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sexta-feira, 19 abril, 2024

A visita de Mattis, o cerco contra a Venezuela e o desmantelamento da esquerda

A visita recentemente feita por James Mattis, secretário da Defesa dos Estados Unidos ao Brasil, Argentina, Chile e a Colômbia deixou muito a falar na região e, na medida em que os dias se passaram, foram feitas várias análises sobre os resultados desta turnê e os eventos subsequentes — aparentemente isolados — que se transformam em um alerta para a área.

Pouco antes da viagem, o subsecretário adjunto da Defesa para os Assuntos do Hemisfério Ocidental, Sergio de la Peña, informou que a viagem fazia parte do «fortalecimento de alianças» que o governo dos EUA estava promovendo, como parte de sua Estratégia Nacional de Defesa (NDS, por sua sigla em inglês) e que, portanto, estavam interessados ​​em promover «a colaboração, a prosperidade e a segurança na região».

«Estamos muito interessados ​​em fortalecer as alianças e queremos que continue assim, pois os EUA estão neste hemisfério e queremos fazer todo o possível para mantê-lo como um lugar de colaboração, próspero e seguro», disse De la Peña, que mais tarde explicou a preocupação de seu governo sobre a influência da China na região, especificamente sua forma de fazer negócios, porque «não responde necessariamente, da melhor maneira possível, aos interesses de nossos parceiros no hemisfério».

Afirma-se que a visita de Mattis à América do Sul também está relacionada às preocupações de Washington sobre a influência marcante que as relações com Moscou e Pequim estão alcançando e, portanto, este foi um dos tópicos discutidos em cada um dos territórios que ele visitou. Pouco antes de sua chegada, o próprio secretário da Defesa havia dito que os EUA apoiavam as «decisões soberanas de Estados soberanos» e o almirante Kurt Tidd, chefe do Comando Sul, alertou para «invasões de outros países» na área, onde já havia concorrrência demais, que era uma luta pela influência e, que o mais importante que eles tinham que fazer então era lutar.

Do outro lado, Piotr Yákovlev, chefe do Centro de Estudos Ibéricos, do Instituto Latino-Americano, da Academia Russa das Ciências, alertou que parece que Washington está muito preocupado com questões econômicas, as que ainda são relevantes, mas a realidade mostra que nos últimos tempos «não é apenas uma questão de economia. As divergências cresceram com os problemas de migração com o México, o nível de interação com Cuba diminuiu significativamente, há interferência na vida política da Nicarágua. A Casa Branca aumentou a pressão sobre o principal adversário dos Estados Unidos na região: a Venezuela. Trump procura cortar o ‘oxigênio financeiro’ de Caracas através de sanções e derrubar as autoridades neste país, possivelmente pela força».

Se a isto acrescentamos que a viagem de Mattis foi precedida por uma visita de um alto almirante da Marinha, o chefe das Operações Navais, John Richardson, também à Colômbia, Chile, Argentina e o Brasil, é evidente o interesse dos Estados Unidos de atacar o governo de Caracas e reforçar sua hegemonia na região, tendo como bandeira os postulados da Doutrina Monroe, já assumida pelo vice-presidente Mike Pence em sua anterior visita à área, em junho passado.

A ESFERA MILITAR E O CERCO CONTRA A VENEZUELA

No chamado «Ano das Américas» para os EUA, Mattis reforçou, sem dúvida, as questões relacionadas à defesa. No Brasil, por exemplo, realizou importantes reuniões com o alto comando militar e deu uma palestra no Colégio de Guerra daquele país. Logo depois, em 20 de agosto, o ministério da Segurança Pública daquele país informou que cerca de 60 agentes da Força Nacional foram transferidos para a fronteira com a Venezuela, especialmente para o município brasileiro de Pacaraima, no estado de Roraima.

Desse modo, um total de 120 soldados e 26 voluntários seriam enviados a Pacaraima, como resposta a um suposto incêndio de um grupo de moradores em um campo para cidadãos venezuelanos na área, devido à «crise migratória» gerada por aqueles que «fugiram» daquele país. Até mesmo o ministro da Secretaria de Governo do Brasil, Carlos Marun, indicou que não foi descartada a possibilidade de fechar a fronteira entre a Venezuela e aquela cidade brasileira.

