Por Mariela Pérez Valenzuela
Correspondente-chefe na República Dominicana
As danças folclóricas, que os especialistas consideram rituais para ocasiões especiais, persistem nas celebrações familiares em algumas regiões do país.
Segundo especialistas, a diferença entre dança e dança é que nesta última há uma trama percebida nos passos e rostos dos executantes.
O que os une é que, sem exceção, eles constituem uma rede de diferentes culturas trazidas para a República Dominicana (antigamente chamada Hispaniola) pelos colonizadores europeus, que se misturaram com as africanas.
Ou seja, espanhóis, franceses, ingleses e outros europeus chegaram acompanhados de seus escravos africanos. Os negros trouxeram sua cultura, especialmente a música, com seus instrumentos, cantos e danças, acorrentados.
Os taínos e outros povos indígenas que habitavam esta ilha também tinham danças rituais com as quais celebravam a vida e a natureza, apontam especialistas locais.
Entretanto, depois que os europeus invadiram as novas terras que alegavam ter descoberto para suas coroas, os habitantes nativos foram exterminados e pouco dessa expressão cultural permaneceu.
O certo é que, desde suas raízes indígenas, passando pela colonização europeia e pela influência africana, cada elemento contribuiu para a criação de um panorama único de expressão artística no campo musical.
A CARABINA
Existem vários ritmos do folclore dominicano transmitidos de geração em geração e ainda presentes em diferentes regiões. Entre eles está o carabiné, uma contribuição dos franceses que habitavam a parte ocidental da ilha.
Historiadores afirmam que os soldados das colônias francesas — no atual Haiti — aliviavam o estresse carregando seus rifles nos ombros, daí o nome. Os soldados franceses chegaram ao país em 1781.
Era realizada em plantações durante a época da escravidão e permaneceu como uma forma de expressão cultural durante e depois do período colonial.
Geralmente acompanhado por tambores cotidianos (como o tambour bèlè) e maracas, o carabiné é uma forma de resistência cultural e uma celebração da identidade afro-caribenha.
Hoje, ele é destaque em festivais folclóricos e eventos culturais, permanecendo vivo como parte do patrimônio imaterial da região.
A mais conhecida é a carabiné de salon, com música criada para a dança por Luis Alberti. Foi uma das danças que fizeram parte do repertório da elite no século XIX na República Dominicana, especialmente durante a ocupação haitiana (1822-1844) e anos subsequentes.
É uma dança de casal, com passos e giros marcados, que pode ter uma estrutura semelhante às danças de salão.
Na região sul dominicana, o carabiné ainda é dançado. É acompanhado por uma coreografia circular, onde os casais sempre dão as mãos e, enquanto os homens se movem, as mulheres os seguem. Atualmente, é praticado em territórios insulares como San Juan de la Maguana, Azua, Ocoa e Elías Piña.
A MANGULINA
Também nativa da região sul, a mangulina é especialmente popular durante as festas dos santos padroeiros. É dançada imediatamente após o carabiné, como parte de uma sequência de apresentações folclóricas, daí o seu nome “cola”, e representa a fusão cultural do país.
Utiliza os mesmos instrumentos do carabiné em seu ritmo: tambora, güira, acordeão e priprí ou maracas.
Distingue-se por sua natureza mais ágil e viva; o casal não se toca; o homem “corteja” a mulher com passos e reverências, e ela responde com movimentos de quadril graciosos, porém moderados.
Rafael Solano, embora mais conhecido por seu trabalho romântico, desempenhou um papel importante na recuperação e disseminação da dança mangulina em nível popular nas décadas de 1960 e 1970, dando-lhe um novo impulso e reconhecimento dentro da herança cultural dominicana.
Solano foi um dos primeiros músicos locais a resgatar, estudar e reinterpretar o carabiné.
ÍNDIOS SELVAGENS
Os índios selvagens chegaram das ilhas inglesas do Caribe. Negros africanos livres, que tinham ofícios e sabiam ler e escrever, mudaram-se de suas antigas casas para trabalhar na ilha então chamada Hispaniola, onde a indústria açucareira floresceu, no final do século XIX e início do século XX.
É chamado de Índios Selvagens porque é um costume que homenageia a solidariedade entre os povos indígenas e afrodescendentes durante a escravidão.
Os afro-americanos começaram a se vestir como “índios” como um sinal de reconhecimento cultural e resistência, usando trajes de penas e cores brilhantes enquanto cantavam e se movimentavam ao som de músicas tradicionais como parte de um desfile de rua.
