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sexta-feira, 29 março, 2024

Fidel, bolivariano e martiano (parte 2)

Multidão recebe Fidel Castro nas ruas de Nova York em 1959
Ángel Guerra Cabrera
Louverture, obscurecido e diminuído em sua grandeza pela cultura hegemônica, que nos oferece a Bolívar como um sonhador cujas ideias são muito formosas, mas inalcançáveis. Fidel, a quem já quase ninguém se atreve a negar-lhe um lugar na história, com maiúscula, mas a mesma esquerda, que o reconhece explicitamente como o grande estrategista da Revolução Cubana, com frequência não se dá conta do óbvio: sua condição de teórico relevante da Revolução – e da reforma social – nos países da América Latina e do Terceiro Mundo.
Menciono revolução e reforma, deliberadamente, porque no pensamento de Martí – de quem me surpreende que Bosch não o inclua em sua seleta galeria de gênios políticos – e no de Fidel, a reforma pode conduzir à revolução mais radical em seu momento, mediante a solução de tarefas anticoloniais relativas à independência, à soberania e à libertação nacional, imprescindíveis em nossa região e em muitos países da África e da Ásia, sem que forçosamente seja preciso defende de entrada o assalto ao céu.
O fato de que Cuba atravessara sem solução de continuidade de impelir aquelas tarefas ao socialismo, não significa que em todos os casos deva ser assim. Não devemos perder nunca de vista o objetivo socialista, mas tampouco desperdiçar toda possibilidade de avançar rumo à libertação nacional e à descolonização.
Fidel, para somente colocar outro exemplo transcendental e muito vigente, aportou à teoria revolucionária universal, como expõe ao fazer a definição de povo no livro A História me Absolverá (1953), logo complementada na Segunda Declaração de Havana (1962), a concepção de um sujeito muito amplo da revolução ou da mudança social, que reconhece as condições revolucionárias dos destacamentos operários minoritários da América Latina e do Caribe, mas ao mesmo tempo dá um papel fundamental às lutas dos indígenas, dos negros e dos camponeses. Reconhece um papel orientador aos intelectuais revolucionários.
Não é somente o proletariado, como conceberam Marx e Engels na Europa do século 19; se estende a todas e todos os explorados e excluídos – incluindo aos desempregados e, de modo enfático, às mulheres – assim como aos militares patriotas, a setores das classes médias, que por razões patrióticas e morais podem se tornar sujeitos transformadores, em um região onde a exploração capitalista não pode ser liquidada sem suprimir quase simultaneamente, ou sucessivamente, o humilhante jugo imperialista. Na História… é onde pela primeira vez o líder da revolução cubana argumenta por que Martí é o autor intelectual do ataque ao quartel Moncada.
Anos depois do vaticínio sobre Fidel escrito por Juan Bosch, outro grande latino-americano, Hugo Chávez, autêntico Bolívar redivivo, cuja mesma trajetória, junto a outros importantes acontecimentos na nossa América, estavam contribuindo já de modo superlativo para demonstrar a certeza dos ancestrais vaticínios do guia da revolução cubana, recordaria: “Fidel dizia – no fim dos anos 1980 – que uma nova onda revolucionária, de mudanças, uma nova onda de povos, se desataria no continente quando parecia – como alguns inconsequentes assinalavam – que havíamos chegado ao fim da história, que a história estava petrificada e que não havia mais caminhos nem alternativas…
A alguns meses do desaparecimento do autor dessas palavras, Fidel diria, em uma frase para entrar na História: “Hoje guardo uma recordação especial do melhor amigo que tive em meus anos de político ativo – que muito humilde e pobre foi forjado no Exército Bolivariano de Venezuela –, Hugo Chávez Frías”.
Fidel e Chávez multiplicaram, mediante programas sociais incomuns as energias revolucionárias e os recursos humanos e materiais de seus dois povos e do grande movimento de massas contra o neoliberalismo gestado na nossa América então, que ainda não amainou. Mas, disso, falarei no próximo e último texto.
Fonte: La Jornada

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