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segunda-feira, 16 setembro, 2024

Caso Marset no Uruguai, entre o legal e o ético

Montevidéu (Prensa Latina) O narcotraficante uruguaio Sebastián Marset continua fugitivo da justiça e deveria estar escondido em outras terras, mas em seu país a saga do escândalo da entrega de passaporte ao criminoso não termina com a decisão fiscal de arquivar o caso.

Por Orlando Oramas León

Correspondente-chefe no Uruguai

O Ministério Público encerrou a investigação sobre a emissão do passaporte, mas observou que altas autoridades governamentais mentiram sobre o procedimento.

Em sua decisão, o promotor Alejandro Machado afirmou que “os ministros de Estado e seus respectivos subsecretários foram mentirosos e ocultaram informações do Senado”.

Ele observou que “o sistema de segurança nacional não estava à altura da tarefa porque as comunicações entre o Ministério do Interior e o Ministério das Relações Exteriores não eram tratadas com o profissionalismo exigido na instância”.

“Estamos em condições de concluir que os ministros de Estado, bem como os respectivos subsecretários, foram inverídicos e ocultaram informações do Senado e, em última instância, dos cidadãos”, afirma o edital.

Pode-se notar claramente o acordo entre os representantes ministeriais para não informar que Marset era um “traficante de drogas uruguaio muito perigoso e de mão pesada” e que, ao mesmo tempo, seria terrível se ele fosse libertado”, afirma o veredicto.

As implicações apontam para o então chanceler Francisco Bustillo, a vice-chanceler Carolina Ache; o ministro do Interior, Luis Alberto Heber, e o subsecretário dessa pasta, Guillermo Maciel, renunciaram.

DE UM ESCÂNDALO A OUTRO

Parecia que nada superaria o tremor político que em 2022 marcou a prisão do ex-chefe da custódia presidencial Alejandro Astesiano, e que até mereceu uma declaração perante o ministério público do chefe de Estado, Luis Lacalle Pou.

Astesiano operava a partir da Torre Executiva, sede do governo, uma rede de emissão de passaportes com documentação falsa para cidadãos estrangeiros.

Em fevereiro de 2023, foi condenado a quatro anos e seis meses de prisão por esse e outros crimes e a tempestade terminou com a substituição da direção policial, entre outros responsáveis.

Mas no último mês de 2022, a subsecretária de Relações Exteriores, Carolina Ache, renunciou ao cargo após revelações que a ligavam à entrega de passaporte ao traficante de drogas Marset, quando o criminoso estava preso em Dubai por documentação falsa.

Sebastián Marset saiu do radar, apesar de ser responsabilizado por operações ilegais de tráfico de drogas em escala internacional e pela morte do promotor paraguaio Marcelo Pecci em maio de 2022, quando passava sua lua de mel em uma praia de Cartagena, na Colômbia.

Naquele primeiro momento, Ache foi um peão entregue em sacrifício, mesmo com o consentimento da liderança de seu partido, o Colorado, que faz parte da coalizão governamental.

Mas o advogado também reservou informações sensíveis que abalaram o cenário político. Quase um ano depois de sua demissão, ela foi convocada a prestar depoimento perante o Ministério Público, que investigava as implicações e responsabilidades na emissão do passaporte ao reconhecido criminoso perigoso.

Perante o procurador de Crimes Econômicos e Complexos, Alejandro Machado, o ex-vice-chanceler entregou provas que apontavam para o então chanceler Francisco Bustillo, o ministro do Interior Luis Alberto Heber, o subsecretário daquela pasta, Guillermo Maciel, e o assessor presidencial Roberto Lafluf.

Os quatro altos funcionários renunciaram aos seus cargos, mas o procurador Machado abriu um segundo processo-crime que aponta alegados crimes de suborno, abuso de funções e destruição de documentos.

Em seu depoimento, Ache revelou que o ministro das Relações Exteriores, Bustillo, lhe disse para “perder” o celular para esconder informações confidenciais sobre o assunto.

Ele também acusou o assessor de comunicação do presidente, Lafluf, de destruir um documento na Torre Executiva referente a trocas de mensagens sobre o caso para obstruir as investigações do Ministério Público.

Isto terá ocorrido após uma reunião no 11.º andar da sede presidencial em que o próprio Lacalle Pou reconheceu ter estado “para dizer olá”.

A investigação sobre a destruição do documento pelas mãos do assessor do presidente pode apontar para uma omissão de Lacalle Pou, pelo que é provável que o presidente seja obrigado a apresentar uma declaração fiscal.

“Já fui para um caso (o de Astesiano), vou para outro”, disse o presidente.

ENTRE A VERDADE E A ÉTICA

O candidato presidencial da oposição Frente Ampla, Yamandú Orsi, colocou o assunto nestes termos quando consultado pela imprensa.

Ele ressaltou que, apesar da determinação fiscal, “o nível de suspeita ou incerteza permanece intacto”.

A verdade tem de estar acima de todas as coisas mesmo que doa, sublinhou o político, que promete governar com honestidade.

Ele ressaltou que na política não só a questão jurídica é importante, mas também “há uma questão de ética”.

Foi seu comentário sobre a opinião do procurador Machado que, embora reconheça a falta de verdade e a ocultação de informações por parte de altas autoridades governamentais, concluiu que tal procedimento “está fora da competência dos representantes do Ministério Público”.

“A investigação deverá começar pela questão da destruição de documentos”, acrescentou o porta-estandarte da Frente Amplistas sobre aspectos do assunto que permanecem sob investigação fiscal.

Esperemos que um dia saberemos porque é que houve coisas que não foram ditas, sustentou, e concluiu que serão os cidadãos que passarão na contagem final, em referência às eleições nacionais de 27 de outubro.

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