No Supremo, há convicção da maioria sobre o excesso de poder conferido ao Ministério Público, fora do controle do Judiciário.
Vamos a algumas informações frescas sobre o caso Dias Toffoli/Alexandre Moraes-Lava Jato e a reação ao Inquérito 4781 que investiga ataques ao Supremo.
Peça 1 – Toffoli não está isolado no Supremo.
Não há a menor dúvida de que o vazamento do tal telegrama que mencionava “o amigo do amigo do meu pai” teve a intenção de constranger o presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, nas vésperas da votação da prisão após julgamento em 2ª instância. Foi uma tacada política. E há pouquíssimas dúvidas sobre as origens desse vazamento, nos porões da Lava Jato.
Por isso mesmo, no STF houve manifestações contra a censura e a forma atabalhoada como o Ministro Alexandre de Moraes conduziu os primeiros movimentos o inquérito 4781 – que apura ataques a membros do STF. Mas as ações contra os abusos da Lava Jato têm apoio interno.
No Supremo, há convicção da maioria sobre o excesso de poder conferido ao Ministério Público, fora do controle do Judiciário.
Peça 2 – Há intenção de enquadrar o MPF
Considera-se que, nos últimos anos, o Ministério Público ganhou poderes excessivos, que o colocaram fora do controle jurisdicional. São eles:
- os TACs (Termos de Ajustamento de Conduta) que permitiram ao MP mandar em todas as prefeituras sem passar pelo Judiciário.
- Os PICs (Procedimentos de Investigação Criminal) que permitem ao MP fazer investigações sem a supervisão de um juiz, como ocorre nos inquéritos policiais, em que toda investigação está vinculada a um magistrado.
- A delação premiada, que permite toda sorte de jogadas, da indução ao conteúdo das delações, o direcionamento para advogados amigos e até os esquemas de chantagem contra empresas. O caso ganhou contornos mais graves com a denúncia de empresas financiando a delação de seus executivos.
- Pela Lei da Ação Pública, o controle do MPF sobre fundos constituídos pelas multas e ressarcimentos de réus condenados.
- e, agora, o plea bargaining, instituto que permitirá ao representante do Ministério Público negociar diretamente com o acusado e deixar de acusá-lo formalmente, se considerar que as informações apresentadas foram satisfatórias.
Volto ao tema no final do texto. Há instrumentos que são essenciais para o bom funcionamento do MP e não podem ser destruídos em função do mau uso pela banda podre da corporação.
Peça 3 – os receios da quebra de hierarquia
No Xadrez das Contradições do Pós Impeachment, coloquei que um dos pontos principais de discussão seria a questão da quebra da hierarquia.
“Base x cúpula
É a principal contradição que emerge do golpe.
A desconstrução da Constituição, perpetrada pelo STF, não afetou apenas o sistema partidário. Passou a estimular uma rebelião do baixo clero em relação aos controles hierárquicos de cada instituição.
É o que tem levado a uma reação, ainda tímida, do STF, do Conselho Nacional de Justiça e da PGR. E tem despertado preocupações no Alto Comando das Forças Armadas”.
Uma das mensagens de apoio que o STF recebeu foi do General de Divisão André Luis Novaes Miranda, do Comando Militar do Sudeste, preocupado com a quebra de hierarquia na Justiça. Afinal, com 15 generais 4 estrelas, como segurar 300 mil soldados se a quebra de hierarquia se alastrar?
Peça 4 – Está se chegando perto do vazador
O Ministro Alexandre Moraes convocou não apenas delegados de confiança da Polícia Federal, como também está trabalhando com a Polícia Civil de São Paulo. As investigações estão perto de chegar no vazador.
Algumas das pessoas investigadas, com poucos seguidores nas redes sociais, atuavam como pontos de disseminação dos fakenews. Eles publicavam as primeiras notícias e um conjunto de seguidores, robôs ou não, disseminavam o conteúdo para milhares de perfis.
À medida que as investigações avançam, instaura-se a cizânia na Lava Lato. Ontem mesmo, o procurador Deltan Dallagnol se defendeu, alegando que os procuradores tiveram acesso aos autos depois do vazamento ter sido publicado. Jogou a suspeita na Polícia Federal. Nas redes sociais, os ataques ao STF caíram quase 80%.
Ao mesmo tempo, informações que chegaram ao Supremo indicam que houve troca frenética de telefonemas entre os procuradores da Lava Jato, às 5:30 da manhã, para saber se havia movimentação de polícia na frente de suas casas. Como se sabe, invasões de domicílio podem ser feitas a partir das 6 da manhã. Para sua sorte, nenhum foi detido na banheira, como Marat na Revolução Francesa.
No episódio do vazamento das conversas entre Lula e Dilma, quando o Ministro Teori Zavascki exigiu explicações, delegados da PF informaram ter consultado o PGR Rodrigo Janot, que estava em viagem. E não foram desmentidos. O clima da época impediu que Janot fosse devidamente enquadrado.
No limite, os que atuaram na ponta acabarão por jogar a responsabilidade nas costas do ex-juiz Sérgio Moro.
Peça 5 – o Inquérito 4781
Nos próximos dias, haverá um aumento da disputa em torno do Inquérito 4781. Hoje, O Globo abriu editorial a favor do trancamento do inquérito. Há tempos, as Organizações Globo tornaram-se reféns dos punitivistas do MPF, em função do envolvimento com a corrupção da CBF (Confederação Brasileira de Futebol). Como se recorda, o MPF abafou o inquérito que corria no Rio de Janeiro. E tornou a abafar quando o Ministério Público espanhol enviou provas da compra da Copa Brasil pela Globo, sem a participação de “laranjas”. É uma espada de Dâmocles permanente no pescoço do grupo.
Por outro lado, as ações do STF embutem o risco de se trocar o autoritarismo miliciano do baixo clero por um sistema autoritário centralizado, o autoritarismo das milícias pelo autoritarismo da cúpula.
Peça 6 – a preservação do MPF
Todos esses pontos exigirão um posicionamento claro das instituições.
O MP colhe, agora, a irresponsabilidade do pior Procurador Geral da história, Rodrigo Janot, permitindo os abusos iniciais da Lava Jato e, depois, aderindo de forma oportunista às ondas formadas.
Os novos poderes do MP provocaram o surgimento dos pequenos ditadores na ponta. Mas foram e são, também, ferramentas relevantes de defesa dos direitos nas mãos de procuradores responsáveis.
Tem-se agora uma PGR com pouco jogo de cintura político, mas séria e responsável em relação ao MP e ao país. E um trabalho exemplar, por todo o país, de procuradores que não se deixaram contaminar pelo deslumbramento e falta de limites da Lava Jato e que têm nos TACs e outras ferramentas instrumentos relevantes de defesa dos direitos dos índios, dos negros, do meio ambiente.
Não se pode comprometer a autonomia do MP – um dos princípios centrais da democracia brasileira – por conta de meia dúzia de tresloucados e por lideranças claudicantes. O pior que poderia acontecer seria substituir o MPF abusivo de hoje pelo MPF chapa-branca de outros tempos.
Vai se entrar em uma nova etapa da vida política do país. E ainda não se sabe se avançando mais ainda rumo ao estado de exceção, ou em relação aos valores civilizatórios.