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quinta-feira, 18 abril, 2024

Suprema Corte de El Salvador considera inconstitucional Lei de Anistia

IHU – Unisinos
Adital

Em uma decisão tomada no dia 13-07-2016, a Suprema Corte de Justiça de El Salvador declarou inconstitucional a lei de anistia decretada no país após o fim de sua guerra civil (1979-1992). O veredito abre caminho para a responsabilização dos envolvidos em violações dos direitos humanos cometidas durante o conflito.

Por João Flores da Cunha / IHU – Com agências

A corte se baseou em convenções e tratados internacionais e na Constituição do país para julgar inconstitucionais dois dos artigos da Lei de Anistia Geral para a Consolidação da Paz de 1993. De acordo com os magistrados, “a extensão da anistia é contrária ao direito de acesso à justiça, à tutela judicial ou proteção dos direitos fundamentais, e ao direito à reparação integral das vítimas dos crimes de lesa-humanidade e crimes de guerra constitutivos de graves violações ao Direito Internacional Humanitário – DIH”.

A lei de anistia geral

A decisão atendeu a um pedido de órgãos locais de direitos humanos que questionava a lei de anistia de 1993, a qual foi decretada pelas autoridades do país cinco dias após a divulgação do relatório da comissão da verdade que investigou os crimes cometidos durante a guerra civil. A corte assinalou que a anistia para todos os crimes contraria os acordos de paz que encerraram o conflito, nos quais se estabeleceu garantias de justiça para as violações de direitos humanos.

Os magistrados entenderam que crimes de lesa-humanidade são imprescritíveis de acordo com o direito internacional, e não podem ser objeto de anistia. Segundo a Suprema Corte, a vigência da lei impede que o Estado cumpra com suas obrigações de investigar, julgar e reparar as violações de direitos fundamentais que significaram os crimes da época.

A guerra civil em El Salvador

O conflito de 12 anos, marcado pela violência extrema, matou 75.000 pessoas em um país cuja população, hoje, é de 6,5 milhões. A guerra civil opôs o governo militar apoiado pelos Estados Unidos e guerrilhas de esquerda. Essas se agruparam em uma organização chamada Frente Farabundo Martí para a Libertação Nacional – FMLN. Hoje convertida em partido político, a FMLN governa o país. O atual presidente, Salvador Sánchez Cerén, é um ex-guerrilheiro.

Na decisão, a Suprema Corte enfatizou o caráter sistemático dos crimes por parte tanto das forças armadas oficiais quanto das rebeldes. El Salvador sofre com altos índices de criminalidade até hoje, sendo um dos países mais violentos do mundo.

Em referência à decisão da Suprema Corte, a diretora para as Américas da Anistia Internacional, Erika Guevara-Rosas, declarou que “hoje é um dia histórico para os direitos humanos em El Salvador. Ao dar as costas a uma lei que não fez mais do que deixar que criminosos escapassem da justiça após cometer graves violações aos direitos humanos, o país está finalmente enfrentando seu trágico passado”.

O massacre de Ignacio Ellacuría e companheiros

A expectativa agora é que, com a aprovação da lei, possam ser julgadas pessoas que cometeram crimes de guerra e contra a humanidade. O único julgamento que avançou é o do massacre de seis padres jesuítas, além de uma doméstica e de sua filha, ocorrido na Universidade Centro-Americana – UCA em novembro de 1989. Militares envolvidos no crime foram presos por conta de um processo judicial na Espanha, país que conta com uma lei de jurisdição universal. Foram assassinados os religiosos Pe. Ignacio Ellacuría, Pe. Ignacio Martín-Baró, Pe. Segundo Montes, Pe. Amando López, Pe. Juan Ramón Moreno, Pe. Joaquín López y López, Julia Elba Ramos e Celina Meredith Ramos, estas últimas mãe e filha.

O crime é considerado um ponto de virada no conflito. A partir dele, aumentou a pressão internacional para que as partes dialogassem e entrassem em um acordo para encerrar a guerra civil.

Anistia na América Latina

Os conflitos armados e os regimes ditatoriais que se espalharam pela América Latina na segunda metade do século XX deixaram marcas no continente – entre elas, a dificuldade de conduzir à Justiça os responsáveis pelos crimes. Cada país lidou com a situação de uma maneira particular.

No Brasil, a lei de anistia de 1979 impede que os envolvidos em crimes cometidos durante a ditadura sejam responsabilizados criminalmente. Até hoje, nenhum militar foi condenado no país por violações de direitos que se sucederam ao golpe de 1964. Em 2010, o Supremo Tribunal Federal – STF rejeitou um pedido da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB para revisar a lei de anistia.

Por outro lado, na Argentina, os presidentes militares foram levados à Justiça. Jorge Rafael Videla, o comandante do Exército à época do golpe de 1976, morreu na prisão, em 2013, aos 87 anos.

Instituto Humanitas Unisinos

 

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