interrupção Voluntária da Gravidez” já aprovada no dia 13 de dezembro na Câmara de Deputados rumo à próxima votação no Senado; uma lei de saúde pública, garantindo às mulheres, definitivamente, a opção pelo aborto legal, seguro e gratuito em mãos do Estado, livre dos riscos do serviço privado e clandestino. Além disso, votou-se a “Lei dos 100 dias” para ajudar as gestantes em situação de vulnerabilidade.

O lawfare e a Corte Suprema de Justiça na mira

O Projeto de Reforma Judicial, lançado como objetivo central desde a campanha eleitoral por Alberto Fernandez, será sem dúvida uma das metas principais do segundo ano de governo em 2021. O questionamento à Corte Suprema de Justiça (STF no Brasil) como instrumento do lawfare na Argentina foi reiterado no discurso de Cristina em La Plata, como tem sido fortemente assinalado desde a sua última carta de 9 de dezembro. “Representado pela Corte Suprema de Justiça, o Poder Judiciário, nada mais fez do que confirmar que foi a partir daí que o processo de Lawfare foi encabeçado e dirigido. Esta articulação midiática-judicial para perseguir e prender opositores foi implantada no nosso país com toda a sua intensidade desde a chegada de Maurício Macri à Presidência da Nação e, o que é pior: ainda continua”.

De fato, com a Reforma Judicial ainda pendente depois da aprovação no Senado e uma Corte Suprema com 6 membros dos quais, 2 foram colocados por Macri, via decreto, no início de sua gestão (transgredindo as normas da independência dos Poderes); e juízes, procuradores e espias ilegais na AFI (Agencia Federal de Inteligência) servidores do lawfare, ainda não condenados por inconstitucionais, ao contrário, perseguindo sistematicamente à Cristina Kirchner, alongando processos, sem provas, contra dirigentes políticos do governo kirchnerista, como o ex-vice presidente, Amado Boudou, e mantendo prisioneira a deputada do Parlatino e líder, Milagro Sala (há 5 anos).

“Nem deveríamos nos surpreender se esta Corte (Tribunal), que felizmente consentiu com o maior endividamento em escala planetária com o FMI, comece a ditar decisões de claro corte econômico para condicionar ou extorquir dinheiro deste governo … Ou o que é ainda pior: fazer fracassá-lo”. “Se esse Poder, além de ser perpétuo, além de nunca ir às eleições, além de ter a palavra final sobre a vida, o patrimônio e a liberdade do povo acima do Poder Executivo e do Poder Legislativo … Se além de tudo, esse Poder só é exercido por um punhado de funcionários vitalícios que toleraram ou protegeram a violação permanente da Constituição e das leis, e que também têm em suas mãos o exercício da arbitrariedade à vontade e ao seu prazer, sem dar explicações a ninguém, nem estar sujeito a qualquer controle … Bom, se isso continuar acontecendo em nosso país, estaremos muito longe de construir a República e a Nação que, tenho certeza, a grande maioria dos argentinos anseia ” (Carta de Cristina Kirchner). Alberto Fernandez que, além de presidente, é professor de Direito, além de propor o projeto da Reforma Judicial, cogita opções como aumentar o número de juízes membros da Corte Suprema, ou criar um Tribunal Supremo adjunto que poderia ser mais ágil e operativo. Leia no Eldestapeweb.

A renovação em debate para avançar

Não há como deixar de enfocar o pensamento desta Carta que mais do que teórica e analista é uma orientação política de uma estadista e líder peronista central na Argentina sobre o quê fazer. Cristina Kirchner ao propor com sábia estratégia a fórmula com Alberto Fernandez era consciente da trajetória, autoridade e capacidade unificadora do presidente; ao mesmo tempo, além de estar segura da maior base social e popular que ela conduz, era consciente de que como vice-presidenta e presidenta do Senado poderia atuar com peso importante no governo da Frente de Todos. Por isso, agora, tem a prerrogativa de imprimir dinamismo para que o governo revise ritmos e funcionários que cumpram as metas estabelecidas. Alberto Fernandez foi contundente aos garantir que não iria defraudar o povo que depositou confiança no projeto pelo qual foi eleito. Assim como reafirmou sua convicção de amizade e união com a vice-presidenta Cristina que lhe confiou o mandato presidencial.

O tom contundente de Cristina Kirchner é um empurrão ao governo contra a guerra violenta da mídia hegemônica (Clarin e La Nación) e a Corte Suprema do lawfare. Mas, não só. É um alerta forte aos de dentro. “Quando não conseguem nos impedir no Senado ou na Câmara dos Deputados, eles vão ao tribunal. Pois cuidado, ninguém se engana: o lawfare não é só estigmatizar os dirigentes populares, é disciplinar os políticos, para que ninguém se atreva a fazer o que tem que fazer. Digo a todos: todos aqueles que têm medo, ou não são encorajados, por favor, existem outras ocupações além de serem ministros, ministros, legisladores, legisladoras. Vá encontrar outro emprego. Precisamos das pessoas que os assentos que ocupam como ministro, ministro, legislador ou legislador representem os interesses do povo.»

Tudo indica que o processo político na Argentina em 2021 continuará sendo assaz dinâmico.

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