Na Argentina, o secretário da Defesa dos EUA disse que deve ser fortalecida a ação diante de «desastres», aos quais os argentinos responderam ressaltando o valor do papel dos EUA no caso do submarino San Juan, como um precedente que não deve ser esquecido.

Para ninguém é um segredo que o governo de Mauricio Macri parece acolher a instalação de bases militares norte-americanas no território argentino e o fortalecimento de suas relações com o aparelho militar norte-americano, descrito pelo Ministério da Defesa argentino como um caminho ao que retornariam e do qual nunca deveriam ter saído, criticando claramente os governos de Néstor Kirchner e Cristina Fernández.

Em sua última estada na região, James Mattis reuniu-se em Bogotá com o presidente da Colômbia, Iván Duque, e embora abordassem questões como o tráfico de drogas, culturas ilícitas ou a cooperação bilateral entre os dois países, a situação na Venezuela centrou sua agenda, apenas alguns dias depois das denúncias feitas pelo presidente Nicolás Maduro sobre a responsabilidade de Bogotá e Washington na tentativa de assassinato, em 4 de agosto.

Durante a reunião, Mattis afirmou que a Venezuela está em uma «situação trágica» por causa de «um governo com sede de poder», que gerou uma «crise humanitária», com uma mobilização em massa de migrantes e isso também representa uma ameaça à segurança da Colômbia. Pouco depois, o chanceler colombiano, Carlos Holmess Trujillo, em atitude abertamente intervencionista e alheia à realidade venezuelana, disse que seu país fortaleceria uma grande coalizão democrática internacional para avançar na criação de condições para que o povo venezuelano pudesse finalmente optar, mediante processos transparentes, democráticos e livres, o governo que queira ter.

Como resultado, veio a público que a embarcação norte-americana UNSS Comfort, capaz de transportar helicópteros de guerra, seria enviada para a fronteira entre a Colômbia e a Venezuela, com a desculpa de fornecer ajuda humanitária aos venezuelanos que vivem naquele país.

Criar incerteza, insatisfação, aumentar sua influência na região, focar o olhar na Venezuela, mexer os peões que realizem ações mais decisivas contra a Revolução Bolivariana, parecem ser os principais objetivos do governo dos EUA, acelerados pela visita de seu secretário de Estado à região sul-americana. Tudo isto através de antigos e conhecidos pretextos: crises migratórias e humanitárias, violação dos direitos humanos, falta de democracia e liberdades políticas e individuais, existência de ditaduras «responsáveis» por «banhos de sangue», que justificariam uma intervenção militar, nas quais os EUA ressurgiram — como muitas vezes antes — como os «salvadores» e promotores da estabilidade.

Em uníssono, os Estados Unidos apoiam as tentativas de golpes de Estado, processos judiciais e uma amarga guerra na mídia contra líderes e processos progressistas na região, com o objetivo de desmantelar a esquerda latino-americana e caribenha e recuperar seu poder econômico e militar na região.

Itens na mais recente escalada imperial:

6 de julho: O presidente do Equador, Lenin Moreno, anuncia que o governo nacional solicitará a devolução do prédio utilizado como sede da Unasul.

4 de agosto: Tentativa de assassinato contra Nicolás Maduro, com a cumplicidade da Colômbia e dos Estados Unidos.

10 de agosto: Iván Duque anuncia a retirada da Colômbia da Unasul, que considera «cúmplice da ditadura venezuelana» e afirma que outros países desejam seguir o mesmo curso.

13 de agosto: Trump assina o mais alto orçamento militar na história de seu país.

22 de agosto: O Ministério das Relações Exteriores da Venezuela nega «categoricamente» a denúncia da Colômbia de uma suposta violação de sua soberania pelos militares venezuelanos no domingo, 19 de agosto, descrevendo-a como um «novo falso positivo» contra seu país.

23 de agosto: Evo Morales denuncia a militarização da fronteira da Argentina com a Bolívia e assegura que não intimidarão seu país.

23 de agosto: O Equador anuncia que se retira da Aliança Bolivariana para os Povos de Nosso Tratado de Comércio dos Povos da América (ALBA-TCP) para ressaltar sua independência.

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