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quinta-feira, 28 março, 2024

As subvenções do Estado ao grande capital que despede trabalhadores

– O escândalo do Capitalismo Monopolista de Estado na hora da “construção europeia”

por Georges Gastaud [*]

Disse “liberalismo”?

Durante décadas, disseram-nos, do secundário à universidade, em quase todos os meios de comunicação, e em todos os tons, que vivemos numa sociedade “liberal” e que o “neoliberalismo” é nosso destino. Os que são politicamente um pouco mais críticos, mas que ainda assim se envolvem na ilusão ideológica, falarão, para condená-lo, de “ultraliberalismo” ou “turbo-capitalismo”. Na verdade, o Tratado de Maastricht, difundido por todos os tratados europeus que o sucederam, define a União Europeia como uma “economia de mercado aberta ao mundo, onde a concorrência é livre e não falseada”. Em nome deste artigo irremovível que constitui o coração da “construção europeia” e de construções político-económicas semelhantes noutros continentes (NAFTA, MERCOSUL, ASEAN …), os Estados nacionais e seus dirigentes políticos abstêm-se de nacionalizar os grandes bancos e outras empresas de caráter estratégico para os seus países. Ao mesmo tempo, é proibido planear cientifica e democraticamente o desenvolvimento económico, a implantação do progresso social, a distribuição de “ganhos de produtividade”, impedir devastadoras deslocalizações de industrias e serviços e, claro, banir os despedimentos coletivos em nome da “Lei do mercado”.

Pior, na França desde pelo menos 1992 (quando o Tratado de Maastricht obteve 50,8% num referendo em que Chirac e Mitterrand pediram um voto Sim), sucessivos governos franceses privatizarem os chamados “monopólios públicos” (como EDF, Gaz de France, SNCF, France-Télécom, La Poste, Air France, Aeroespacial, autoestradas, etc.) … para criar monopólios ou oligopólios capitalistas privados como SANOFI, Bolloré ou ENGIE, aliás Suez. E isso era ainda mais verdadeiro na época do governo Jospin, dito ser “da esquerda plural”, flanqueado por ministros “comunistas” (Gayssot, Buffet, Demessine) e “verdes” (Voynet), que, entre 1997 e 2002, privatizaram ainda mais rápido do que os governos de direita anteriores o setor público francês, desde bancos de poupança à France-Télécom via Air-France e SNECMA. Além disto, foi o “socialista” Rocard, um grande “europeu” que deu início à privatização da Renault, aproveitando de passagem para decapitar a CGT da empresa e fechar a Renault-Billancourt, epicentro da greve de 1968…

Liberalismo para quem?

De facto, é verdade num certo sentido que esta política, totalitariamente imposta em toda a UE pela Comissão de Bruxelas com multas e “sanções”, é “liberal”; mas para QUEM o é realmente, senão para os grandes grupos capitalistas de dimensão continental ou mundial que podem assim em completa “liberdade” demolir as conquistas sociais dos trabalhadores, praticar os mínimos em termos ambientais e sociais à escala transcontinental, multiplicar suculentas fusões capitalistas e, especialmente agora, assassinos de empregos continentais e transcontinentais (Renault-Nissan, PSA-Chrysler-FIAT, Alstom / Siemens ou Alstom-GE, etc.): em suma, atropelar “livremente” o mundo do trabalho e o verdadeiro interesse nacional, duas noções que se tornam uma só quando a expressão “interesse nacional” não é mal utilizada no sentido imperialista.

A UE não apenas permite aos monopolistas sobre-explorarem e desqualificarem milhões de trabalhadores considerados “muito caros” (deslocalização real ou chantagem para deslocalizar, são exatamente a mesma coisa), mas ainda ajuda a esmagar, de uma forma muito “liberal”, as pequenas empresas: porque em cada momento paira sobre as cabeças dos artesãos, dos pequenos industriais, dos pequenos agricultores, e ainda mais, sobre a dos assalariados privados de direitos de muitas PME (sem falar nesse patronato fictício que são os trabalhadores uberizados e outros “empresários por conta própria”), uma “concorrência” de extensão planetária cuja escala e regras deliberadamente minuciosas favorecem as únicas empresas realmente capazes de se envolver numa competição “não falseada”: os monopólios capitalistas vinculados aos bancos.