Como resultado da fusão das culturas inglesa, caribenha e africana, surgiram o momise (teatro de dança), os guloyas (grupos de dançarinos de rua e atores), os andarilhos (parte do carnaval) e o boi (personagem tradicional).
A chamada dança guloyas teve origem na comunidade Cocola de San Pedro de Macorís e combina dança, teatro e música.
Foi trazido para a República Dominicana por imigrantes afro-caribenhos de língua inglesa — conhecidos como Cocolos — de ilhas como São Cristóvão e Névis, Antígua, Montserrat e outras partes do Caribe Oriental Britânico, que entraram no território entre os séculos XIX e XX para trabalhar nas usinas de açúcar.
O grupo chamado “Teatro Cocolo Danzante” foi declarado Patrimônio Oral e Imaterial da Humanidade pela UNESCO em 2005. Eles usam instrumentos de percussão como caixa, tambor (essencial para música folclórica, religiosa, popular e festiva), flauta e triângulo (barra de metal curvada).
O chamado “teatro dançante” sai às ruas nos dias 29 de junho (dia de São Pedro e São Paulo, dois santos católicos padroeiros de diversas comunidades), 25 de dezembro e 1º de janeiro, além de carnavais regionais.
OUTRAS DANÇAS DOMINICANAS
Outro é o priprí ou perico ripiao, nascido no século passado, intimamente ligado ao instrumento de sopro de mesmo nome, típico da região de Cibao e áreas rurais.
Muito amado pelos fazendeiros, o ritmo é mais acelerado e a música é contagiante, vinda de uma orquestra de güira, flautas, tambores e acordeão, entre outros instrumentos.
Especialistas estão convencidos de que o pripri é o avô do merengue, que usava os mesmos instrumentos na década de 1930.
Algumas de origem europeia perderam popularidade, como a polca e a mazurca, enquanto as cintas, a tumba e o machacó têm adeptos em Sabana Larga e Elías Piña.
Em Samaná, em particular, as pessoas apreciam o bambulá (uma dança de origem africana) e o brinco (afro-dominicano, associado a práticas rituais).
MAIS RITMOS E DANÇAS
Palos é um gênero musical e também um tipo de cerimônia religiosa popular praticada no Sul, no Leste e em alguns lugares do Norte, e responde a motivos mágico-religiosos.
Geralmente é tocado com pares soltos de mãos dadas. A música é tocada por três palos (um palo principal e dois palos menores), acompanhados por uma güira.
Já a dança do Congo remonta ao século XVII. Em 2021, a UNESCO a reconheceu como Patrimônio Oral e Imaterial da Humanidade.
É apreciado em Villa Mella, Mata los Indios, La Victoria (norte de Santo Domingo), Los Mina, Mendoza e Mandinga (leste de Santo Domingo). Geralmente é realizado durante a Festa do Espírito Santo, celebrada sete semanas após a Páscoa; também em homenagem à Virgem do Rosário (7 de outubro) e nos ritos fúnebres dos membros da Irmandade. Sua coreografia é gratuita.
Seus instrumentos são o congo ou baqueta, o conguito, as maracas e a canoita, que toca a tecla e define o ritmo. Suas canções contêm 25 palavras, o mesmo número das canções de origem africana.
O Bani sarandunga remonta à década de 1870. É uma expressão cultural transmitida de geração em geração, combinando elementos africanos e espanhóis, e é um símbolo de identidade cultural.
Durante o período colonial, escravos negros fugitivos (chamados cimarrones) tocavam essa música com três tambores rituais e uma güira.
Constitui uma tradição musical, dançante e ritual profundamente ligada à celebração religiosa em honra de São João Batista, no dia 24 de junho.
Outras danças incluem a dança das flores, uma dança ritual e simbólica relacionada ao ciclo da vida, natureza e fertilidade, e a dança gaga do Haiti.
Gaga é ao mesmo tempo música, dança, ritual e celebração popular, com raízes profundas no vodu haitiano, na espiritualidade africana e no sincretismo religioso caribenho, e ainda é apreciada em lugares onde há fábricas de açúcar.
Suas canções são em crioulo e espanhol, e seus principais instrumentos são o tambú ou vara maior, o catalié ou vara menor, os fututos, as cornetas ou caracol e a maraca.
Os dominicanos são conhecidos por serem bons dançarinos. Eles têm ritmos e danças para escolher, o que lhes permite movimentar o corpo e seguir tradições que, neste país, e especialmente nas áreas rurais, são seguidas e protegidas pela população.