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sexta-feira, 19 abril, 2024

O “green new deal” é viável sem as energias fósseis?

Energias Potencialmente Renováveis Dependem das Fósseis

 

felipe3 Brasil deve optar pelo uso do seu petróleo e agregar valor a ele

As energias potencialmente renováveis dependem das fontes primárias de energia de origem fóssil – carvão, petróleo e gás natural – para serem produzidas, distribuídas, mantidas e complementadas para que o abastecimento energético seja confiável. Não deveria haver surpresa, praticamente tudo neste mundo depende das energias fósseis.

Fontes primárias de energia

São fontes primárias originadas pela energia solar: as energias de origem fóssil, hidráulica, da biomassa, eólica e solar fotovoltaica.

A energia geotérmica é derivada do calor do interior da Terra.

As energias das ondas e das marés são resultado da incidência dos ventos sobre o mar e pelas forças da gravidade que atuam sobre nosso planeta.

A energia nuclear é gerada a partir da matéria de elementos químicos com características especiais.

Transições energéticas

Na História da Humanidade, em termos absolutos nós não substituímos uma fonte primária por outra, nós acumulamos seus usos. O sentido da chamada transição energética se aplica a mudança da importância relativa entre as diferentes fontes primárias.

Consumimos cada vez mais energia, desde a energia dos nossos músculos, dos animais, da lenha e de outras biomassas, dos ventos, hidráulica, a energia do carvão, do petróleo, nuclear, do gás natural e solar (térmica e fotovoltaica).

A participação relativa das energias de origem fóssil na matriz energética mundial se mantém acima dos 85% há muitas décadas.

Fig1

O carvão foi a principal fonte energética da Revolução Industrial no século 18 e ainda hoje representa quase 28% da matriz energética mundial.

Depois de mais de 200 anos desde a Revolução Industrial, foi também o carvão que impulsionou o crescimento chinês no século 21.

Fig2

Fig3

Possíveis restrições ao consumo do carvão é declaração de guerra contra a China e a receita para a depressão econômica global com elevação do custo da energia e a redução do potencial da economia mais dinâmica do mundo.

Qualidade das fontes de energia primária

O conceito da qualidade da energia diz respeito a sua capacidade de realização de trabalho, sendo proporcional a sua concentração ou densidade energética, facilidade e flexibilidade para mobilidade e uso.

Quando se consome mais energia primária de melhor qualidade é mais fácil promover o crescimento da economia, aumentar a produtividade do trabalho e alcançar melhores padrões de vida.

Quando se aumenta a participação de energias com pior qualidade, mais caras de se produzir, menos capazes de realizar trabalho útil, intermitentes e menos confiáveis, ou de mais difíceis mobilidades e usos, os efeitos são inversos.

Um barril de petróleo (159 litros) tem energia equivalente a 4,5 anos de trabalho de uma pessoa. Esta equivalência revela sua elevada concentração de energia e qualidade intrínseca. Evidente que nem todo barril de petróleo é igual, em especial em função dos diferentes custos para serem encontrados e produzidos.

Consumo de energia e desenvolvimento

Quanto maior o consumo de energia per capita, maior o Produto Interno Bruto (PIB) por pessoa das nações.

 

Figura4

Quanto maior o consumo de energia per capita, maior o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) dos países.

Figura5

O consumo de energia está correlacionado, reforça e é reforçado, pelo desenvolvimento das nações.


Consumos por fonte de energia primária

A matriz energética mundial depende dos fósseis que representam 85% do total (Petróleo 34%, Carvão 27% e Gás Natural 24%). A energia nuclear representa 4,4% e as potencialmente renováveis 11% (Hidroelétrica 7%, Eólica e Solar 3%, outras 1%).

Origem das Fontes Primárias na Matriz Energética de 2018

Fósseis

Nuclear

Renováveis

Mundo

84,7%

4,4%

10,9%

Estados Unidos

84,3%

8,4%

7,3%

Austrália

92,3%

0,0%

7,7%

Alemanha

78,9%

5,3%

15,8%

França

51,1%

38,5%

10,4%

Japão

87,9%

2,4%

9,6%

Reino Unido

79,3%

7,7%

13,1%

Israel

98,2%

0,0%

1,8%

China

85,3%

2,0%

12,7%

Turquia

85,7%

0,0%

14,3%

Brasil

61,4%

1,2%

37,4%

Egito

95,9%

0,0%

4,1%

Índia

91,6%

1,1%

7,3%

Países ordenados do maior consumo de energia per capita ao menor

O Brasil tem a maior participação relativa das energias potencialmente renováveis entre os principais países do mundo, com 37% (Hidroelétrica 30%, Eólica e Solar 4%, outras 3%). Os fósseis representam 61% (Petróleo 46%, Carvão 5% e Gás Natural 10%) e a energia nuclear 1%.

Fig6

 

Fontes primárias potencialmente renováveis

Há diversos aspectos que limitam as energias potencialmente renováveis em cumprir papel histórico equivalente ao das energias de origem fóssil, em relação ao desenvolvimento econômico e social.

