Saulo Cruz/Agência Senado
César Fonseca
A democracia, sem dúvida, pelo conjunto dos acontecimentos no cenário internacional – e, também, nacional – está em baixa. O principal culpado por esse estado de coisas é o presidente Donald Trump. Mas, não só ele. Seus antecessores adubaram a exorbitância trumpista pelo excesso de poder imperial. Ele se lixou para o Congresso, para a Constituição americana, para o direito internacional e, como se fosse o dono do mundo, mandou bala, atacando o programa nuclear do Irã, sob pressão do sionismo internacional, ao qual está rendido pelo poder financeiro especulativo judaico que domina o império de Tio Sam, para salvar Israel. Por isso, a ordem mundial está solta no espaço, sem ancoragem. Qualquer sopro mais ou menos forte sobre ela desanda tudo.
As regras – o mundo dominado por regras – viraram arranjos de forças arquitetados pelos mais fortes para subjugar os mais fracos. Por isso, o que predomina, no momento, são narrativas destruídas de credibilidade, ditadas pelo mais forte. É como se vigorasse a lei de que quem tem razão é o que grita mais alto, sem cuidado algum com os fatos e suas razoabilidades.
Mutatis mutandis, enquanto nos Estados Unidos, o poder executivo superforte dobra o legislativo, na base do grito, como faz Trump, no Brasil, o executivo, fraco, sem representatividade suficiente, perde de goleada para o legislativo forte, porém, desorganizado e dividido, sem saber fazer o suficiente para garantir governabilidade. Ao contrário, passou a atuar para inviabilizá-la, porque deseja destruir o executivo presidencialista. Jogam, portanto, como Trump, contra a democracia, de forma inversa. Estão inspirados pela onda trumpista da arrogância e pela vontade de fazer valer o direito da força sobre a força do direito.
PERFIL TRUMPISTA TUPINIQUIM
Os líderes do Congresso, no Brasil, senador Davi Alcolumbre(UB-AP) e deputado Hugo Motta(Republicanos, PB), assumiram o perfil trumpista da exorbitância e, assim, como o titular da Casa Branca, atropelam o sistema democrático em nome de interesses inconstitucionais. Querem governar com emendas parlamentares editadas por eles próprios, para impedir a governabilidade lulista. Estão, apenas, parcialmente, contidos, porque o Supremo Tribunal Federal se levanta contra a inconstitucionalidade explícita exercida por eles, dominados pela volúpia do poder.
A guerra do IOF que ambos movem ainda está sem vencedor. Alcolumbre e Motta derrubaram o projeto do governo, de cobrar Imposto sobre Operações Financeiras dos mais ricos para favorecer a classe média que ganha até R$ 5 mil/mês, mas podem perder, se o governo recorrer ao STF para contestar a vitória legislativa aparente. Por essa razão, o jovem Motta, incorporado pelo excesso de confiança, ambição, amor próprio e vaidade juvenil, sequer atende os telefonemas dos representantes do executivo, para discutir a validade de suas ações, como se detivesse o poder absoluto, como negação da República formada pelos três poderes.
O espírito de Trump tomou conta dele e de Alcolumbre, para juntos marcharem sobre a fortaleza do inimigo que pretende derrotar, Lula, sem ter certeza de que têm, verdadeiramente, a força para tal aventura antidemocrática. Os dois não escondem a quem verdadeiramente servem, isto é, ao mercado financeiro, que, na linha ultra neoliberal, querem acabar com o presidencialismo, para instaurar o semipresidencialismo ou parlamentarismo, por meio do qual impõem a desarticulação geral do executivo, do poder estatal, a fim de favorecer, totalmente, o setor privado, na condução dos negócios públicos. Transformaram-se os líderes do legislativo em marionetes da Faria Lima, em troca das benesses asseguradas pelas emendas parlamentares que destroem a governabilidade presidencialista, a fim de beneficiar a elite financeira defensora da sonegação tributária sob semipresidencialismo.
GUERRA DE NARRATIVAS
Alcolumbre e Motta entraram na guerra das narrativas para impor sua vontade na linha trumpista. Motta colocou em votação o projeto do IOF para derrubá-lo, na calada da noite, sem cuidar de nenhuma negociação prévia. Fez como Trump que descuidou de comunicar ao legislativo que atacaria o Irã para defender Israel. Por exemplo, Trump não esperou nem dois dias para expedir relatório dando conta de que “obliterou” – destruiu, dizimou, eliminou etc – o programa nuclear iraniano. Antes que o Aiatolá Khamenei falasse alguma coisa, quem falou desmentindo Trump foram agentes do próprio governo americano, do seu sistema de defesa, que colocaram em dúvida a palavra do presidente, a sua versão.
Em Washington, o que rola é a opinião generalizada de que Trump é um exagerado, amante da adjetivação excessiva, responsável por gerar dúvidas nos espíritos em geral. Documento vazado pelo Pentágono para a CNN evidenciou que o programa nuclear do Irã não foi totalmente destruído, depois da ação que Trump desfechou. Quem detém as informações secretas no império, senão o Pentágono, onde estão os falcões da guerra, com os dedos nos gatilhos? Eles, que estão colocando em questão a fala de Trump, não saberiam a verdade, ou o presidente deu uma blefada?
BLÁ, BLÁ, BLÁ IMPERIAL
Os ataques, segundo o chefe do Estado Maior, general Dan Caine, tiveram como alvos dois poços de ventilação, que levavam ao complexo subterrâneo da usina de Fordow. Teria sido por meio deles que as bombas foram lançadas. Porém, as agências de inteligência européias, segundo o Financial Times, colocaram, também, em dúvida essa afirmação e informam que o essencial não se realizou: a destruição do estoque de urânio enriquecido. Ou seja, a inteligência iraniana permaneceu intacta.
O Xá Khamenei, depois do palavrório desencontrado dentro do governo americano, disse que nada de significativo aconteceu com as usinas atômicas, o que pode, também, conter certa dose de exagero, enquanto cantou vitória ao dizer que danificou a base aérea de Al Udeid, uma das principais bases americanas na região. O fato é que o império americano não alcançou o objetivo de dar tranquilidade ao seu protegido, Israel, que perdeu o equilíbrio para os aiatolás por falta de segurança quanto a enfrentá-los sem o apoio dos Estados Unidos. Revelou-se vulnerável, evidenciando que sua valentia existe apenas para praticar genocídio contra os palestinos desarmados.
PODER SEM RUMO
Já, por aqui, em Terra Brazilis, os dois líderes do Congresso, em sua guerra do IOF, para livrar ricos de pagar imposto, causaram espanto até na mídia conservadora, que está apoiando o esvaziamento do presidencialismo para impor supremacia parlamentarista ou semipresidencialista adequada aos interesses da Faria Lima. Em editorial, o jornal O Globo, nesta quarta-feira, destacou que o Congresso, sob comando de Alcolumbre e Motta, perderam o rumo do país. Atacam o presidencialismo e aumentam a representatividade do semipresidencialismo, para fazer exibição de forças, enquanto afunda a governabilidade, assim como Trump afunda a estabilidade internacional, jogando a democracia no abismo. O que fica claro é que Alcolumbre e Motta, no Brasil, como Trump, nos Estados Unidos, em meio à financeirização econômica especulativa global que vai destruindo a democracia, subjugada pela ordens da força da guerra como solução do capital, mostram claramente o propósito maior da direita e ultra direita fascistas: impor o poder pela prepotência do dinheiro como lei geral no ambiente do caos capitalista.