Por Odalys Troya Flores * Havana (Prensa Latina) As Forças Armadas Revolucionárias do Exército Popular da Colômbia (FARC-EP) e o governo do então presidente Juan Manuel Santos em representação do Estado assinaram o Acordo de Paz há quatro anos, fato histórico que lhes foi apresentado inúmeros desafios.
Desde 24 de novembro de 2016, a implementação desse pacto avançou, mas sua implementação plena com o atual mandato de Iván Duque pesa muitos pontos para pacificar o país, segundo diversos pareceres.
Em entrevista à Prensa Latina pela Internet, o senador Antonio Sanguino, da Alianza Verde, fez um balanço do que foi alcançado e do que resta a ser realizado após este passo dado em Havana, Cuba, após quatro anos de diálogo e negociações.
‘Apesar das dificuldades em sua implementação, o Acordo tem possibilitado a defesa da vida. Em nível nacional houve uma desaceleração da violência e do impacto humanitário historicamente causado pelo conflito’, afirmou.
Sanguino especificou que o número de sequestros entre 2012 e 2019 foi reduzido em 70 por cento, as ações de guerrilha e ataques contra a infraestrutura do Estado também diminuíram, acrescentou.
Ele destacou que a Desminagem Humanitária permitiu em 2015 ter 20 municípios livres da contaminação por minas e munições não detonadas e agora, em 2020, as operações foram estendidas para cerca de 720 territórios municipais.
O Acordo permitiu a entrega de mais de 8.894 armas e o processo de desarmamento teve um nível excepcional de acompanhamento, observação e garantia por parte das Nações Unidas, destacou o político e sociólogo colombiano.
Nesse sentido, dos 13.360 guerrilheiros que aderiram ao pacto de Havana, 12.642 continuam em processo de reintegração à vida civil e permanecem na vontade de contribuir para a verdade, a justiça e a reparação, destacou o deputado.
Porém, dos mais de 700 que não constam mais dos registros do governo, 230 foram assassinados, segundo a Fuerza Alternativa Revolucionaria del Común, (FARC), partido nascida do Acordo; outros desapareceram por morte natural e o resto a Agência de Reincorporação e Normalização (ARN) não tem nenhum vestígio de seu paradeiro, disse ele.
No que diz respeito ao sistema de justiça transicional, alguns dados da Justiça Especial para a Paz (JEP) permitem estabelecer que sete macro-documentos foram priorizados com base em 271 denúncias de vítimas e entidades do Estado, disse o ex-vereador de Bogotá.
Até ao momento 12.591 pessoas já se submeteram ao JEP, das quais 9.759 são ex-combatentes das FARC (77,5 por cento do número total de participantes no processo), 2.713 da Força Pública, 107 agentes do Estadual e 12 de protesto social.
Dos 2.059 militares submetidos ao JEP, 1.529 obtiveram benefícios legais e 104 membros da Força Pública compareceram para contar a verdade, explicou.
Acrescentou à Prensa Latina que o Ministério Público encaminhou 103.224 inquéritos ao JEP, relacionados com o conflito armado, entre os quais 2.311 contra terceiros civis como patrocinadores da guerra.
‘Apesar dos benefícios do Acordo, o atraso na sua implementação é preocupante. Por exemplo, para a Procuradoria-Geral da Nação, no seu segundo relatório entregue ao Congresso, em março de 2020, apenas 60 por cento dos compromissos do Plano Quadro de Implementação (PMI) do Acordo de Paz, que deveria ser executado entre 2017 e 2019’, afirmou.
Nesse sentido, apenas para citar uma das defasagens mais importantes, o Programa Nacional de Substituição Integral Lavoura (PNIS) havia vinculado inicialmente 99.097 famílias e o governo nacional se limitou a atendê-las em 56 municípios, não vinculando uma única família mais, Sanguino lamentou. As mais de 188 mil famílias que assinaram acordos coletivos não foram atendidas, de modo que cerca de 52 por cento das que manifestaram sua vontade não entraram no programa, disse ele.
Ele explicou que a falta de financiamento do programa é a maior dificuldade, de acordo com as resoluções de destinação de recursos do Ministério da Fazenda e Crédito Público.
O PNIS foi atribuído 510 bilhões de pesos (139.207.713 dólares) em 2017, 459.070 milhões de pesos (cerca de 126.352.819 dólares) em 2018, 300.799 milhões de pesos (cerca de 82.579 mil dólares) em 2019 e 191 bilhões de pesos (52.575 mil dólares) em 2020.
