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sábado, 20 abril, 2024

Argentina em fase pandêmica, a prioridade para salvar vidas

Por Maylín Vidal Buenos Aires (Prensa Latina) Apenas três meses depois de assumir a presidência e com uma dívida externa herdada do governo anterior, Alberto Fernández teve um verdadeiro teste para qualquer líder: enfrentar uma pandemia com a Argentina já em crise.
O ex-chefe de gabinete de Néstor Kirchner não hesitou em colocar todos os recursos necessários ao serviço do povo, priorizando sobretudo a saúde dos argentinos e dos milhões que ficaram desprotegidos e em situação difícil devido ao efeito da recessão.

Nesse estilo que muitos destacam o presidente, seu temperamento, equanimidade e com arte de dialogar e buscar consenso, ele é visto trabalhando todos os dias ao lado de seu gabinete e de forma conjunta com todos os governadores, tanto do governo quanto da oposição, com o foco na preservação da vida dos 44 milhões de cidadãos.

Apesar da pressão de certos setores para reabrir a economia, daqueles que ‘cacarejam’ e ‘bombardeiam’ com mensagens nas redes sociais para levantar a quarentena, o presidente tem sido enfático ao apontar: ‘uma fábrica que cai se levanta, mas uma vida que se perde não é mais recuperada’. Desde 20 de março, a Argentina decretou o isolamento, sabendo o que significaria para um país que carregava uma crise profunda e uma dívida externa ainda em negociação para reestruturá-lo. Apesar disso, o governo emitiu vários decretos de necessidade e urgência e ditou uma série de medidas para proteger o elo mais fraco.

Em coletivas de imprensa, em cartas até mesmo dirigidas aos cidadãos, em várias entrevistas – das quais ele deu várias -, Fernández destaca o caráter exemplar da grande maioria dos argentinos nestes tempos difíceis, nos quais, pela primeira vez, disse, ‘entendemos a necessidade de trabalharmos juntos’. ‘Professor Alberto fala’, escreve argentinos nas redes sociais quando em cada discurso, com precisão e com o apoio de estatísticas, ele explica a situação do país.

Para aqueles que o atacam quando diz que no governo ‘nos apaixonamos pela quarentena’, ele responde sem hesitar que vão continuar assim, pois a prioridade é salvar vidas.

O presidente convida a todos para que cumpram este contrato social para o qual sua vice-presidente, a ex-governadora Cristina Fernández, defendeu durante a campanha eleitoral do ano passado. Ele diz que sabe o que eles devem e querem fazer, e propõe que neste contrato a igualdade e a solidariedade devem ser a regra.

Depois de chamar para não desistir ou ceder, Fernández insiste em atender a esses milhões de cidadãos que estão sofrendo porque, disse ela, ‘não podemos fingir que não sabemos’. Chegou a hora de cuidar dessas pessoas, nossos compatriotas, argentinos que lutam todos os dias em condições adversas.

Para o presidente, os efeitos da pandemia impactaram a economia mundial, mas hoje geram ‘uma oportunidade de projetar um sistema mais justo’, razão pela qual ele insiste que o tempo do ‘cada um por si’ e da meritocracia acabou.

REFORÇO DA SAÚDE Desde que o vírus entrou no país, o governo tem feito um esforço para tentar trazer para casa milhares de argentinos presos em todo o mundo – vários voos de saúde ainda estão sendo feitos – vários hospitais modulares começaram a ser construídos, outros estão sendo concluídos e reforços estão sendo injetados no sistema de saúde, na tentativa de evitar um colapso.

Tudo isso permite que a criatividade dos cientistas e profissionais argentinos seja colocada em plena expressão. Desde então, eles têm realizado diversas iniciativas com o apoio do Estado, incluindo a fabricação de seus próprios termômetros infravermelhos inteligentes.

Outro esforço para combater a pandemia foi o nascimento de testes diagnósticos rápidos, o Neokit-Covid-19, que permite obter resultados em menos de duas horas, ou um respirador alternativo para terapia intensiva feito com insumos nacionais em apenas 55 dias pelo Instituto Nacional de Tecnologia Industrial.

Um grupo de cientistas também criou em tempo recorde o primeiro teste serológico, cem por cento nacional, CovidAr IgG, para detectar pessoas que estavam em contato com o vírus, enquanto outros 530 projetos foram propostos dentro do Programa de Articulação e Fortalecimento Federal das Capacidades Científicas e Tecnológicas.

ECONOMIA, DÍVIDA E CAMPANHAS NA MÍDIA

O Executivo teve que enfrentar campanhas recorrentes na mídia nesses meses, como a suposta libertação em massa de presos das prisões, que levou a um ‘panelaços’, ou mais recentemente, a marcha das ‘ contra a quarentena’.

Sem descuidar das negociações com os credores, vários planos foram colocados em prática: a Renda Familiar de Emergência, que atinge nove milhões de pessoas, o apoio às PMEs, um bônus para o setor de saúde, o Auxílio Infantil e Gravidez Universal, pagamento aos aposentados e também um valor destinado a pagar metade do salário a 1,6 milhões de trabalhadores privados.

A este respeito, Fernández disse que não pouparão recursos do Estado para aqueles que estão tendo mais dificuldades porque, como ele disse em 10 de dezembro do ano passado, quando assumiu as rédeas da Argentina, eles continuarão a lutar contra a fome.

Conseguimos nos unir em um momento difícil na Argentina pela melhor causa, que é cuidar da saúde do povo, disse o presidente nos últimos dias, que destacou aqueles que vivem nas áreas mais carentes, ‘o último será o primeiro’.

Paralelamente aos planos, Fernández vem percorrendo várias províncias do país apresentando um ambicioso plano que leva o nome Argentina Construye, que consiste em um programa de investimentos em infraestrutura de saúde e habitação, que gerará 750.000 empregos.

‘A construção de moradias é uma forma muito boa de iniciar uma economia que estava muito atrofiada, pois tem um efeito multiplicador e grande parte do que é necessário para construí-las não temos que importar de qualquer lugar, mas importamos’, disse ele ao apresentar a proposta.

É real que a situação econômica vai se aprofundar e o impacto sentido desde a administração anterior com o novo coronavírus vai colocar ainda mais pressão, com um dólar azul (que muda hoje no mercado negro para mais de 120 pesos) batendo e a dívida latente com os obrigacionistas.

Soube-se recentemente que, como outras empresas do mundo, a Aerolíneas Argentinas está sofrendo uma queda de 97% no faturamento e está trabalhando em um protocolo para a suspensão temporária de vários funcionários.

Enquanto negociava com os sindicatos, a principal companhia aérea deste país do sul – que tem desempenhado um papel de liderança nos voos sanitários -, anunciou que alguns de seus funcionários serão suspensos entre junho e julho para ver como eles se recuperam.

Em relação à dívida externa atual, o presidente argentino quer acreditar que está próxima de ser resolvida, e está dando passos importantes na busca de um acordo sustentável com os credores, pois ‘na Argentina não há mais espaço para a pobreza crescer’.

A dívida nos condiciona, temos que assumi-la quando podemos pagá-la para não hipotecar o futuro, nosso maior esforço é torná-la sustentável, para que quando eu não estiver no governo, quem voltar possa pagá-la’, disse Fernández em uma entrevista, depois de acrescentar que no seu caso lhe deixaram uma tão impagável que até o FMI a reconheceu.

*Correspondente de imprensa latina na Argentina.

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