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domingo, 6 outubro, 2024

Mães cobram o fim do extermínio da infância e da juventude negra da Bahia

Ato em Memória das Vítimas da Chacina da Gamboa de Baixo realizado no dia 7 de fevereiro de 2022 em Salvador. – Beatriz Sousa/ Instituto Odara
Caso recente de mortes pela violência policial em Salvador reforça a necessidade de luta contra essa realidade
Da Redação
Brasil de Fato | Salvador (BA) |

As crianças e jovens negros brasileiros estão morrendo, vítimas da violência que encontra no racismo a sua principal causa. No início do mês de março, três jovens negros soteropolitanos foram mortos a tiros pela Polícia Militar na comunidade Gamboa de Baixo, em Salvador. Alexandre Santos, Cleberson Guimarães e Patrick Sapucaia são as vítimas, e esses não são casos isolados.

Em nota de repúdio ao assassinato dos três jovens, o Instituto Odara relembra outros casos semelhantes que aconteceram na Bahia: “Ryan Andrew, 9 anos, assassinado pela polícia no Vale das Pedrinhas em 26 de março de 2021; Davi Oliveira, 22 anos, assassinado pela polícia em São Félix/ Recôncavo da Bahia, em 13 de dezembro de 2020; Micael Santos, 11 anos, assassinado pela polícia no Nordeste de Amaralina, em 16 de junho de 2020”.

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O cenário é ainda pior, já que o genocídio da infância e juventude negra não acontece apenas na Bahia. O Panorama da violência letal e sexual contra crianças adolescentes no Brasil, lançado em 2021 pelo Fundo de Emergência Internacional das Nações Unidas para a Infância (Unicef), aponta que 35 mil crianças e adolescentes de 0 a 19 anos foram mortas de forma violenta no país entre os anos de 2016 e 2020.

Destas, 31 mil eram adolescentes. Dos adolescentes, 80% eram negros e foram mortos fora de casa, por armas de fogo, em sua maioria, por intervenção policial.

Hildete Emanuele Nogueira é coordenadora do projeto Minha Mãe Não Dorme Enquanto Eu Não Chegar e explica sobre o leva a tantas mortes de jovens negros pela polícia na Bahia e no Brasil. “Entra governo, sai governo e essa realidade não muda. A polícia, que é a mão armada do Estado, entra nessas comunidades ceifando dos nossos jovens negros. Jovens cheios de sonhos, de projetos, que têm a sua vida interrompida ainda tão cedo”, salienta.

A violência não atinge apenas as crianças e adolescentes assassinados. Hildete comenta sobre os impactos dessa violência policial na vida das mulheres negras: “A vida das mulheres negras e, especialmente, das mães desses jovens é interrompida ali, naquela realidade. Vai junto com esse jovem a esperança, o brilho no olhar, a vontade de viver. Essas mulheres são impactadas diretamente por essa morte brutal. Não tem como continuar vivendo sem lembrar todos os dias daquela realidade”.

Foi justamente para fortalecer as mães negras que perderam seus filhos para a violência do Estado que o Instituto Odara criou o projeto Minha Mãe Não Dorme Enquanto Eu Não Chegar.

Hildete explica que o instituto percebeu “a fragilidade com que as mães desses jovens negros, exterminados brutalmente pelo Estado, encontravam-se. Através do projeto, é possível dar acolhimento e fortalecer essas mães para que elas possam, frente a essa dor, seguir a vida, caminhando, tendo cursos, formações, rodas de conversa e o apoio psicossocial”.

Rita de Cássia encontrou acolhimento no Odara há oito anos e meio, poucos meses depois de ter seu filho assassinado. Ela fala da importância desse espaço: “foi a única instituição que me deu apoio. Logo no início eu não queria, me fechei completamente do mundo. Mas, depois, foi a melhor coisa que fiz [entrar para o Odara]”.

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A experiência de Rita como mãe que perdeu seu filho para a violência policial é semelhante a de outras mulheres. “Foi horrível. Eu não desejo isso para pessoa nenhuma, porque perder um filho é perder uma parte de você. Para mim foi muito difícil, ainda mais porque ele deixou, na época, um filho de três anos. Conviver com isso foi muito complicado. E até hoje nada foi resolvido. Já vai fazer nove anos e nada foi resolvido. Parece que foi um cachorro que morreu, mas tiraram a vida do meu filho”, declara.

O tamanho do impacto do racismo nos casos de violência no Brasil fica evidente a partir do Atlas da Violência 2020, divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). O documento aponta que os casos de homicídio de pessoas negras aumentaram 11,5% em uma década. No mesmo período, a taxa entre pessoas não negras (brancos, amarelos e índios) foi na contramão desse cenário e apresentou queda de 12,9%. Ou seja, o racismo segue matando.

Hildete compartilha o que é preciso ser feito para mudar esse cenário de violência policial contra crianças e jovens negros: “A gente precisa que esse Estado, que chega nas comunidades com a mão armada, chegue com políticas públicas de esporte, de lazer, de educação, de cultura. Esses jovens têm muitos sonhos, muitos projetos. O Estado precisa escutar essa juventude e junto com ela construir políticas públicas que ajudem os jovens a viver com mais segurança. A gente quer uma juventude negra viva”.

Rita de Cássia clama por menos violência nos bairros de Salvador, para que as crianças e jovens negros permaneçam vivos. “Como mãe, eu gostaria de falar para a sociedade, principalmente para os policiais que entram nos bairros que eles consideram como favela, para parar de matar nossos jovens, nossas crianças. Eles precisam ter mais empatia com o próximo, porque chegam lá violentamente, espancando, matando, não querem saber. Mesmo se fosse traficante, acho que deveria ir preso e não matar. Como eu tenho um neto, ele vai fazer 12 anos agora em abril, eu tenho muito medo até de levar ele para o bairro em que eu moro, porque tem muita violência policial. Mesmo sabendo que existe tráfico, eu queria que os policiais tivessem mais modos de chegar no bairro. Isso é muito triste”, reforça.

Fonte: BdF Bahia

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