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quarta-feira, 20 novembro, 2024

Ás na manga: BRICS oferece a Cuba chance de driblar 60 anos de embargo dos EUA via banco do grupo

Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, especialistas afirmam que a adesão de Cuba ao BRICS fortalece o país no mundo multipolar que está se redesenhando e cria oportunidades de comercializar de uma maneira mais justa.

O governo de Cuba solicitou formalmente no início de outubro a adesão ao BRICS, grupo que passou por uma expansão recente e que, além de Brasil, Rússia, Índia China e África do Sul, passou a incluir Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Irã e Arábia Saudita. O convite para a parceria associada foi feito durante a Cúpula do BRICS que ocorreu entre os dias 22 e 24 de outubro, em Kazan, na Rússia.
Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, analistas explicam o que Cuba pode acrescentar ao BRICS e que oportunidades a adesão ao grupo traz para o país, que há 60 anos sofre com o embargo imposto pelos EUA que afeta sua soberania econômica.
Guilherme Barbosa Pedreschi, advogado, procurador federal e autor do livro “Na estrada com Fidel: o outdoor na Revolução Cubana”, avalia que o principal objetivo de Havana é obter melhores condições de contornar as sanções de Washington, conseguindo “efetivamente fazer trocas mais justas”.

“Entrar no sistema financeiro de uma maneira mais eficiente e comercializar de uma maneira mais justa. Então essa me parece que é a grande esperança, a grande boia de salvação que se sinaliza para Cuba ter acesso a crédito do Novo Banco de Desenvolvimento e assim se fortalecer nesse mundo multipolar que está se redesenhando”, explica o especialista.

O ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, é recebido no aeroporto de Kazan para participar na 16ª Cúpula do BRICS, na Rússia, em 21 de outubro de 2024 - Sputnik Brasil, 1920, 21.10.2024

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Pedreschi acrescenta que a entrada de Cuba no grupo é especialmente benéfica para a América Latina, que ele afirma se encontrar sob uma influência “ruim” e “maléfica” dos EUA. Segundo ele, Cuba se tornará um player mais relevante nas economias da região à medida que elas se tornarão mais intercambiáveis.
“Esse ganho diplomático que Cuba vai ter, esse aumento no peso de Cuba na comunidade internacional, tende a florescer nos demais países aqui […]. Eu vejo com muito bons olhos que uma nova roupagem realmente vai se desenhando na América Latina.”
Em contraponto, a adesão ao BRICS pode gerar renda em Cuba através do turismo, que é um dos principais motores da economia do país e, segundo o especialista, é afetado desde a presidência de Donald Trump (2017–2021) nos EUA.
“Cuba já é bastante aberta e muito fácil de conseguir visto de qualquer lugar do mundo […]. Mas com os parceiros do BRICS, tende a ser melhor ainda você fomentar agências de viagem especializadas dentro desses países do BRICS. Então você tem pacotes especiais, você tem uma gama de possibilidades de aumentar o turismo”, afirma.
Questionado sobre como a população de Cuba vem conseguindo resistir a seis décadas de embargo que estrangulam a economia do país, Pedreschi afirma ser por meio de “consciência política, principalmente”.

“O povo cubano é muito consciente; ele sofre duramente, é castigado, mas eles têm cultura política para entender, de um modo geral, que estão sendo sufocados. É um país que não tem soberania econômica, ele é isolado, qualquer empresa do mundo que negociar com Cuba vai sofrer um processo nos EUA. Então, ainda que o povo esteja cansado de tantos anos de sofrimento econômico — não é fácil viver assim, obviamente —, eles têm consciência de quem é o inimigo, quem está fazendo isso com eles.”

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Nesse contexto, ele afirma que o povo cubano “não tem outra opção senão resistir”, pois a outra seria “entregar o país para os EUA”, que atuariam para fazer dele “um outro Porto Rico”.
“Então o povo resiste porque tem que resistir e dribla como vem driblando desde 1960, quando começaram as sanções. […] E agora, mais uma vez, com o BRICS é mais uma chance da nação e do povo resistir”, afirma.
José Niemeyer, professor de relações internacionais do Ibmec, afirma que a eventual entrada de Cuba indica que o BRICS está sendo reformulado como um grupo econômico.

“Eu não considero um bloco de integração regional porque muitos países não têm um link geográfico. […] Eu não considero um bloco de integração regional, como é o Mercosul, como é o NAFTA, e como é a União Europeia […]. É um bloco de representação econômica, mas cada vez mais eu tenho visto o BRICS como uma intenção de países do Oriente, principalmente Rússia e China, de criar um contraponto ao bloco ocidental, principalmente aquele bloco ocidental que é formado na perspectiva militar pela OTAN [Organização do Tratado do Atlântico Norte].”

Na avaliação de Niemeyer, a adesão de Cuba ao BRICS tem um caráter mais político-ideológico, por ser um país que “sempre desafiou Washington”, e as duas principais potências do grupo, Rússia e China, veem nele um novo centro “para se contrapor ao mundo ocidental”.
Já sobre a possibilidade de o Brasil sofrer algum tipo de sanção por ter apoiado a adesão de Cuba ao BRICS, Niemeyer enfatiza que o Itamaraty e os governos que se sucedem no Brasil terão de saber ficar bem nesse meio-termo, dentro da política internacional, nos dois blocos que se desenham no mundo.
“O Brasil está nesse meio-termo dessa disputa que eu tenho visualizado entre o Ocidente e o Oriente. Não é uma nova Guerra Fria, […] mas você vê hoje decididamente dois blocos de países, países como EUA e União Europeia e países como China e Rússia, e o Brasil tem que saber se equilibrar no meio disso.”
Ele lembra que o Brasil é uma potência verde, um grande produtor de alimentos e energia, que tem “um papel muito relevante neste mundo de conflito”. Por isso é importante para o Brasil ficar entre esses dois polos, preservando os interesses que cultiva com os EUA e também com a China.

“Se você me perguntar, do ponto de vista estratégico militar, ‘O Brasil está mais próximo dos EUA do que da China?’, está mais próximo dos EUA. Mas, do ponto de vista comercial, a China é tão importante quanto os EUA hoje para a balança comercial brasileira”, afirma o especialista.

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