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sábado, 12 outubro, 2024

Corrida geopolítica pela África será definitiva para novo cenário internacional, aponta analista

© AP Photo / Frederic J. Brown

O que está reservado para o continente africano em 2023? Para dois analistas de política internacional consultados pela Sputnik Brasil, há muito em jogo com a nova corrida geopolítica pela África. Enquanto potências competem por influência no continente, os 54 países da União Africana vislumbram crescimento e prosperidade.
Os dados econômicos e sociais sobre a África refletem a diversidade de um continente dividido em 54 países que abriga 17% da população do planeta. A economia africana experimentou um crescimento inédito nas duas primeiras décadas do século XXI, impulsionada pela demanda por petróleo, gás natural e alimentos.
Embora alguns países do continente tenham apresentado nesse período índices de crescimento comparáveis com os da China, é importante lembrar que os 30 países com Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) mais baixo do mundo estão na África. Em algumas regiões falta acesso a água potável, eletricidade e serviços de higiene.
É com esse cenário contrastante em vista que o continente entra em 2023 com boas perspectivas, como aponta o professor de ciência política da Universidade de Brasília (UnB) Aninho Mucundramo Irachande, que comentou que o mundo olha para a África, neste momento, “como uma galinha dos ovos de ouro“.
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O especialista explicou, em entrevista ao Mundioka, podcast da Sputnik Brasil, que há um novo cenário geopolítico em curso, “com a China, em especial, aparecendo como principal economia no mundo” e remodelando as discussões sobre política internacional. Além disso, diz ele, “a Rússia busca encontrar alternativas de cooperação diante das dificuldades com as sanções do Ocidente. Moscou tem interesse em ampliar a participação dos africanos no BRICS”.
Diante desses fatores, a África espera crescer, e para compreender o que está reservado para o continente em 2023, a Sputnik Brasil falou também com Paulo Gamba, jurista e analista internacional em Angola. Ambos os especialistas disseram que a industrialização em progresso na região deve alavancar novas potências, que terão peso econômico e geopolítico nas futuras decisões globais.
Paulo Gamba disse à Sputnik Brasil que, nesse sentido, a Argélia é um bom exemplo a ser obervado, pois é também uma forte candidata a entrar no BRICS nos próximos anos, por ser um país de renda média alta, com IDH médio alto e índices de pobreza em redução. “Tem condições de fazer parte do BRICS e deve ser submetida à votação dos países-membros”, comentou.
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“Por estar no norte da África, a Argélia tem se destacado pelo crescimento econômico, demográfico e está aí porque resistiu à Primavera Árabe”, disse ele, acrescentando que o país, “do ponto de vista político e militar, está se firmando como uma potência regional“.
Além disso, o país “tem uma política de vizinhança importante por seu posicionamento geográfico próximo à União Europeia”, enquanto abre o seu mercado de exploração de gás e petróleo para as empresas chinesas, que investirão US$ 490 milhões (R$ 2,3 bilhões) para atualizar poços existentes e perfurar outros 12.

Desafios para crescer em 2023

Em um mundo que demanda cada vez mais fontes de energia, a África possui 10% das reservas mundiais de petróleo e 8% das reservas de gás, além de grande riqueza mineral. Com o amadurecimento de suas democracias recentes, espera-se que o continente desempenhe um papel cada vez mais ativo na economia global.
Para isso ocorrer, no entanto, será preciso superar um dos grandes problemas históricos da região, a baixa industrialização, que é responsável por tornar o continente um exportador de commodities. Como disseram ambos os especialistas, esse quadro está mudando à medida que as potências globais buscam aliados na África e financiam o surgimento de novas cadeias de produção.
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Um relatório do Banco Africano de Desenvolvimento divulgado em novembro do ano passado constatou que 37 países africanos se industrializaram na última década. A publicação destaca que a construção de uma indústria produtiva será parte integrante do desenvolvimento da África nos próximos anos, oferecendo um caminho para uma transformação estrutural acelerada.
Para Aninho Mucundramo Irachande, “o desafio para os países da União Africana é criar uma independência econômica e buscar maior participação no cenário internacional como forte player econômico”.

“O desafio é atuar como player estratégico global na política também, aproveitando a reformulação de distribuição do poder no sistema internacional, com a China levando a reboque os países africanos”, afirmou.

Conforme explicou o especialista, a África se faz representar nesse cenário com uma parcela muito grande de território, recursos e população.

“A abertura da África aos países fora do Ocidente, como Índia, China, Rússia e até o Japão, faz com que a África se transforme em uma galinha dos ovos de ouro, por sua capacidade de produção, bens de consumo e matérias para produção de tecnologia”, disse ele.

Também defendendo os avanços do recente processo de industrialização, Paulo Gamba acrescentou que “está na hora de os líderes africanos olharem para os recursos do continente como meio de transformação“.

“Angola é o segundo maior exportador de petróleo, mas não tem refinarias. Em São Tomé [e Príncipe] estão os maiores exportadores de cacau do mundo, mas as fábricas de chocolate estão na Europa”, disse ele.

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Para o jurista angolano, “o que falta são estruturas de poder que consigam blindar esses recursos para o desenvolvimento dos seus países”. Ele avalia que houve problemas na formação dessas estruturas republicanas em razão das consequências do processo de colonização africano e do tipo de financiamento que o continente teve, baseado em exploração.
Em uma crítica ao financiamento do Fundo Monetário Internacional (FMI) e outras organizações financeiras do Ocidente, ele apontou que não interessa a essas organizações que os países africanos tenham organização política e militar capaz de controlar seus recursos. Em seguida, disse que esses assuntos “nunca interessam ao Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas [ONU]”, o que reforça sua necessidade de reforma.

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Paulo Gamba explicou que a presença chinesa tem um aspecto interessante: “Ela não se preocupa com um conjunto de regras de transparência e compliance nos fundos em que investe. O importante para a China é a assinatura do contrato”.
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Ele diz que essa é uma diferença importante no financiamento chinês, sobretudo quando comparado àquele feito pelas instituições europeias e ocidentais ao longo dos anos 1980 e 1990, “como o FMI, que tem regras de transparência e fiscalização que são subordinadas a controles de austeridade“.
“O FMI não tem tido sucesso nos países africanos, sobretudo com relação aos seus empréstimos, porque eles sempre estão vinculados a medidas de austeridade que sufocam as condições socioeconômicas dos países africanos”, afirmou.
A China, segundo dados recentes, é o maior parceiro comercial da África há 13 anos. Entre 2000 e 2020, o governo chinês ajudou os países africanos a construirem mais de 13 mil km de ferrovias, quase 100 mil km de rodovias, cerca de mil pontes, quase 100 portos e mais de 80 usinas de grande escala.
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Aninho Mucundramo Irachande entende que há diversas razões para a presença da China na região, mas elas são principalmente econômicas e parte de uma agenda de estratégia geopolítica. Segundo ele, Pequim explora essa presença financeira na África para o campo das discussões multilaterais, como na ONU.
“Há um despertar da importância da África para o mundo”, disse ele, apontando que o continente africano alavanca, neste momento, as condições necessárias para continuar crescendo 4,5%, como aponta o Banco Africano de Desenvolvimento, e se desenvolvendo na esfera internacional.

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