As pequenas e médias empresas são, portanto, solicitadas, com total “liberdade empresarial”, a esmagar os seus preços e, com elas, os salários dos seus trabalhadores, a rastejar para chegar aos mercados, para competir com os gigantes internacionais pelo menor preço, para serem subcontratadas por tirânicos “dadores de encomendas”, em particular da grande distribuição. Ou, mais simplesmente, como acontece com centenas de milhares de “patrões” de MPME ou “empresários por conta própria”… a “desaparecerem” pura e simplesmente (com centenas de suicídios cada ano no mundo camponês).

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Não falemos do papel devolvido por este sistema “libertador” nos antigos países socialistas do Leste: a sua indústria socialista e os seus incomparáveis ganhos sociais foram liquidados por uma terrível “terapia de choque”, anterior à sua anexação pela UE (e, no seguimento, pela NATO!). Nem do futuro dos países do Sul, quase proibidos de desenvolvimento industrial e agrícola, excepto do tipo neocolonial (fixado pelas necessidades das grandes empresas dos países ricos): é claro que uma jovem indústria nacional partindo do zero, ou tendo inicialmente pouco financiamento, tecnologia e poucos escoamentos próprios, não poderá competir seriamente, sem direitos aduaneiros nacionais, os mastodontes capitalistas dos países dominantes já instalados no mercado que se apropriam das matérias-primas, sementes agrícolas, etc.

Não foi por acaso que em França, para criar indústria, Colbert teve que montar uma indústria estatal, e regulamentar firmemente as importações: todos sabem que a França, nunca teria tido uma indústria sem a intervenção planificadora do Estado e que, como contraprova da mesma hipótese, a indústria francesa entrou literalmente em colapso, pois ao Estado, escravo voluntário da “construção europeia”, lhe é vedado nacionalizar, proteger e planificar…

“Liberalismo” assimétrico internacional e blindado de cripto-proteccionismo

Notemos também que, mesmo neste nível continental e transcontinental, o pretenso “livre comércio mundial” é uma ficção: na realidade, os Estados capitalistas mais poderosos, e centralmente no que diz respeito à França, os EUA e a Alemanha capitalista unificada (verdadeira senhora da UE) dotaram-se de milhares de ferramentas cripto-proteccionistas ou abertamente proteccionistas: direitos aduaneiros anti-chineses de Trump, “sanções económicas” supostamente destinadas a defender os direitos dos homem com geometria variável que atinge os rivais actuais ou potenciais da grande capital norte-americano, em particular a China, vários embargos estrangulando a Rússia, China, Irão, Venezuela, Bielorrússia e, claro, a indomável “besta vermelha” cubana!

Poderemos também mencionar as inúmeras normas “sanitárias” (e cada vez mais “ambientais”) impostas pelos EUA para fechar seu território às exportações dos países dominados. Trata-se, a todo custo, de filtrar a entrada de competidores reais ou potenciais no seu mercado interno e permitir assimetricamente ao grande capital dos países líderes invadir os mercados do Leste e do Sul sem que a recíproca seja possível.

O euro, uma moeda cripto-protetora; o acordo monetário inter-imperialista alemão-EUA e a crise actual deste acordo [1]

A principal destas ferramentas desleais que permitem a “concorrência livre” (para os Estados ricos) e sistematicamente falseada é o binário monetário conflitante, mas cúmplice (como duas máfias que podem ao mesmo tempo aliar-se para pilhar uma cidade enquanto periodicamente se combatem) que formam…

– por um lado, o dólar: uma estranha moeda mundial não convertível em ouro e garantida na realidade pelo poder das Forças Armadas dos Estados Unidos: (80% das armas do mundo são dos EUA! Quem irá assim exigir aos EUA que pague as suas enormes dívidas?); o que vale bem uma guerra por ano em média para sustentar o medo, não do polícia, mas do ladrão. Tanto mais que os projectos de moeda internacional para contornar o dólar estão em execução há anos (acordo entre a Rússia e a China para trocas sem passar pelo dólar, projecto da Líbia para uma moeda africana autónoma – o que sem dúvida provocou em grande parte o derrube e o linchamento “humanitário” de Khadaffi…) e

– por outro lado, a zona euro, coração da “construção europeia” centrada em Berlim, garantida pelo marco alemão. A moeda única europeia garantiu à Alemanha uma espécie de mercado europeu permanentemente cativo, embora deixando – por quanto tempo mais? – o dólar mais fraco dominar globalmente.

