18.5 C
Brasília
quinta-feira, 6 fevereiro, 2025

Por que Trump segue mentindo ao dizer que EUA derrotaram o fascismo na 2ª Guerra Mundial?

© AP Photo / Patrick Semansky

Sputnik – O recém-empossado presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, repetiu uma mentira comum aos líderes norte-americanos ao afirmar que o país “venceu duas guerras mundiais” e derrotou o fascismo. A falsidade, afirma um historiador à Sputnik Brasil, busca combater a perda de liderança mundial dos EUA para a Rússia e a China.

Longe de ser um fato, essa afirmação se trata de uma falsificação dupla da história, afirma à Sputnik Brasil o professor de história e pesquisador do Núcleo de Estudos das Américas (Nucleas) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) João Cláudio Pitillo.

“Trump falsifica a história com relação à Segunda Guerra Mundial e falsifica atualmente, tentando afirmar uma grandiosidade que os Estados Unidos já não têm mais.”

Quem venceu a 2ª Guerra Mundial?

A resposta para essa pergunta é única pelas lentes da ciência histórica, diz Pitillo. “Cerca de 75% de todas as forças do Eixo foram destruídas pela União Soviética. Berlim, Tóquio, Roma e seus Estados-satélites foram destruídos pela URSS.”
Claro que o papel de todos que lutaram contra o fascismo é importante, afirma o historiador.

“Mas a nível histórico, temos que dar a César o que é de César e dar a Deus o que é de Deus.”

Desde o início da Guerra Fria, os EUA escondem a preponderância que a União Soviética teve na derrota do nazifascismo. “Criaram uma narrativa própria, completamente afastada da realidade”, afirma.
No fim da Segunda Guerra Mundial, com o mundo dividido entre dois blocos economicamente antagônicos, a URSS gozava de muito prestígio internacional e, para “para aplacar a vitória soviética e diminuir o alcance do socialismo vitorioso frente ao fascismo”, os Estados Unidos criaram uma guerra cultural em que a narrativa verdadeira foi “ofuscada por relatos parciais e mentirosos”.
Um homem vestindo um uniforme do Exército Vermelho participa de um evento que comemora o 76º aniversário da libertação de Leningrado, em 27 de janeiro de 2020 - Sputnik Brasil, 1920, 26.01.2024

Panorama internacional

80 anos da libertação de Leningrado: as lições que a vitória soviética tem para nos ensinar (VÍDEO)

Nesse sentido, a União Soviética que facilitou a vida dos aliados e não o contrário, crava o historiador.
“As principais tropas nazistas estavam sendo destruídas dentro da União Soviética e não tiveram condições de retornar para reforçar a Frente Ocidental. Negar isso é parte dessa guerra ideológica, criada na Guerra Fria com Truman.”

“A segunda frente só vai ser aberta em 1944. A União Soviética, de 1941 a 1944, lutou praticamente sozinha.”

Japão se rendeu por conta do avanço soviético

Outra falsificação comumente aceita na visão popular da Segunda Guerra Mundial é que os EUA derrotaram o império japonês no chamado Teatro de Operações do Pacífico, com grande ênfase nos ataques nucleares a Nagasaki e Hiroshima — as únicas vezes em que um armamento atômico foi usado em conflito.
Operação Estratégica Belarussa: relembra como Minsk foi libertada durante a 2ª Guerra Mundial - Sputnik Brasil, 1920, 03.07.2024

Multimídia

Os 80 anos da libertação de Minsk: relembre etapas da Operação Estratégica Belarussa

De fato, assume o historiador, os estadunidenses derrotaram a Marinha imperial do Japão, mas isso por si só não acabou com a capacidade ofensiva do Japão. O grosso das tropas se encontrava na ocupação chinesa. “Ainda restava mais de um milhão de homens”, diz Pitillo. “O Exército japonês poderia continuar lutando durante muito tempo na Manchúria.”
Após a rendição da Alemanha nazista, houve um pedido público dos líderes aliados para que a União Soviética direcionasse suas tropas, a fim de atacar o Japão. “Nem Estados Unidos nem Inglaterra tinham condições de levar mais de um milhão de homens e equipamentos para combater os japoneses.”

“Só a União Soviética tinha poder para destruir o império japonês.”

Foi a partir disso que a URSS iniciou a Operação Tempestade de Agosto, que “destroçou o Exército japonês”. Em menos de um mês, as forças soviéticas derrotaram todo o contingente nipônico.
Sem a Manchúria, afirma o historiador, o Japão perde a joia da coroa: a China — um país grande e rico que ligava o Japão ao resto do continente asiático. “Sem a China, o Japão volta a ser uma ilha do Pacífico.”

“É retratado pelo Ocidente que as bombas atômicas foram responsáveis, mas foi a partir dessa destruição de seu exército que o Japão decide se render”, revela o historiador. “E essa é uma vitória que é escamoteada, ela pouco aparece.”

Por que os EUA falsificam a história?

Se por um lado os Estados Unidos utilizavam a propaganda de que foram a principal força por trás da vitória aliada na Segunda Guerra Mundial como arma durante a Guerra Fria, a continuidade dessa mentira por todos os presidentes estadunidenses revela a perpetuidade da política de propaganda.
Hoje, a Rússia é a principal herdeira da União Soviética e, como tal, busca manter vivo o legado do conflito, do histórico heroísmo de seu povo, do fardo de sua reconstrução e dos louros de sua vitória.
Bandeira dos EUA serve de pano de fundo para a decoração de entrada de uma residência na manhã seguinte a um tornado mortal em Valley View, Texas. EUA, 26 de maio de 2024 - Sputnik Brasil, 1920, 30.10.2024

Panorama internacional

Unilateralismo made in USA: imagem dos EUA como defensores da democracia ‘já ruiu’, diz analista

Para Trump e os demais líderes norte-americanos, essa mentira é uma “arma na guerra híbrida” contra a Rússia, a China e os países do Sul Global, analisa Pitillo.
Ao colocar os EUA como os principais articuladores da vitória aliada, o país busca “reafirmar os seus valores imperialistas de um país invencível, poderoso e que ajudou o mundo”.
Dessa forma, não só dão a Washington a relevância que não se fundamenta mais na realidade geopolítica atual, como também afasta a Rússia dos demais povos.

“Então, o que Trump faz é uma guerra cultural violentíssima, com base na mentira para impedir que a Federação da Rússia se torne popular, colhendo esses frutos.”

ÚLTIMAS NOTÍCIAS