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César Fonseca
A eleição na Venezuela, segundo o cientista político marxista argentino, Atilio Borón, em palestra no México, analisando o panorama latino-americano, no cenário da eleição venezuelana, mostra que a esquerda continental enfrenta o grande impasse diante do imperialismo americano que a quer destruir para fazer valer a ideologia da Doutrina Monroe, consubstanciada na América para os americanos: ela, a esquerda, ressalta, chega ao governo pela democracia, em termos estadunidenses, mas não consegue exercer o poder.
A razão disso, para Borón, é notória: com a globalização, que diz ser extensão da pregação de Lenin, de que ela é a nova etapa superior do imperialismo, dois pólos de poder predominam de forma oligopolizada/sintonizada para sustentar a sobreacumulação de capital cada vez mais concentrada e brutal:
1 – Poder financeiro ultraconcentrado, realiza-se no ambiente de financeirização completa das atividades produtivas, submetidas à lógica do capital financeiro, multiplicado por taxas de juros extorsivas, impeditivas de sustentação segura da economia nos marcos do capitalismo produtivo, baseado na dualidade consumo-produção, e;
2 – Domínio completo da comunicação de massa como reprodutora da sobreacumulação capitalista financeira que desarticula as forças produtivas em processo de cooptação das forças progressistas, sempre no sentido de destruí-las, se por acaso chegam ao poder pela democracia submetida ao poder do capital que a usurpa e desfigura.
CHAVISMO, UMA EXCEÇÃO RELATIVA
O chavismo, na Venezuela, para Borón, é, excetuando Cuba, onde se realizou revolução socialista, a única experiência que, relativamente, enfrenta os dois maiores obstáculos à ascensão da esquerda, porque o ideológico e ex-presidente venezuelano Hugo Chaves cuidou do essencial na construção de uma obra política que ainda não está concluída e enfrenta adversários radicais: os Estados Unidos e seus aliados da direita e da ultra direita, bem como liberais da esquerda cooptados pelo discurso reformista americano, impotente para promover transformações estruturais.
Trata-se, no conceito chavista, de organizar as massas trabalhadoras para resistir, politicamente, ao assalto do capital às riquezas nacionais e à exploração do trabalho pelo capital.
Todo o esforço do capitalismo americano, desde que Chávez subiu ao poder, em 1999, deixando-o em 2013, quando morreu, é o de promover iniciativas políticas diversionistas, financiando aliados de Washington, para impedir a conscientização política da sociedade venezuelana, objetivando detonar a revolução chavista.
Por isso, a resistência venezuelana, sob governo bolivariano de NIcolás Maduro, na linha chavista, organizou, segundo Atílio Borón, partido político, o PSUV – Partido Socialista Unido Venezuelano –, organicamente articulado pela sociedade e forças armadas para proteger a maior riqueza nacional, o petróleo, por meio do qual se tenta o bolivarianismo garantir independência e soberania nacional.
O petróleo é a base material histórica e dialética da economia venezuelana, mas a sua evolução e transformação em base industrial não foi alcançada porque os Estados Unidos cuidam de promover sanções econômicas(atualmente, são mais de 900), capazes de impedir que esse objetivo seja alcançado.
7 PONTOS CAPITAIS
Borón alinha sete pontos que considera capitais para construção e consolidação do chavismo e, por extensão, da organização do poder político latino-americano, em geral, pela esquerda, para além da mera conquista do governo, democraticamente.
PRIMEIRO: afastar a ilusão do reformismo burguês.
Ele não tem condição alguma de se materializar no modo de produção capitalista da burguesia, cuja função essencial é atuar violentamente contra as forças progressistas.
SEGUNDO: não se deve, também, alimentar esperança de que a oposição atue, politicamente, de forma leal, pois a missão da direita e da ultradireita, que se unem para preservação do poder, é apelar para o golpe sempre que necessário, usando as próprias instituições burguesas, o legislativo e o judiciário, sustentados pelo poder do capital, agora, em processo de financeirização total.
TERCEIRO: para destruir as forças progressistas, quando no poder, sob democracia liberal, a direita e ultradireita organizam resistências conservadoras, sempre, em escala internacional.
Ambas estarão sempre unidas para destruir toda e qualquer experiência democrática encabeçada pela esquerda, nos países fortes ou fracos, com igual intensidade, mobilizando em última instância o imperialismo e seu subproduto essencial: a guerra.
QUARTO: organizar partidos com consciência crítica ao imperialismo, eis a única ameaça que a direita e ultradireita temem como produto da organização popular, politicamente, consciente.
QUINTO: Borón cita Paulo Freire como o ápice da educação popular libertadora que a direita e ultradireita se empenham em destruir, como demonstrou o bolsonarismo fascista no Brasil, para impedir a organização social dos trabalhadores, de modo a enfraquecê-los e destruí-los.
ILUSÃO BURGUESA DA ESQUERDA LIBERAL
Nesse sentido, a direita e ultradireita cuidam de disseminar a falsidade de que o acesso das massas ao consumo, em escala controlada e relativa, pelos planos econômicos burgueses e neoliberais, representa avanço na consciência social.
Crasso erro, diz Atílio Boron, porque a sensação de acesso ao consumo somente produz classe média conservadora e reacionária, que acaba votando, nas eleições democráticas, conduzidas pelo dinheiro, nos bolsonaros, macris e mileis da vida, comprometidos com o imperialismo.
SEXTO: Borón destaca, como essencial, a luta contra a burocracia, por entender que o maior inimigo das esquerdas, que chegam ao governo, democraticamente, é o aparato estatal – a superestrutura jurídica – que aprisiona a infraestrutura econômica.
Para sair dessa armadilha, o marxista argentino destaca que a China de Xi Jinping cuida de disseminar na sociedade a leitura do Manifesto Comunista, de Marx e Engels, como fator de organização política e científica da classe trabalhadora, como resistência à cultura burocrática do poder conservador.
SÉTIMO: Finalmente, para as esquerdas se organizarem para controlar e exercer o poder e não apenas ser governo, trata-se de controlar o poder do capital financeiro especulativo que controla o Estado com mão de ferro.
LIÇÃO CHINESA
É necessário, finaliza Atílio Borón, proceder-se como chineses, que alcançam o topo do desenvolvimento mundial, ultrapassando o liberalismo americano dominado pelo capital financeiro que acaba de levar a economia à instabilidade das bolhas especulativas: organização política partidária, de modo a submeter o mercado ao comando do estado, para que não ocorra o oposto: o mercado dominar o governo.
Atualmente, toda a América Latina, especialmente, no Brasil, está sob domínio do poder tirânico da financeirização, escravizando, indiscriminadamente, os trabalhadores, eliminando todos os direitos inscritos em constituições, que se transformam em fantasias de poder meramente abstrato.
Somente, submetendo o mercado ao controle do poder político do Estado, dominado pelo partido organizado dos trabalhadores, será possível ao trabalho dominar o capital, para exercitar, efetivamente, o poder e não apenas o governo.