Sacha Llorenti, representante boliviano no Conselho de Segurança da ONU
Embora alguns aliados dos Estados Unidos tenham apoiado o ataque unilateral contra uma base aérea na Síria, personalidades políticas e organizações sociais qualificaram nesta sexta-feira (7) a agressão como um fato grave de violação da lei internacional e ameaça para a paz no planeta.
Várias figuras proeminentes na América Latina não tiveram dúvidas para condenar o lançamento de 59 mísseis Tomahawk na madrugada da sexta-feira contra o aeródromo de Shayrat, na província síria de Homs, que resultou em uma dezena de mortos, inclusive quatro crianças.
O ex-presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva classificou o ataque como uma irresponsabilidade e destacou que “o mundo não precisa de governantes arrogantes”, em alusão a Donald Trump.
“O mundo não precisa de bombardeios, mas de paz; de dirigentes que conversem, que dialoguem”, declarou Lula à emissora de rádio O Povo/CBN, da cidade de Fortaleza. Ele lembrou também que a agressão ao Iraque se produziu com uma mentira, já que os estadunidenses alegavam que Saddam Hussein tinha armas de destruição em massa e que, até hoje, elas não foram encontradas.
O presidente da Bolívia, Evo Morales, considerou que Washington usou a desculpa das armas químicas na Síria para uma intervenção armada, conquanto organismos da ONU certificaram que esta nação se despojou de todo este tipo de material em 2013.
Os problemas internos dos países resolvem-se com diálogo, não com bombardeios, escreveu o presidente em sua conta de Twitter @evoespueblo, enquanto advertiu que a ação viola os princípios da Carta das Nações Unidas e ameaça a segurança e a paz mundial.
O representante permanente da Bolívia perante a ONU, Sacha Llorenti, ressaltou por sua vez que, ao longo dos últimos 50 anos, a humanidade estabeleceu diversos instrumentos de direito internacional para evitar “gravíssimas brechas das leis internacionais”, mas que agora os Estados Unidos “se converteram no vigia, no juiz, no verdugo”, sentenciou.
Llorenti recordou que na sala onde se realizam as reuniões do Conselho de Segurança foram discutidas as famigeradas armas de destruição em massa que o Iraque teoricamente possuiria. O então secretário de Defesa dos EUA, Colin Powell, foi até o CS para afirmar peremptoriamente que as tais armas existiam, para justificar a invasão e posterior ocupação do Iraque. Essas armas jamais foram encontradas e, em resultado da agressão estadunidense, cerca de um milhão de iraquianos foram mortos nos anos seguintes.
Assista a intervenção de Sacha Llorenti:
Também organizações sociais e partidos de esquerda bolivianos convocaram hoje uma manifestação em frente à embaixada de Estados Unidos em La Paz como parte de um Plantão de Solidariedade para condenar o bombardeio.
Por sua vez, o chanceler da Costa Rica, Manuel González, lamentou qualquer ato de uso da força. “Somos um país de paz, um país que defende também o desarmamento, o fizemos, é nossa tradição. Não é uma posição recente”, assegurou González à imprensa.
Também o Conselho Mundial da Paz (WPC, por suas siglas em inglês) considerou o lançamento de mísseis contra alvos sírios como um ato de maior escalada da intervenção imperialista nesse país.
Em uma declaração publicada em seu site, o WPC afirmou que o bombardeio não só constitui uma violação dos princípios da Carta das Nações Unidas, mas também a continuação das políticas dos anteriores governos estadunidenses, agora pela administração de Donald Trump.
Adverte o texto que por trás destes ataques estão os planos para o estabelecimento de um Grande Oriente Médio com o controle dos recursos energéticos e oleodutos, com regimes dispostos e novas fronteiras.
O presidente russo, Vladimir Putin, qualificou o fato de uma agressão a um estado soberano, e o ministério das Relações Exteriores de seu país chamou a uma sessão urgente do Conselho de Segurança. O Ministério de Defesa anunciou a suspensão de um memorando de cooperação com Estados Unidos.
O premiê Dmitri Medvedev considerou a ordem do presidente estadunidense como uma demonstração de falta de independência e de grande subordinação às opiniões do establishment de Washington, criticado pelo próprio Trump em seu discurso de tomada de posse, em janeiro passado.
Por meio do porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Bahram Qassemi, e o assessor do presidente do Majlis (Parlamento) para assuntos internacionais Hossein Amir-Abdollahian, o Irã considerou perigosa, destrutiva e violatória dos princípios fundamentais do direito internacional a agressão à Síria, ao mesmo tempo em que advertiu do detrimento que supõe para a segurança em Meio Oriente.
Ao mesmo tempo, o Egito reafirmou a importância de preservar a Síria e o Oriente Médio dos perigos de uma escalada bélica, com o fim de manter a segurança regional, com o qual exortou Estados Unidos e Rússia a negociarem uma resolução completa e definitiva da crise.
Em um comentário intitulado “O presidente de Call of Duty”, o diretor da Agenzia Giornalística Itália (AGI), Riccardo Lua, considerou que Trump não esperou saber de quem era realmente a responsabilidade do massacre na Síria, depois do emprego de armas químicas.
Comparou a atuação do governante com a de um personagem do conhecido videogame Call of Duty, no qual se disparara em tudo o que aparece na tela, porque se trata de inimigos e no aplicativo dessa lógica, se não disparar você morre e se o fizer, vence.
Até a candidata presidencial francesa, de extrema-direita, Marine Le Pen, questionou se era muito pedir que se esperasse pelos resultados de uma investigação internacional independente antes de efetuar este tipo de ataques.
Só governos como os de Israel, Arábia Saudita, Reino Unido, Alemanha, França, Espanha, Japão e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) aplaudiram a ação unilateral de Washington.
Outros como o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, desmarcaram seu compromisso pelo diálogo de paz no país do Levante, ao assegurar que a ação dos Estados Unidos foi positiva mas insuficiente e se comprometer a participar em futuras ações similares.
O chefe da Casa Branca tratou de justificar sua decisão ao considerá-la uma “resposta proporcional” ao recente ataque com armas químicas em uma localidade síria e cuja autoria tenta atribuir-se sem provas ao governo do presidente Bashar al-Assad.
Um comunicado da Presidência síria afirmou que a arremetida estadunidense contra uma de suas bases aéreas é um ato “irresponsável e imprudente” que revela “cegueira política e militar”. “Esta agressão eleva a determinação da Síria para golpear aos terroristas fortemente e aumentar o ritmo das ofensivas nessa direção e onde quer que se encontrem”, destacou Damasco.