© AFP 2021 / MARIA EUGENIA CERUTTI
Sputnik – No contexto de a Argentina ter assumido a presidência rotativa da CELAC, a Sputnik Brasil conversou com uma especialista sobre possível aproximação entre a organização e a China e sobre o que perde o Brasil com sua saída da CELAC.
A partir de 7 de janeiro, a Argentina exerce a presidência rotativa da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC) e está pronta para implementar o Plano de Ação Conjunto China-CELAC, fechado nos últimos dias de 2021 ainda sob comando do México.
Em vista disso, a Sputnik ouviu Daniela Alves, estrategista em políticas públicas e relações internacionais e diretora do Centro de Estratégia, Inteligência e Relações Internacionais, que compartilhou sua visão sobre o futuro desse acordo para a região e também sobre as consequências para o Estado brasileiro com sua retirada da comunidade.
Relevância atual da CELAC
A CELAC, bloco regional intergovernamental que inclui 33 países, foi criado em fevereiro de 2010 por iniciativa de Hugo Chávez na chamada Cúpula da Unidade da América Latina e do Caribe. O objetivo da organização era, relembra a especialista, promover a cooperação para o desenvolvimento em diversos setores e diálogo político e econômico entre os países da região.
A expansão do comércio exterior em si não é o foco da organização, mas obviamente as oportunidades para tal são sempre abertas no quadro de acordos que busquem estimular o comércio além da região.
Mais do que isso, aponta Daniela Alves, essa organização foi criada como uma alternativa para a Organização dos Estados Americanos (OEA), sob o argumento de que a OEA “é excessivamente submissa aos interesses dos EUA”.
“Só que essa perspectiva, na minha opinião, se mostra fraca e fora das reais possibilidades”, acredita ela, acrescentando que esse organismo, como várias outras organizações latino-americanas, tem uma relevância limitada muitas vezes questionada.
Perspectivas da cooperação China-CELAC
Em dezembro de 2021, o ministro das Relações Exteriores da China, Wang Yi, apresentou algumas propostas de cooperação entre a China e a CELAC na terceira reunião de ministros do Fórum China-CELAC. Durante a reunião, ele ressaltou as oportunidades do desenvolvimento verde, fortalecimento da cooperação em economia digital, comércio eletrônico, veículos elétricos, inteligência artificial e vários outros temas.
Para entender melhor o funcionamento das relações entre o gigante asiático e a CELAC, vale lembrar que esse fórum foi criado pela própria China e por proposta apresentada por Cuba e aprovada pelos membros da entidade.
“Então, para China essa é uma excelente estratégia e muito interessante para se fortalecer na região sem a interferência dos Estados Unidos, já que esse país não faz parte da organização.”
Questão do 5G na jogada
Com o interesse chinês em se fortalecer cada vez mais na América Latina investindo capital e fornecendo financiamento, o Fórum China-CELAC funciona como mecanismo para canalizar as relações com vários países de uma mesma organização.
A questão do 5G consta no Plano de Ação Conjunto China-CELAC para cooperação em áreas-chave nos anos de 2022 até 2024. Conforme explica a estrategista, o mecanismo deve possibilitar a expansão da empresa Huawei e a sua rede 5G na América Latina, através do fortalecimento da cooperação entre os governos, empresas e instituições de pesquisa em infraestrutura digital.
Brasil fora do jogo?
No ano de 2020, o Brasil se desvinculou da organização, fortalecendo seu posicionamento, relembra a especialista, “contra os regimes antidemocráticos, como os de Cuba, Venezuela, Nicarágua” e acabou deixando a CELAC, uma vez que ela estava sendo considerada complacente com as violações nesses países”.
Líderes da CELAC posam para foto de grupo no quintal do Palácio Nacional na Cidade do México, 18 de setembro de 2021
© AP Photo / Presidência do México
“Por mais que a organização, ao meu ver, não apresente tantos resultados concretos, eu acredito que os espaços democráticos existentes nunca devem ser deixados sem representação.”
O problema com a saída brasileira da CELAC é que com tais passos “o Brasil perde, cada vez mais, o protagonismo como liderança regional”, na opinião de Daniela Alves.
Uma vez que o Brasil se retira dessas organizações existentes, “ele deixa o vácuo de poder que acaba sendo obviamente ocupado por outros países”, afirma a estrategista. Por isso, ela defende que o Brasil faça parte das organizações multilaterais existentes, colocando seu posicionamento e defendendo seus valores e interesses, como está se posicionado como uma liderança na América Latina, concluiu a analista.