Assim, os respectivos “rebanhos” do Tio Sam e do amigo Fritz foram inicialmente bem guardados. Pois, desta forma, os imperialistas hegemónicos EUA e RFA podem “dividir” global e continentalmente áreas de influência e mercados. Desta forma, Berlim “tosquia” interminavelmente a Europa Oriental (um paraíso para as deslocalizações capitalistas, uma reserva de mão-de-obra bem treinada e barata para o Ocidente) e o Sul da Europa, transformado numa válvula de escape, amplamente passivo e impotente para penetrar seriamente no mercado industrial do norte da Europa (os chamados “estados frugais” ligados à Alemanha capitalista).

Além disto, devido ao diferencial de moeda entre o euro forte e o dólar fraco, a Europa alemã prometeu inicialmente não invadir o mercado dos EUA. Claro, que este compromisso cripto-protecionista entre os dois tubarões imperialistas que estão em pé de igualdade Berlim e Washington (o PRCF é o único até agora a ter referenciado e denunciado este compromisso cripto-protecionista) é necessariamente frágil, o que explica as tensões entre Trump e Merkel: com um golpe de euro forte, a Alemanha capitalista matou ou submeteu as indústrias mais fracas dos países do Sul, incluindo a França, e transformou em neocolónias de mão-de-obra barata os ex-países socialistas do Leste, Polónia, Estados Bálticos, ex-Checoslováquia, ex-Jugoslávia.

Os países do sul da Europa não podiam, de facto, contra-atacar por meio de “desvalorizações competitivas”, como faziam quando não havia moeda europeia fixada no marco. Mas este sistema está necessariamente fadado ao desequilíbrio e à sua autonegação dialéctica. Tendo acabado por arruinar os países do sul da Europa, os chamados “PIGS” (Portugal, Itália, Grécia, Espanha), a Alemanha mudou o rumo; o euro foi sistematicamente enfraquecido pelo BCE com a sua política de “fábrica de notas”. De repente, a Mercedes invadiu… o mercado dos Estados Unidos, cuja reação anti-alemã e anti-UE, mas também anti-chinesa, se chama Donald Trump.

Claro, que aqueles dois megapredadores que se autodenominam “comunidade internacional” continuam como ladrões a entender-se às mil maravilhas para atacar os países do Sul, proteger o capitalismo mundial, evitar o retorno sempre possível de comunistas e revolucionários e até prepararem juntos uma boa guerra contra a China e/ou contra a Rússia.

Mas, o idílio EUA/Europa alemã sob domínio absoluto do primeiro – que perdurava desde o período entre guerras e ainda mais, desde 1945 e o financiamento americano da fortaleza Alemanha (contra a URSS, mas também contra a França, vejam-se os livros de Annie Lacroix-Riz ) está doravante terminado. Não concluamos que eles vão desentender-se e atacar-se, pelo menos imediatamente, eles têm muitos interesses em comum para isso e podem, mais uma vez, reconciliar-se para atacar a Rússia ou a China… enquanto continuam juntos a avançar se puderem na Ucrânia, Bielorrússia, Cáucaso, etc.

“Ajuda ao emprego = ajuda publica para despedimentos em massa: aberração ou efeito sistémico?

Devemos ver também e sobretudo o aspecto oculto desta política económica que revela cruamente a multiplicação de despedimentos nas empresas capitalistas a abarrotar de dinheiro por Macron e Cia. (e antes dele pela CICE [2] sarkozysta e pelo Pacto de Responsabilidade holandês), e isso sem qualquer contrapartida séria do lado patronal. Esta política de subsidiar massivamente o lucro privado com dinheiro público leva a uma contradição potencialmente revolucionária quando o dinheiro do contribuinte, distribuído às cegas para o emprego, é usado para… deslocalizar massivamente e eliminar os empregos industriais restantes. Devemos também falar sobre a maneira como em 2008 os Estados burgueses, e a França sarkozysta deram o exemplo, salvando os bancos privados da falência, endividando-se colossalmente… junto dos mesmos banqueiros, e fazendo em seguida os povos pagarem (“euro-austeridade”) em nome do “reembolso da dívida”.

