Foto: Reprodução/Casa Branca/Agência Brasil/Freepik/ND
César Fonseca
Começa oficialmente nesta quinta (16/10) reunião dos representantes dos governos Lula e Trump para debater tarifaço.
Preventivamente, Lula enviou mensageiros à China e à Índia, integrantes dos BRICS, antes de se encontrar com Trump nos Estados Unidos ou no lugar em que se combinarem trocar ideias e interesses mútuos no cenário da crise capitalista americana de desfecho imprevisível.
Essa precaução lulista está ancorada na prática da real politik: os insumos que mais interessam aos americanos para desenvolvimento da sua indústria com a qual Trump quer recuperar hegemonia americana perdida para a China são aqueles que atualmente são fornecidos pelos chineses: terras raras, também, disponíveis no Brasil.
China e Estados Unidos se complementam econômica e financeiramente no ambiente da globalização.
A disruptura entre ambos nos últimos tempos, acelerada pelo tarifaço trumpista, decorre do fato de que a China pulou na frente dos Estados Unidos, mas, apesar disso, se equivalem no essencial.
O Brasil entra no rol das preocupações dos dois países, somados, agora, também, à Índia, por conta, essencialmente, da geopolítica demográfica.
São os maiores do mundo do ponto de vista geográfico e populacional e isso envolve o essencial.
No momento, para os Estados Unidos, o Brasil é fundamental, porque possui os dois instrumentos/insumos dos quais os americanos não podem abrir mão, sob pena de entrarem em crise existencial: minerais estratégicos e alimentos.
O complicador das relações foi introduzido intempestivamente pelo próprio Trump, com sua intrínseca arrogância imperialista exorbitante: o tarifaço atuou como exorbitância imperialista contraproducente.
Está claro que a China já pode viver sem os Estados Unidos em caso de guerra.
Mas, a recíproca não é verdadeira.
Os americanos dependem tanto das matérias primas estratégicas dos chineses, tipo minerais estratégicos, como, igualmente, da moeda chinesa, que compra títulos do tesouro americano em dólares.
Nos últimos tempos, a China tem diminuído a compra desses ativos financeiros, como precaução ao risco em que virou a dívida pública americana, na casa dos 45 trilhões de dólares, mas, ainda, possui muita reserva em dólar fictício, contrabalanceada pela quantidade de ouro que tem acumulado.
PRECIPITAÇÃO DO CONFLITO
O fato é que o tarifaço trumpista precipitou o conflito entre Estados Unidos e China, com desvantagem para Washington, visto que Pequim galgou a hegemonia comercial global.
Tal condição fortalece a moeda chinesa, valorizada nas trocas comerciais, a ponto de credenciar Pequim à proposição de novo sistema monetário global, no contexto de nova divisão internacional do trabalho, devido ao BRICS ao qual está associado à vantagem de representar maior percentual de riqueza mundial medida pela paridade do poder de compra.
O dólar, notadamente, está ficando para trás, quanto mais os BRICS, como um todo, tendo a China como alavanca econômica hegemônica, estimulam trocas comerciais em moedas locais, ao largo da moeda americana.
Corre contra o dólar o fato de que a dívida pública americana, como fator de risco crescente, acende sinal vermelho, alerta geral dos fundos financeiros globais contra possíveis estouros monetários.
O tarifaço trumpista, nesse cenário de instabilidade geral, trabalha contra a industrialização americana, por ser intrinsecamente inflacionário, ao exigir dos Estados Unidos geração de superávit comercial, se quiser recuperar dominância comercial.
Essa possibilidade não existe mais, porque o dólar, sem lastro real, não pode mais bancar déficits comerciais, sustentados por superávits financeiros, produzidos pela senhoriagem imperialista, característica do pós-segunda guerra mundial.
O dólar está vulnerável pela incapacidade limitada do BC americano de emitir títulos como regulador de última instância do mercado, devido ao perigo inflacionário que o tarifaço trumpista gera.
Eventual estouro inflacionário, nos Estados Unidos, produziria tensões sociais crescentes, em forma de conflitos internos regionais explosivos, sinalizadores potenciais de guerra civil.
NETANYAHU: PESO MORTO PARA TRUMP
Aliás, essa é a razão principal que levou Trump a radicalizar contra o genocida Netanyahu, em favor do cessar fogo em Gaza, justamente, porque o fôlego americano, capaz de sustentar Israel como fogueira militar no Oriente Médio, alastrando incêndios, está se esgotando.
Sintoma desse esgotamento é o impasse interno nos Estados Unidos que se opõem aos partidos Democrata e Republicano quanto ao limite dos gastos do orçamento americano.
Para bancar o genocídio sionista, Trump está sendo obrigado a cortar gastos orçamentários, cujas consequências são rebeliões internas; estas obrigam Trump, para evitar explosões sociais incendiárias, às movimentações de tropas da Guarda Nacional em cidades como Chicago, Washington, Nova York, politicamente, dominadas pela população negra.
QUÍMICA LULA-TRUMP
Então, é o seguinte: Trump, nesse contexto em que o seu tarifaço está fazendo água, como é visível em relação ao Brasil, de cujas matérias primas os americanos dependem para controlar inflação americana, passa a depender de boas relações com o presidente Lula.
Afinal, para o pavor de Trump, Xi Jinping já deixa os agricultores americanos de lado, para comprar a soja dos agricultores do centro-oeste brasileiro.
Do mesmo modo, Trump teme que se lhe faltar as terras raras chinesas, com as quais produz tecnologia estratégica, seja obrigado a depender cada vez mais do Brasil, onde as terras raras são abundantes.
A moeda que valoriza não é mais o dólar, mas as matérias primas das quais a moeda americana depende para se valorizar.
Nesse ambiente, há o receio congênito de Lula: eventual opção lulista pela China provocaria ira de Trump, razão porque cuida de contatar previamente chineses e indianos antes de conversar com o titular da Casa Branca.
Todo cuidado é pouco: é real o perigo de sofrer eventuais retaliações comerciais que, no curto prazo, desorganizam a economia brasileira – tipo sabotagem financeira, sequestro de reservas cambiais etc – com reflexos na eleição presidencial de 2026.
Tal cautela lulista, também, conduz as tensas relações Brasil-Venezuela nesse momento: Lula retarda calculadamente a defesa solidária à Venezuela, apoiando sua soberania diante do ataque imperialista trumpista ao presidente Maduro cujas consequências afetam diretamente o Brasil.