Buenos Aires – O mundo inteiro está de ôlho nos efeitos político-sociais que produziu mais este descalabro do lawfare contra Cristina Kirchner. O dito partido judicial-midiático que assegura o poder hegemônico das grandes finanças internacionais, arraigado na Argentina e sustentado pelo governo libertário de Milei, decidiu condenar a ex-presidenta (da melhor década do início do século), mulher, e líder de massas dos últimos tempos na América Latina. Uma condenação a 6 anos de prisão e proscrição perpétua a exercer qualquer cargo público. Sentença infundada, no mesmo estilo do ex-juiz Moro contra o presidente Lula: sem provas, mas com convicções. Além da transcendência mundial – pois chegou para ser questionada na Corte Internacional da Justiça, em Haia, e na Corte Interamericana de Direitos Humanos –, a condenação emitida pelo máximo órgão de justiça argentino (Corte Suprema), composto de apenas 3 juízes (2 deles colocados a decreto pelo ex-presidente Macri), despertou uma rebelião social contra o governo.
Ontem, 18 de junho, foi um dia histórico. Uma multitudinária manifestação de 1 milhão vindos de todo o país, rumo à Praça de Maio, reproduziu a memória e a força do povo argentino que, em 17 de outubro de 1945, no “Dia da Lealdade Peronista”, saiu às ruas para exigir a libertação de Peron, então Secretário do Trabalho e Ministro da Guerra. Hoje foi um dia por “Cristina Livre” e em defesa da democracia ameaçada. Todos dizem: defender a Cristina é defender os direitos sociais, trabalhistas e humanos concedidos e nascidos com Peron/Evita, destruídos por Menen e De La Rúa, e recuperados nos 12 anos do governo de Nestor e Cristina Kirchner. Direitos que estão sendo proscritos por Milei. O povo argentino tem história e a memória dos 30 mil desaparecidos. Cartazes do “Nunca Mais ditadura” estão presentes.
Desde o dia do anúncio da condenação à Cristina Kirchner, há um desfile permanente de manifestantes diante de sua casa, repudiando a injustiça, agradecendo seu legado, com faixas: “Força Cristina!”, “Cristina Livre”. Nestes dias, a ex-presidenta se comunicou, mesmo sem poder falar, saudando com gratidão e solidariedade através da sua varanda. Passada uma semana, temendo a anunciada quilométrica manifestação que a acompanharia ao tribunal de Comodoro Py (para o ditame sobre o local e a modalidade da prisão), os juízes decidiram conceder-lhe a prisão domiciliar. Inclusive, hoje, tiveram que voltar atrás na absurda restrição a sair na própria varanda residencial.
A pressão social a favor de Cristina tem sido enorme. Nesse 18 de junho, num dia normal de trabalho, num vai e vem, da manhã à noite, um milhão de pessoas chegaram à Praça de Maio, mesmo com um anormal controle policial nas estradas sobre as caravanas provenientes do interior; o protesto transbordou nas capitais de todo o país; uma massa humana solidária circundou a casa de Cristina Kirchner. E a ex-presidenta não dependeu de uma varanda para fazer ecoar sua voz na praça, com um discurso de 8 minutos gravado, que chegou a todos os cantos do país, através do canal de TV C5N e meios comunitários. Suas palavras foram recebidas com silêncio, atenção e lágrimas.
Como dizem, o governo decidiu passar do jogo de damas ao xadrez e golpeou a rainha. Mas o seu tiro saiu pela culatra. Diante da sua crise econômica e social incontrolável, o dito Partido Judicial, apoiado pela mídia hegemônica (Clarin, La Nación), levou um gol contra. Aprovaram uma sentença infundada para impedir a simples candidatura de Cristina a deputada da legislação de um distrito provincial, e provocaram uma rebelião social de norte a sul do país que a convalidou como líder nacional. Por isso, o povo não diz só “Cristina inocente!”, mas sim: “Voltar! Vamos voltar!”. Reascendeu-se a força do peronismo desarticulado nos últimos tempos.
Estiveram presentes todas as forças políticas, com notável participação juvenil, e puseram um limite às ameaças à democracia. Desde o Partido Justicialista (PJ – do qual Cristina é presidenta), a todas as centrais (CTAs, CGTs, ATEs) e movimentos sindicais (bancários, metalúrgicos (UOM), professores, funcionários públicos, jornalistas, artistas, cientistas, etc…) movimentos sociais (Pátria Grande, Evita, Movimento Direito ao Futuro, A Câmpora, Frente Renovadora, etc…), Mães e avós da Praça de Maio, partidos da esquerda (PO, FIT, MST); todos, sobretudo famílias vindas dos bairros, da classe média empobrecida, jovens, desempregados na área da saúde (Hospital Garrahan e outros), do ensino público, da cultura, dos Direitos Humanos (museu ESMA). Moveram-se imigrantes da Bolívia, Colômbia, Uruguai, Brasil e outros. O núcleo do PT marcou sua presença, bem como o deputado Paulo Pimenta que anunciou a provável visita de Lula à Cristina Kirchner, por ocasião da reunião do Mercosul em julho, na Argentina. A comunidade argentina no exterior desencadeou a formação de comitês por “Cristina Livre”, começando pela América Latina onde o kirchnerismo teve um papel fundamental para a sua integração dentro da Celac à Unasul.
