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A Sputnik explica o relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, emitido nesta semana, no sentido de como sua publicação pode afetar tanto a economia brasileira como a global.
Nesta segunda-feira (9), o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), corpo integrante da ONU, divulgou um novo relatório científico no tocante ao assunto. O relatório, elaborado por 234 cientistas de 66 países, confirma que as mudanças climáticas que nosso planeta enfrenta são claramente de origem humana, sendo “um fato inequívoco e comprovado”.
A fim de entender detalhadamente se a política ambiental do Brasil será afetada pelas conclusões do relatório, a Sputnik Brasil conversou com Nadja Heiderich, professora da Faculdade de Economia da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP), coordenadora do Núcleo de Estudos em Conjuntura Econômica e especialista em economia ambiental.
Efeitos na economia
Segundo dados relatados, a temperatura global deve aumentar em 1,5 graus Celsius já em 2040, uma década antes do previsto anteriormente. O secretário-geral da ONU, António Guterres, comentou sobre o relatório que “os alarmes são ensurdecedores e as evidências são irrefutáveis”.
Ultimamente, as mudanças climáticas têm se tornado mais visíveis, com ondas de calor sem precedentes em várias regiões no Canadá e nos Estados Unidos, inundações na Europa e na China e incêndios florestais descontrolados que têm alastrado na Sibéria, Turquia e Grécia. Tudo isso provoca vários problemas, particularmente de alimentação, já que leva à perda de colheitas por conta de geadas e queimadas, o que acaba afetando também o nível de preços de certos produtos.
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Bombeiros avançam na floresta para retardar propagação do fogo em meio ao incêndio Dixie, Califórnia, 8 de agosto de 2021
Ao mesmo tempo, os esforços de reconstrução levam a uma ativação da atividade econômica em determinadas regiões, “isso não é algo bom, pelo fato das tragédias” e das “perdas imensuráveis”.
Problemas irreversíveis?
Diante dessas notícias alarmantes, os países têm que reverter suas políticas relacionadas à utilização de combustíveis fósseis – os “grandes vilões dos gases do efeito estufa” como o carvão, petróleo e gás – levando cada vez mais à adoção de energias limpas, “que não causam nenhum tipo de efeito no meio ambiente”, opina Nadja Heiderich. E, obviamente, tais transformações necessitam de investimento e estudos aprofundados em termos de torná-las rentáveis e interessantes para a iniciativa privada na adoção dessas novas tecnologias.
“Na minha opinião, é algo talvez irreversível neste ponto em que estamos”, afirma a professora, adicionando que os Estados devem exercer ações mais concretas nesse âmbito. Por exemplo, além do desenvolvimento de energias limpas, a aplicação das iniciativas de carbono neutro pode retardar um pouco os avanços de temperaturas ou minimizar seu impacto.
“Talvez há tecnologia que a gente já tenha 100% limpa, mas ainda não é aplicável, ainda não é viável para se utilizar em larga escala.”
O novo relatório do Painel confirma essa irreversibilidade de algumas das mudanças climáticas causadas pela atividade humana. Assim, é um fato que o nível dos oceanos continuará aumentando. Há previsões de elevação do nível do mar em torno de 1,5-1,6 metro até 2100. Por este motivo, cidades litorâneas têm que se preparar para esse cenário, aponta a especialista, por meio de mudanças de hábitos dessas populações e gastos em obras na sequência de possíveis consequências de enchentes.
Emissões de gás carbono
O Brasil também tem sentido as mudanças climáticas: principalmente a região Sul-Sudeste e um pouco de Centro-Oeste neste ano sofreu bastante com geadas, temperaturas baixas não condizentes com a média histórica e ondas de frio consecutivas. Isso afeta a produção agrícola, principalmente de hortaliças, o que faz com que os preços desses itens se elevem.
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Gerente da fazenda Coqueiro examina plantações de café que foram afetadas por geadas no estado de Minas Gerais, Varginha, 30 de julho de 2021
No contexto do relatório sobre o clima, a pressão internacional em função da política ambiental do governo Bolsonaro pode aumentar, acredita Nadja Heiderich, mas com ressalva.
Se observarmos os números, a China responde por um quarto das emissões totais de gás carbono no mundo, os Estados Unidos, por sua vez, por 15%. O bloco China-EUA-Europa responde por 45% das emissões globalmente, enquanto o Brasil responde só por 3% das emissões globais. Nos anos de 2008 e 2010, a China cresceu 10-12% ao ano e teve seu papel na emissão.
Nesse contexto, “colocar o Brasil em pé de igualdade com esses países no momento de cobrança por ações eu acho injusto”, expressou a professora.
Quanto ao Protocolo de Quioto, tratado internacional que prevê a redução da emissão de gases do efeito estufa, o gigante asiático não quis assiná-lo, Washington também foi relutante, porque o custo da redução dessas emissões seria grande, enquanto o Brasil é um participante para o qual essa redução não era obrigatória por ser um país em desenvolvimento.
Entre 2006 e 2017, a República conseguiu a emissão de certificados de créditos de carbono na ONU no montante de 7,8 bilhões de toneladas. Assim, não sendo signatário obrigatório do Protocolo, o Brasil aderiu voluntariamente. Por sua vez, os países ricos não adquiriram esses certificados.
“Todo esse esforço que foi feito na promessa de que o investimento viesse por parte dos países ricos não teve essa reciprocidade”, explica a especialista.
Brasil ‘de fato cuida de meio ambiente’
Em comparação com os países desenvolvidos, o Brasil tem matriz energética mais limpa, conforme a especialista, com utilização da energia solar, hidráulica, biomassa. “Fomos pioneiros aí com etanol na década de 1970”, que é combustível mais limpo do que o petróleo.
Segundo dados fornecidos pela especialista, 85% da floresta amazônica hoje é intocada e 12% da água doce no mundo preservada está no Brasil. “Nós somos um país que de fato cuida de meio ambiente”, afirmou, argumentando que têm sido adotadas algumas ações a fim de minimizar impactos ambientais. Por exemplo, uma iniciativa para redução do desmatamento a zero até 2030.
Além disso, existe um esforço em termos da tecnologia: são utilizados satélites, drones, inteligência artificial, censores e aeronaves não tripuladas das Forças Armadas para tentar monitorar a Amazônia em tempo real.
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Vista aérea de queimadas na Amazônia, ao sul de Novo Progresso, no estado do Pará, em 16 de agosto de 2020
Governo federal também se comprometeu com meta de carbono neutro até 2060, mas, explica, tem requerido o investimento dos países ricos para poder avançar nessa agenda. Estima-se que vai necessitar US$ 10 bilhões por ano (R$ 52 bilhões).
A especialista vê bem viável tornar a economia brasileira neutra em carbono, uma vez que o Brasil já fez muito nessa área até o momento. O país já adota iniciativas mais limpas na agricultura, sendo “muito voltado para tecnologia”, e nos últimos anos tem se esforçado para manter seus mercados na Europa, que se tornou mais exigente com as questões ambientais. O Estado brasileiro caminha para “fazer salto em inovação e tecnologia” e manter seus mercados na região europeia.
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