A Air France-KLM, Renault, PSA, Auchan e agora Bridgestone-Béthune, todos eles obtiveram enormes verbas retiradas dos nossos impostos para, de facto, realizar planos de despedimentos em massa que já estavam em preparação nos conselhos de accionistas muito antes que alguém tivesse ouvido a palavra “Covid-19″…

O escândalo é enorme e a raiva cresce por todos os lados porque quem neste momento apenas vê o poder de Macron, mesmo olhado pela “esquerda” pelo vigarista político Xavier Bertrand, não sabe como justificar o enorme desperdício de dinheiro público que constituem estas “ajudas” ao grande patronato sem controle público ou “contrapartidas” em termos de emprego, meio ambiente e condições de trabalho. Todos vêem, pelo contrário, que se trata, do ponto de vista ético, de um grande desvio e que os cofres dos capitalistas parecem cada vez mais um novo “barril de Danaïdes” cuja particularidade seria de estar privado de fundo, à excepção de privatizar os fundos públicos!

Vemos, portanto, os mesmos economistas burgueses que protestam contra a “tributação confiscatória” (isto é, sobre os ricos, Le Point não tem nada contra o IVA pago pelos trabalhadores, mas muito contra o que é pago pelos capitalistas…) considerando funcionários públicos (bombeiros, funcionários de hospitais, professores, pesquisadores do CNRS, etc.) parasitas sugando o sangue da burguesia. Aceitam como é evidente que Estados e governos “liberais” paguem dezenas de milhares de milhões (e será ainda pior com o “empréstimo europeu”) aos accionistas das empresas privadas que costumam “justificar” as suas enormes receitas pelos supostos “riscos” que correm. Mas quem tem mais “risco” de dormir debaixo de pontes, o accionista da Bridgestone ou o trabalhador químico?

Por trás do “neoliberalismo”, as novas formas de capitalismo monopolista de Estado à escala (trans)continental

Simplesmente eis o “escândalo” que fingem denunciar Xavier Bertrand, dirigentes do PS, etc, que fizeram e que fariam como Macron se chegassem ao poder, e que não se deve à “ingenuidade” de Macron que teria, enfim, sido enganado pelos capitalistas … dos quais ele próprio é uma emanação, como antes dele, Pompidou foi uma espécie de procurador de Rothschild antes de se tornar ministro e depois presidente).

Em suma, não se trata de um “erro” ou então seria diabólico, já que o PCF, então marxista, o denunciava nos anos 1970 ao publicar o livro Le Capitalisme Monopoliste d’État, demonstrando, na continuação dos estudos avançados por Marx, depois por Lenin, que na nossa época, o capitalismo competitivo e liberal mais ou menos “puro” do século XIX há muito tinha dado lugar:
a) ao imperialismo, onde dominam os monopólios capitalistas, onde domina o capital financeiro e onde a exportação massiva de capitais sobre-acumulados é a causa permanente de guerras pela partilha do mundo (tese clássica do leninismo);
b) e que, especialmente após a terrível crise de 1929 e da resposta keynesiana, colocou em seu lugar por toda a parte um “mecanismo único Estado burguês/monopólios capitalistas” no seio do qual predomina em última análise o grande capital privado.

Já sob De Gaulle e Pompidou, o Estado se desviou das nacionalizações democráticas levadas a cabo em 1945 pelos comunistas Marcel Paul, Billoux e Thorez, e alocou milhares de milhões de dinheiro público, direta ou indiretamente, ao grande capital privado que então procedia a fusões especialmente à escala nacional (base do gaulismo histórico para a alta burguesia).

Na época, o Capitalismo Monopolista de Estado (CME) era mais apelativo que hoje porque se escondia atrás do patriotismo nacional (como se os capitalistas tivessem uma pátria diferente daquela onde obtêm o máximo lucro!) e porque, a força do PCF e da CGT ajudando, o financiamento dos serviços públicos e o dinheiro destinado aos salários eram em proporção mais elevados que hoje.