Os seus custos de produção são relativamente mais altos, considerando os custos externalizados pelos seus produtores, como o custo de distribuição, o custo do complemento de suprimento de energia confiável para compensar a intermitência, além das subvenções diretas e indiretas tais como os impostos relativamente mais baixos, os créditos de carbono e os subsídios de capital.

A intermitência na produção é típica das energias eólica e solar fotovoltaica. Os parques eólicos precisam de capacidade instalada maior, caso se pretenda garantir a demanda nos períodos de menor incidência dos ventos. Tanto eólica quanto a solar fotovoltaica precisam de complemento de fontes confiáveis, tais como os fósseis, nuclear ou a hidroelétrica, para garantir o suprimento mesmo com sua intermitência.

A Alemanha pôde alcançar 16% de renováveis em sua matriz energética porque se integrou com a França, exportando energia quando sua produção intermitente excede a demanda no país e importando energia confiável, de origem nuclear, quando a produção intermitente dos renováveis está abaixo da demanda alemã.

País (2018)

Fósseis

Nuclear

Renováveis

Alemanha

79%

5%

16%

França

51%

39%

10%

Nota-se que os 16% de renováveis alcançado pela Alemanha não é tão alto em relação aos principais países do mundo e está muito abaixo dos 37,4% da matriz energética brasileira.

A energia elétrica não serve para os mesmos fins que os combustíveis líquidos e o carvão. Os combustíveis líquidos de origem fóssil são fundamentais para o transporte de mercadorias e pessoas, navegação e aviação. As atividades industriais de mineração e siderurgia dependem das energias fósseis.

Não se produz painéis fotovoltaicos, baterias e turbinas eólicas a partir da energia elétrica. Mineração de metais raros, siderurgia e fusão de metais para produção de ligas dependem de energias muito concentradas e de altas temperaturas, ou seja, precisam de fontes primárias de energia com elevada qualidade.

Também a manutenção da rede de distribuição de energia elétrica, com a substituição de cabos de transmissão constituídos por elementos metálicos, depende das energias fósseis.

Existe diferença entre quantidade e qualidade das energias primárias. Por exemplo, as energias solar, eólica, das ondas e marés têm densidades energéticas muito baixas, relativamente baixa capacidade de realização de trabalho, elevado custo para suas obtenções, reduzidas facilidades, flexibilidades e confiabilidades aos seus usos, além de que limitadas temperaturas podem ser atingidas a partir de suas aplicações.

Conclusão

O eufemismo do “acordo climático” trata-se de uma, entre tantas Iniciativas globais, conduzidas a partir dos países centrais que podem assim instrumentalizar temas caros à boa parcela da opinião pública para viabilizar seus interesses geoestratégicos. Trata-se de “chutar a escada” do desenvolvimento dos países da periferia do sistema que consumiram e ainda consomem pouca energia, dispõem de recursos naturais, controlam as maiores petrolíferas do mundo que são estatais e têm grande potencial de desenvolvimento econômico e social, desde que aumentem seus consumos de energia com prioridade para as mais baratas de se produzir e mais eficientes possíveis.

As “mudanças climáticas”, assim como o combate ao terrorismo, ao tráfico de drogas e a corrupção, a defesa de liberdades individuais e da democracia liberal, também a pauta identitária e a dita “guerra entre civilizações” são temas populares que podem ser instrumentalizados para fins geoestratégicos, na disputa entre países imperialistas, ou entre países soberanos e o sistema financeiro internacional.

As crises cíclicas fazem parte do capitalismo, acontecem entre 7 e 11 anos desde o início do século passado. Suas funções são destruir o capital fictício, o capital produtivo menos eficiente e reduzir o custo do trabalho para recuperar a lucratividade perdida. Não há concertação global, cooperação internacional ou, muito menos, acordo climático capaz de evitar a ocorrência cíclica das crises no sistema capitalista.

A causa das crises no sistema capitalista não é o excesso da capacidade industrial, é a redução da lucratividade do capital. O excesso da capacidade é resultado da redução da lucratividade e dos investimentos, com os consequentes desempregos e redução da capacidade de compra dos assalariados, além da elevação do endividamento das famílias, empresas e dos Estados Nacionais.

Com o fim do petróleo adicional barato de se produzir, em termos agregados e mundiais, e com os limites da sociedade – pelo menos enquanto submetida a sistema econômico concentrador – em poder arcar com preços elevados da energia, não há disponibilidade de fontes primárias de energia com baixos custos de produção, confiáveis e de alta qualidade. A inteligência humana é capaz de transformar fontes primárias de energia em trabalho e bens úteis, mas não somos capazes de criar fontes primárias compatíveis com as melhores reservas já esgotadas dos recursos energéticos de origem fóssil.

O Brasil deve optar pelo uso do seu petróleo, agregar valor a ele e não permitir sua exportação em estado cru. Devemos investir no desenvolvimento das energias potencialmente renováveis, conhecendo seus limites e utilizando nossas vantagens naturais e inteligência para produzi-las aos menores custos possíveis.

Felipe Coutinho é engenheiro químico e presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET)

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