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domingo, 13 outubro, 2024

O Equador elege o terceiro vice-presidente em menos de dois anos

Por Murilo Matias – Carta Capital

Equador acaba de confirmar Otto Sonnenholzner como novo-vice-presidente do país após eleição indireta realizada pela Assembleia Nacional. Sonnenholzner será o terceiro a ocupar o posto em menos de dois anos da presidência de Lenín Moreno. Os anteriores foram Maria Alejandra Vicuña, que renunciou ao posto devido a acusações de cobranças indevidas que teria submetido a um ex-funcionário, e Jorge Glas, eleito na chapa presidencial vencedora, mas preso por suposto recebimento de propina da empreiteira brasileira Odebrecht durante o mandato do ex-presidente Rafael Correa.

“Entrar na política na qualidade de vice-presidente não estava nos meus planos imediatos. Aceito o chamado do presidente em nome da estabilidade e da democracia. Até esse momento acredito que temos conseguido, destacou o jornalista Sonnenholzner.

Para os setores da sociedade identificados com a esquerda trata-se de mais um largo passo dado pela gestão liderada por Moreno em direção ao neoliberalismo. Escolhido em Guayaquil berço conservador do país, o novo vice obteve o respaldo das bancadas de direita, especialmente do movimento Criando Oportunidades (Creo), e foi indicado por ser considerado um nome desvinculado da política, conforme o desejo do presidente.

“Nossa preocupação é a mesma que se passa na Argentina e no Brasil. Lenín foi vice de Correa, mas chegou ao poder e mudou a política. Tratou de acabar com o socialismo que construíamos. Tudo o que as elites pediram foi atendido. A direita avançou por aqui e tenta acabar com a imagem de Correa, assim como fizeram com Lula e Cristina Kirchner. Esperamos que nas próximas eleições o povo reaja, mas está alienado por agora” observa Jimmy Enriquez, da capital Quito.

A instabilidade política no centro da administração tem como pano de fundo o rompimento de Moreno com seu grupo de sustentação a partir da postura do líder no comando desde que assumiu a máquina pública.

A ênfase nos ajuste fiscal em detrimento dos investimentos em educação e saúde e a mudança de concepção que o afastou de Correa determinaram a divisão do bloco antes hegemônico e de maioria assegurada no Parlamento.

“Quando esperava-se a continuidade do que denominamos de Revolução Cidadã liderada por uma década por Correa e caracterizada pelo avanço social das classes menos favorecidas fomos surpreendidos pela traição. Para piorar, vive-se um clima de negação da política e de desprestigio da função pública”, opina Domenica Salcedo, comerciante.

Restauração conservadora

A situação extrema vivida pelo ex-vice-presidente Jorge Glas é apontada como o exemplo mais nítido do ativismo judicial e da perseguição política empreendida pelos tribunais contra líderes populares. Citado em uma delação de um funcionário da Odebrecht, Glas alega inexistência de provas materiais e o desrespeito ao direito de ampla defesa em seu processo. A fim de denunciar sua situação realizou uma greve de fome de quase dois meses.

“Sou um preso político. Pelo ódio sem limites me levaram ao cárcere sem motivo, somente para humilhar-me, somente por vingança. Minha vida corre perigo. (…)Alguém deve fazer algo, a ONU, OEA, a Corte Interamericana, a Corte de Haya, juristas do mundo. A judicialização da política deve ser considerada um delito de lesa humanidade. (…) Este é um grito ao mundo. Estão violando todos os meus direitos humanos”, escreveu em carta.

Em mais um movimento para debilitar o polo progressista, Correa também teve uma ordem de detenção emitida pela Justiça, mas não cumprida, uma vez que o ex-presidente vive atualmente na Bélgica. A Interpol recusou-se a cumprir a medida.

➤ Leia também: As disputas e traições entre aliados na América Latina

CORREA E MORENO: CRIADOR E CRIATURA NÃO SE BICAM (FOTOS PÚBLICAS)

Correa é acusado de ser o autor do sequestro do opositor Fernando Balda em Bogotá no ano de 2012, o caso resultou ainda na destituição da assembleísta Sofía Reyes pela suposta tentativa de tráfico de influência ao conversar com uma testemunha do processo.

Ligada ao correísmo, a parlamentar recorre nas cortes internacionais para assegurar seu mandato e classifica como aberrante os critérios para sua expulsão como representante popular.

Esses e outros casos são comparados ao que ocorre em outros países da região a ponto de Correa apontar a reedição do antigo Plano Condor, quando ditaduras sul-americanas articularam-se na repressão a militantes da esquerda e consequente favorecimento de interesses estrangeiros e das elites nacionais.

“A América está calada e se seguimos assim só nos faltará a volta dos militares. As ditaduras dos 70 não regressam porque não se necessita, hoje existem estratégias supostamente democráticas que impulsionam o lawfare, tudo aparentemente com uma imprensa livre. Estamos retrocedendo em nível constitucional e de direitos humanos”, declarou Correa em entrevista concedida a CartaCapital no primeiro semestre deste ano.

Daqui a três meses, em março de 2019, o Equador realizará eleições para prefeituras, conselhos municipais e outros órgãos num total de mais de dez mil autoridades eleitas, incluindo a administração de Guayaquill e Quito, as duas maiores cidades do país.

O embate entre os correistas que criaram o partido Revolução Cidadã e os leninistas atrelados à Aliança País e mais recentemente aos conservadores indicará o rumo a ser definido pelo eleitorado formado por 13 milhões de equatorianos. Ante a incerteza do voto popular, a revolução por um lado e a restauração pelo outro seguirão disputando as mentes e corações dos equatorianos durante esse confuso período histórico.

“Lenín segue a ter maioria na Assembleia, contando com os partidos de direita e da oposição que se uniram a ele, mas números atuais indicam que não supera 39% de aprovação. Sua rejeição chega a 52%. Está em seu pior momento de popularidade, não há manifestações contrárias porque se acerca o processo eleitoral de março. O ano vai ser complicado de 2019 e aí sim se esperam mobilizações nas ruas”, avalia David Rico, consultor político.

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