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quinta-feira, 28 março, 2024

França, migrantes, e a outra selva em Paris

Refugiados já foram retirados de Calais, mas se amontoam em estações do metrô parisiense
As organizações humanitárias calculam que se trata de duas mil pessoas amontoadas nas proximidades da Estação Stalingrado do metrô, no nordeste da cidade.
Embaixo da linha ferroviária exterior estão instaladas várias centenas de estrangeiros e o mesmo ocorre ao longo de várias quadras pelas avenidas próximas: ali permanecem em deterioradas tendas de campanha verdes, laranjas, azuis, amarelas… rodeadas de varais nos quais penduram roupas e cobertas.
“São muito tranquilos, não tem acontecido problemas de roubos, a única coisa que fazem é comer e dormir”, conta Hamid à Prensa Latina, um vendedor de uma loja de roupas situada justamente em frente à aglomeração.
“O problema é que nos ficamos sem trabalho, ninguém quer vir a esta área porque temem que os migrantes sejam perigosos”, lamentou mostrando a pouca circulação de clientes em seu local.
Efetivamente, a avenida está repleta de comércios, cafeterias e restaurantes, mas quase todos os lugares permanecem vazios e só aparecem alguns compradores e consumidores esporádicos.
O panorama é impactante ao observar aquela multidão de pessoas sem teto, sem um lugar para onde ir, com apenas uma mala na qual carregam o essencial para viver.
A maior parte deles dormem no chão, ainda que no interior de algumas tendas seja possível ver colchões velhos nos quais se deitam três ou quatro pessoas por falta de espaço, ou para enfrentar o frio, ou quiçá pelos dois.
Quase todos são homens, a maioria jovens, mas também há mulheres e até crianças pequenas.
Hamid, o da loja, também é imigrante, mas chegou há mais de 40 anos do Paquistão. Como quem se reconhece neles, olha os migrantes e comenta que o mais preocupante são as noites.
“Eu estou na loja com calefação e sinto frio, não sei como eles conseguem resistir, sobretudo pelas noites quando baixam bem mais as temperaturas. Oxalá que o governo os evacue e os leve a lugares seguros antes que chegue o inverno”, ressaltou.
O presidente francês François Hollande prometeu que desmantelarão a aglomeração porque, segundo suas declarações, em um país com uma antiga tradição solidária como a França, os campos de migrantes não são admissíveis.
Os estrangeiros que reúnam as condições para receber o exílio serão levados a centros de acolhimento, enquanto os demais receberão cartas com um prazo de 30 dias para abandonar o território nacional.
Não obstante, uma maioria vem de países em guerra como a Síria, Líbia ou Sudão, e por isso não será difícil justificar sua condição de refugiados.
Como passos iniciais para a futura evacuação, a polícia de Paris levou a cabo um controle administrativo para identificar os migrantes e ir conhecendo as circunstâncias dos diferentes casos.
Enquanto tais procedimentos avançam, as condições em que permanecem os estrangeiros são verdadeiramente duras: as autoridades colocaram alguns banheiros nos arredores, as associações humanitárias trabalham sem descanso para levar-lhes roupas e alimentos, mas os esforços são insuficientes.
“Nós lhes damos comida, tentamos ajudar como podemos, mas é difícil, são muitos, a cada dia são mais, e vários vizinhos se incomodam porque os problemas de higiene estão crescendo em toda a área”, afirmou à Prensa Latina uma moradora da região chamada Martine, que também colabora com as organizações de apoio.
Em apenas um curto percurso pelos arredores permite constatar tais preocupações: os dejetos inundam as ruas e calçadas, a cada três passos aparecem as latas de lixo transbordando, e os odores desagradáveis irrompem como sinal inequívoco da falta de higiene imperante.
Assim como explicam Hamid, Martine e outros vizinhos, o mais preocupante é que tal situação se repete uma e outra vez nos últimos tempos: quando a área começa a transbordar de migrantes vem a polícia e os evacua, mas pouco tempo depois chegam mais migrantes para se instalar, e então a história volta a se repetir.
*Correspondente da Prensa Latina na França

 

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