Wagner França
A América Latina, secularmente refém de ciclos de exploração, enfrenta em 2025 um divisor de águas: a ruptura com o sistema financeiro especulativo, herança do imperialismo estadunidense. Desde o século XX, o dólar e instituições como FMI e Banco Mundial aprisionaram economias locais a ajustes estruturais, endividamento crônico e dependência cambial. Hoje, com o BRICS ampliado e 35% do comércio regional já realizado em moedas locais, a região ensaia uma emancipação histórica.
A armadilha do dólar persegue a região: em 2023, 78% das reservas latino-americanas estavam em dólares, expondo países à volatilidade do Fed. Em 2025, porém, mecanismos como o Sistema de Pagamentos em Moeda Local (SML), que movimentou US$ 12 bilhões entre Brasil e Argentina no último ano, e a proposta de uma moeda comum no Mercosul reduziram essa dependência para 62%. A lição é clara: cada 10% de redução no uso do dólar em transações regionais gera um incremento de 2,5% no PIB local, segundo o Banco do Sul.
O avanço do BRICS é estratégico. O bloco, responsável por 43% do PIB global em 2025, financia projetos de infraestrutura na América Latina via Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), que destinou US$ 28 bilhões à região desde 2022 — cifra que supera os empréstimos do FMI no período. A China, hoje principal parceira comercial do Brasil (US$ 180 bilhões em 2025) e do Chile, lidera a transição para um comércio multipolar: 40% das trocas sino-latino-americanas já usam yuan ou moedas locais.
Contudo, apesar do avanço, o Brasil, mesmo na presidência do BRICS, mantém laços estreitos com os interesses norte-americanos. O governo hesita em dar passos mais ousados para reduzir sua dependência do dólar e das instituições financeiras tradicionais, temendo represálias econômicas e políticas. A recente taxação de 25% sobre aço e alumínio pelos EUA é um lembrete claro de que qualquer tentativa de autonomia será respondida com agressividade. A resposta brasileira, no entanto, tem sido tímida: enquanto outros países do BRICS ampliam acordos comerciais alternativos, o Brasil mantém sua posição ambígua, oscilando entre a diplomacia sul-sul e a submissão histórica ao Norte Global.
A lição de Cuba e Venezuela permanece como advertência: os custos da independência econômica são altos, e qualquer país que tente se desvencilhar do sistema financeiro imperialista enfrentará sanções, bloqueios e ataques especulativos. No entanto, a América Latina não pode mais se dar ao luxo de postergar sua soberania. O fortalecimento do BRICS e o aumento do comércio em moedas locais são avanços, mas a hesitação do Brasil em assumir uma ruptura mais profunda com o imperialismo evidencia os desafios ainda existentes.
Ofuturo da multipolaridade passa pela decisão dos governos da região de ousarem mais. O Brasil, pela sua posição estratégica e peso econômico, poderia liderar esse processo, mas sua postura moderada impede avanços mais significativos. Resta saber se, nos próximos anos, a América Latina dará o passo definitivo rumo à emancipação ou se permanecerá refém da velha ordem financeira que há séculos dita os rumos do continente.