Os livros de história e economia explicam-nos como o atual “liberalismo” destruiu o estado Providência: na realidade, serviram-se do fim do campo socialista mundial e do (auto-)enfraquecimento dos partidos e sindicatos comunistas (confundindo “modernidade” com abandono da luta de classes) para liquidar os serviços públicos destinados a todos e vampirizar o dinheiro dos cidadãos como nunca antes, colocando-o ao serviço dos grandes capitalistas em escala cada vez menos nacionais e cada vez mais transnacionais.

Em suma – e até o economista “liberal” mais estúpido é forçado a vê-lo hoje – o “neoliberalismo” atual é antes de mais a liquidação do “Estado Providência” para os assalariados (“providência”, mas em resultado de grandes lutas como as da Frente Popular, da Libertação ou de maio de 68) enquanto desenvolvia como nunca o Estado providência para os capitalistas; o que nós, militantes francamente comunistas, sempre chamamos de Capitalismo Monopolista de Estado, em particular essa subvenção sistémica e potencialmente mortal do grande capital que é a corrida aos armamentos fautora de incessantes guerras imperialistas e enormes desperdícios em termos de recursos naturais, dinheiro subtraído a produções úteis e desvio para pesquisas científicas mortíferas.

Dialética da forma e da essência

O CME não “desapareceu”, “desloca-se” e continentaliza-se de maneira ainda mais perigosa! Mas as aparências iludem apenas aqueles que são incapazes de distinguir as formas desatualizadas de CME, que na década de 1960 eram principalmente internas aos Estados nacionais e as formas atuais, cada vez mais euro-regionalizadas, continenalizadas e transcontinentalizadas; “Estado” não é sinónimo de “Estado-nação”, e do império continental germano-europeu, se possível aninhado numa futura “União Transatlântica” (é o vocabulário do MEDEF que fala de “precisar de ar” – no passado já se disse, em alemão, “Lebensraum” ) que mostra a sua vontade de poder. Tanto Dominique Stauss-Kahn, do PS, como Bruno Le Maire, exaltam um e outro aberta e publicamente o “Império Europeu” em construção (tendo por base jurídico-económica presente ou futura, a CETA , o TAFTA , etc, coroado pela OMC e protegido por uma NATO globalizada).

Mas o que seria a “Europa federal” desejada por Macron e flanqueada por um “exército europeu” encostado à NATO e uma “diplomacia europeia”, senão um novo estado supranacional expansivo (depois da Ucrânia e se possível da Bielorrússia, o que se passará?). Que abaixamento do QI político médio significa encontrar ainda no nosso tempo “marxistas internacionalistas” que sufocam de raiva contra qualquer ideia de patriotismo francês, como se Robespierre, Jaurès ou Politzer não tivessem escrito nada sobre isso, mas quem, como Arlette Laguiller , que tolamente gaba-se de ser “mais europeia do que francesa”: como se o supranacionalismo euro-atlântico não fosse ainda mais perigoso que o nacionalismo burguês do avô! Como se a frase devastadora de Mitterrand exclamando “França é nossa pátria, Europa é nosso futuro” (quase um elogio fúnebre da República Francesa!) não parecia estar a mil milhas desta reconfiguração europeia e “transatlântica” do imperialismo que o filósofo ultra-reacionário (pelo menos na política) Nietzsche já clamava no final do século XIX, sob o nome de “grande política” devolvida à elite mundial.

Como Losurdo estabeleceu, este filósofo da hiperpredação feliz opondo-se ao nacionalismo abertamente “plebeu”, “cristão”, “nacional” e “socializante” de um Bismarck! Lembremos a estes falsos marxistas as palavras de Lenine criticando as reflexões pseudo-internacionalistas europeias de Kautsky ou Trotsky: “em regime capitalista, os Estados Unidos da Europa não podem ser senão utópicos ou reacionários”…

Quem poderia dizer fria, empírica, pragmaticamente, olhando de perto o que a “Europa” trouxe aos trabalhadores em termos de destruição social e degradação massiva, que Lenine estava errado no seu diagnóstico? Em todo caso, os trabalhadores não se enganam: em 1992, quase 60% votaram NÃO na bacia mineira de Lens e, em 2005, quase 80% dos trabalhadores franceses disseram NÃO à constituição europeia. Vamos lá então, senhores burgueses e pequeno-burgueses com a vossa propaganda euro-adocicada, nunca convencerão alguém que é cuspido a exclamar: “eis o orvalho da manhã”!

