19.5 C
Brasília
domingo, 9 novembro, 2025

Carta a alguém do futuro: Como destruímos tudo

Charge de Fraga

Wellington Calasans

Se você está lendo isto, é porque, de algum jeito, sobreviveu — ou talvez encontrou essas palavras enterradas sob escombros, cinzas ou o silêncio de um mundo que já não existe.

Antes de mais nada, peço desculpas. Desculpa por tudo que fizemos — ou deixamos de fazer — enquanto ainda havia tempo. Desculpa por ter permitido que uma guerra alheia se transformasse na nossa destruição. Desculpa por ter acreditado que “nunca chegaria a tanto”. Chegou. E levou quase tudo.

Tudo começou muito antes das primeiras explosões que você deve ter lido através de uma imprensa que mentia. Aquela imprensa era parte da guerra. Substituiu o jornalismo pela propaganda, deu voz a “especialistas” forjados nos gabinetes neocons.

A hecatombe começou com promessas quebradas, com acordos rasgados como se fossem papel de bala. Os Acordos de Minsk, assinados em 2014 e 2015, eram um caminho para a paz no leste da Ucrânia — mas foram sabotados de propósito.

A Ucrânia, pressionada e orientada por potências ocidentais, nunca os cumpriu. Em vez disso, usou aqueles anos para se rearmar, treinar com instrutores da OTAN e preparar uma ofensiva.

Para Moscou, isso não foi surpresa: foi confirmação. A Rússia via, com razão, que a Ucrânia havia se tornado um instrumento da OTAN — uma lança apontada diretamente para seu coração estratégico. E, como disse Putin mais de uma vez: “Não temos para onde recuar”.

Em 2025, Donald Trump, então presidente dos EUA, tentou parecer o homem da paz. Mas sua “paz” era apenas uma pausa tática. Ele queria congelar as linhas de frente para reabastecer o exército ucraniano — um exército que, na prática, já era uma força proxy da OTAN, e que estava sendo esmagado no campo de batalha.

Quando Trump ameaçou entregar mísseis Tomahawk à Ucrânia, o mundo chegou à beira do abismo. Esses mísseis, embora antigos, só podiam ser lançados com apoio direto dos EUA — satélites, software, inteligência.

Um único disparo em direção à Rússia teria sido, tecnicamente, um ataque norte-americano. E, como qualquer estudante de estratégia sabia, contra uma potência nuclear, um ataque assim exige resposta. Não por vingança — por sobrevivência da própria doutrina de dissuasão.

Foi por isso que Putin ligou para Trump antes da visita de Zelensky a Washington. Foi um gesto preventivo, até desesperado de quem sabia que era o último passo: “Não cruzem essa linha”.

Por um instante, funcionou. Trump recuou, dizendo que “precisa dos Tomahawks para os EUA também”. Anunciou até uma nova cúpula em Budapeste, como se houvesse ainda espaço para diálogo. Mas a OTAN ignorou. Nenhum aliado europeu apoiou. Nenhuma chancelaria moveu um dedo para facilitar a negociação.

Enquanto isso, os comboios de armas continuavam chegando, os discursos de “vitória total” ecoavam em Bruxelas e Washington, e a máquina da guerra girava mais rápido do que nunca. O Ocidente, completamente endividado e afogado no orgulho ferido da derrota, não queria testemunhas daquela humilhação.

A cúpula em Budapeste nunca aconteceu de fato. As posições eram irreconciliáveis: Trump queria tempo para rearmar; Putin queria garantias permanentes de que a OTAN pararia de avançar. Sem isso, qualquer trégua seria uma armadilha. E, num mundo onde a confiança já havia evaporado, cada lado interpretou o silêncio do outro como preparação para o golpe final.

Até que, um dia, alguém cruzou a linha vermelha. Talvez tenha sido um ataque mal interpretado, um sistema automático que falhou, ou um líder que achou que podia “vencer” uma guerra nuclear. Não importa. O resultado foi o mesmo: o céu ficou vermelho, as cidades desapareceram, e o planeta entrou em colapso.

Se você está lendo isto, saiba que não foi um acidente. Foi escolha. Escolha de ignorar a história. Escolha de tratar a segurança do outro como irrelevante. Escolha de acreditar que a guerra só acontece “lá longe”, até que ela chega à sua porta — e não há mais porta.

Escrevo isso não para justificar, mas para testemunhar. Para que, se um dia houver um novo começo, alguém lembre: a paz não é ausência de guerra. É coragem de respeitar o outro antes que seja tarde demais.

*Link para comentários*:

https://x.com/wcalasanssuecia/status/1981618120734212568

ÚLTIMAS NOTÍCIAS