Esta quarta-feira, 18 de junho, abre um novo capítulo, reascende uma espécie de autoestima e união popular abalada pelo individualismo de auto-defesa, pelo ódio induzido por libertários carcerários. Abre-se a chance de recuperar a memória do aguerrido povo argentino. A injusta sentença contra Cristina, despertou notavelmente a juventude; o ânimo dos setores desorganizados e unificou nas ruas o peronismo e toda a oposição política. Peronistas e não peronistas saíram às ruas para conversar sobre o que ganharam com Cristina e o que perderam com Milei.
A importância desta manifestação é mais qualitativa que quantitativa. Inclusive dentro de um contexto internacional muito complicado. Foi uma manifestação transversal de toda a sociedade, de reencontro consigo mesma; contra o clima de ódio e violência instigado por redes sociais e ações oficialistas contra opositores, pondo em risco a democracia. O governador de Buenos Aires, a mais populosa do país, Axel Kicillof, disse: “Esta é uma tentativa de disciplinar a base, a liderança, os sindicatos e todos os demais. Mas não tem como, porque nosso povo está sobrecarregado pela necessidade de mais e melhores empregos, o oposto do modelo de Milei.”
Certamente, agora falta saber como o peronismo vai sair desse impasse, política e eleitoralmente. Os protestos se avolumam nas portas de fábricas fechadas. Enquanto os supermercados estão vazios, pequenos comércios desaparecem; escolas privadas fecham. O desemprego massivo chega a 1,2 milhão; famílias e jovens sem-teto abundam calçadas dos grandes centros urbanos como nunca visto na Argentina. Tudo isso fala mais que os números. O recado das multidões de 18 de junho, acolhido e sintonizado por Cristina, é um chamado à união de referentes políticos como o governador Axel Kicillof, Juan Grabois, Sergio Massa, Máximo Kirchner; de busca de representatividade nas bases, em torno a projetos sociais de transformação e com comunicação popular.
Aqui vai a mensagem completa de Cristina Kirchner, que levou o povo às lágrimas, e à decisão de voltar a participar e entrar em cena.
Cristina, com sintonia fina, sintetizou o sentimento das pessoas que têm ido à porta da sua casa, reivindicando um país como o que havia deixado em 2015, onde as crianças comiam quatro vezes ao dia, onde as escolas tinham livros e computadores, onde os trabalhadores conseguiam sobreviver, chegar no fim do mês e conseguiam comprar algo, uma casa, um carro, e os aposentados recebiam seus remédios gratuitos. “Aquele país não era uma utopia. Nós o vivemos. Foram doze anos e meio de vida. E também o deixamos livre de dívidas, assim como famílias e empresas.”
Além de relembrar as experiências desastrosas de Martinez de Hoz em 1976 e de Cavallo em 1990 que terminaram do mesmo jeito, atacou a reincidência de Caputo via Milei seguindo um modelo não diferente dos do passado, que está desmoronando “não apenas porque é injusto ou desigual; mas, porque é economicamente insustentável. Ele tem uma data de validade, como o iogurte”.
“Há que organizar-se para clarificar qual é o verdadeiro problema que tem nosso país.” Aqui Cristina dá a entender que as lideranças têm que melhorar muito na comunicação popular.
“Não sei o que o futuro próximo me reserva; não tenho bola de cristal. Mas já vivi uma ditadura que fez desaparecer 30 mil companheiros, vivi tentativas de saque do país, vivi o sacrifício de Néstor e também uma tentativa de assassinato. A verdade é que não me faltou nada nestes anos. E, apesar de tudo, aqui estou.”
“Podem me encerrar, mas não todo o povo”
E terminou: “Vamos voltar e com mais sabedoria, mais unidade, mais força e desde onde eu tiver que estar, em qualquer trincheira, vou fazer um esforço para estar aí com vocês, como vocês tem estado junto a mim. Porque nós temos algo que eles jamais terão, nem vão poder comprar, por mais dinheiro que tenham. Temos povo, memória, história e pátria. Vamos voltar, argentinos e argentinas! Voltaremos. Voltaremos mil vezes, como se fez desde o fundo da história. Os povos, no final, sempre voltam”.
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