‘Depois de quatro anos de assinatura, o Acordo não está funcionando como deveria, os ataques do governo nacional paralisaram alguns pontos, eles desconhecem outros e até propuseram reformas unilaterais para rasgá-lo em pedaços. ‘
AMEAÇAS À TOTAL CONFORMIDADE COM O CONTRATO
Na opinião do senador colombiano, há dois fatores que colocam em risco iminente o Acordo de Paz: a decisão do Presidente da República e de seu partido no poder de despedaçá-lo e o recrudescimento da violência nas regiões de conflito.
Quanto ao primeiro fator, disse que desde que Iván Duque é presidente da Colômbia, há dois anos, se dedicou a atacar o JEP, reduzindo o orçamento para sua implementação e ignorando as perigosas condições de segurança em que vivem os ex-combatentes e signatários do Acordo.
‘Até o momento, 241 foram assassinados. De mãos dadas com sua indiferença, vem um discurso de estigmatização permanente do partido no poder, o Centro Democrático, contra aqueles que assinaram o Acordo e hoje estão comprometidos com a paz e a reconciliação’, ele enfatizou.
Em 2019, vimos como as autoridades governamentais se opuseram à Lei Estatutária do tribunal de justiça de transição, o JEP, que foi criado a partir do Acordo, lembrou.
Suas objeções impactaram a coluna vertebral desta jurisdição e a deixaram sem chão, disse ele.
Uma coligação pela paz no Congresso da República evitou estas objeções e a lei deveria ter sido sancionada conforme acordado, no entanto, o Governo desrespeita permanentemente a independência dos poderes públicos e ataca o trabalho eficazmente executado pelo PEC, afirmou.
Nas palavras do Procurador-Geral da Nação, Fernando Carrillo, o JEP fez mais em três anos de funcionamento do que a justiça ordinária em 50 anos.
‘As vítimas vão a este tribunal e à Comissão da Verdade, para contar e ouvir os seus depoimentos. Os perpetradores de todas as partes estão a reconhecer as suas responsabilidades e os magistrados estão a documentar e a tomar decisões, conforme acordado no Acordo’, ele expressou.
O outro ponto crítico para o cumprimento do Acordo é o ressurgimento da violência, disse Sanguino.
Se antes da pandemia de Covid-19 víamos como grupos dissidentes, guerrilheiros do Exército de Libertação Nacional (ELN) e gangues criminosas se fortaleciam nos territórios deixados pelas extintas FARC-EP, com a chegada do confinamento dos grupos armados ilegais Eles tomaram medidas brutais contra a população civil, denunciadas por organizações humanitárias, disse ele.
Além disso, ‘no ano passado vimos como os massacres aumentaram no país e, até agora, o Instituto para o Desenvolvimento e a Paz registrou 74.’
Esse aumento da violência ocorre diante do olhar impassível do atual ministro da Defesa colombiano, Carlos Holmes Trujillo, ao promover sua aspiração presidencial, afirmou.
Para Sanguino, a indiferença do Governo, o seu pouco empenho na implementação, a redução de recursos para garantir que o Acordo seja executado nos territórios e garantir a presença do Estado é o que sufoca o Acordo de Paz neste momento.
SIGNIFICADO PARA A AMÉRICA LATINA E O CARIBE
‘Em primeiro lugar, para a Colômbia é uma janela de oportunidade que depois de 60 anos de guerra, tenhamos a possibilidade de nos mudarmos para um país em paz’, disse o deputado da Alianza Verde.
Considerou que o Acordo pressupõe a paz como o silêncio das armas e o desenvolvimento socioeconômico das comunidades mais afetadas.
‘É verdade que ainda há conflito, é verdade que o narcotráfico continua, mas há uma diferença fundamental: o único reduto da violência política é o ELN; o resto é a violência criminal’, descreveu.
Desta forma, destacou que o cumprimento do Acordo de Paz é importante porque permite acabar com a violência política e, além disso, aborda problemas estruturais na Colômbia sobre os quais seria necessário atuar com ou sem acordo.
Por outro lado, em termos de importância para a região, ele ilustrou que uma Colômbia em guerra era um problema porque se tornou a porta de entrada dos Estados Unidos para a América do Sul.
Nesse sentido, uma Colômbia em paz permite construir relações de confiança com a região e um vínculo menos assimétrico com os Estados Unidos, disse à Prensa Latina.
arb / otf / db
* Chefe do Escritório Editorial para a América do Sul, América Central e Caribe