O Estado não desaparece, redimensiona-se à escala continental

O CME “moderno”, não é “menos Estado”, mas mais Estado burguês, polícia, exército, deduções fiscais (de preferência através de impostos indiretos que atingem principalmente os “pequenos”), indo dialeticamente a par com menos serviços públicos e proteção social, para poder financiar a acumulação de capital. De facto, vivemos numa época em que a inevitável tendência da queda da taxa média de lucro exige que à exploração clássica seja adicionada uma pilhagem excessiva dos países pobres e um subsídio massivo ao capital, vindo de todos os escalões territoriais do poder público: Estado-nação ainda e sempre, enquanto permanecer nas mãos da grande burguesia, mas também “Europa” – o que é o “grande empréstimo europeu” senão CME praticado à escala continental?

“Grandes regiões”, “Metrópoles” e outras “comunidades aglomeradas” sufocando as comunas e os departamentos republicanos. Mais uma vez, o poder do Estado não desaparece: move-se, transforma-se da escala nacional para as escalas infra e supranacionais. E é triste que ainda haja tantos “marxistas” para aplaudir com as duas mãos o estabelecimento desses monstros político-militares que carregam a guerra mundial dentro de si como a nuvem carrega o raio!

Conclusão

Para acabar com o escândalo permanente que são as ininterruptas subvenções ao capital privado por parte do poder público, não basta protestar contra Macron, nem mesmo exigir a sua demissão, por muito necessário que seja, porque todos os partidos ligados à UE e à “economia de mercado aberta ao mundo”, o dito neoliberalismo, fazem, fizeram ou farão o que Macron está a fazer, seja o LAREM, o LR, o RN (que pretende ser “patriota”, mas aceita oficialmente o capitalismo, o euro, a OTAN e a UE) ou o PS ladeado pelos seus eternos satélites “euro-ecológicos”, “euro-comunistas”, “euro-trotskistas” e outros vendedores ambulantes da “Europa Social”.

Para se livrar do escândalo permanente que a construção europeia constitui em termos de milhões de operários, empregados e engenheiros postos na rua, de camponeses levados ao suicídio, mas também de funcionários públicos precários, pressionados em serviços públicos exangues, é necessário uma saída pela via revolucionária, a das nacionalizações-expropriações, da democracia popular, da saída da UE e do euro, essa austeridade continental feita dinheiro. Sair do perigoso império capitalista em gestação, a NATO – máquina de globalizar as guerras americanas e da corrida armamentista – e do próprio capitalismo, de que o neoliberalismo e a “construção euro-atlântica” são apenas as máscaras atuais.

Porque, por muito que desagrade aos soberanistas de direita, aos nostálgicos de um bom e velho liberalismo idealizado e aos “eurocomunistas” malabaristas da Europa social, a evolução do modo de produção capitalista é irreversível: não é possível voltar duradouramente ao capitalismo de Estado “nacional” da era gaulista, nem restabelecer o “capitalismo competitivo e liberal” do século XIX, nem reconstituir suavemente ganhos sociais, poupando-se a dura tarefa da revolução.

Uma nação verdadeiramente emancipada, igualitária e fraternal só pode ter um conteúdo socialista, a marcha para o socialismo precisa de uma emancipação completa das nações europeias da camisa de força da UE, e não de 100 mil sofismas pseudomarxistas contra um “Frexit” progressista. O “soberanismo” burguês e a “euro-esquerda plural” são dois impasses simétricos: há que sair pela esquerda, rumo à democracia popular, rumo ao socialismo, sem hesitar em expropriar pura e simplesmente o grande capital, o euro mortífero da UE pré-totalitária, da NATO belicista e do capitalismo monopolista e imperialista!

[1] Ver: O euro já custou 56 000 € a cada francês. Sair do euro, uma urgencia!
[2] Ver: Tudo sobre o CICE

[*] Co-secretário nacional do PRCF (Polo de Renascimento Comunista Francês)

O original encontra-se em www.initiative-communiste.fr/…

Este artigo encontra-se em https://resistir.info

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